A Ford foi a primeira fabricante de automóveis a se instalar no Brasil, mas nem assim entendeu o nosso mercado e fecha suas fábricas depois de uma série de equívocos. O primeiro deles, oito anos depois de iniciar em 1919, a montagem do Modelo T.
Fordlândia – Henry Ford adquiriu, em 1927, uma grande extensão territorial no Pará, divisa com Amazonas (foto de abertura). Estabeleceu um grande projeto agroindustrial para produzir e beneficiar látex que seria exportado para a produção de pneus nos EUA. Além da plantação, uma cidade completa com casas e toda a infraestrutura, inclusive estradas e portos fluviais. Por incompetência dos técnicos encarregados do projeto, a Fordlândia revelou-se um completo fracasso, durou poucos anos e o governo brasileiro comprou as terras de volta em 1945.
Maverick – Nem uma pesquisa de opinião (clínica) feita por ela mesma, que apontou a preferência do brasileiro para o Ford Taunus (alemão), demoveu a empresa de fabricar o Maverick que deveria concorrer com o Opala. Lançamento fracassado que durou sete anos (1973 a 1979) e pouco mais que 100 mil unidades. E ainda “garantiu” o insucesso dotando-o do mais que obsoleto motor do Aero-Willys…
Caminhões – A GM entendeu bem mais cedo que a Ford não ter vocação para caminhões. E encerrou essa operação no Brasil em 2002, muito antes da Ford, que só o fez depois de um desempenho medíocre e aumentar os prejuízos da filial brasileira. Só desativou no ano passado a fábrica de São Bernardo do Campo, onde fabricava caminhões e o Fiesta.
Courier – Derivada do Fiesta e produzida de 1997 até 2013, era uma picape de excelente qualidade e extremamente resistente, além de uma caçamba de dimensões respeitáveis e carga útil de 700 kg. Enquanto o Fiesta foi sendo reestilizado, a empresa não percebeu o sucesso das picapes compactas no uso urbano e não se preocupou em atualizar a Courier. Abandonou um segmento que é uma das galinhas dos ovos de ouro do nosso mercado e deu “de mão beijada” espaço para a concorrência (Strada, Saveiro e Montana)..
Transit – Em mais um escorregão, suprimiu do mercado brasileiro em 2014 a linha Transit (furgões e vans), considerada uma das melhores do mundo. Deixou a fatia do bolo para Renault, PSA, Mercedes e Iveco.
Focus – Grande briga mundial no segmento de médios foi travada durante anos entre Ford Focus e VW Golf. Exceto no Brasil, onde a Ford passava a impressão de ter o Focus quase como um “mal necessário”. Apesar de mais sofisticado tecnologicamente que os dois japoneses, tomou uma “surra” do Corolla e Civic no nosso mercado.
Autolatina – Uma das maiores trapalhadas em que se meteu a Ford no Brasil (e Argentina) foi sua joint-venture com a VW. A Autolatina já começou mal (em 1987) pois a holding era controlada pelos alemães que detinham 51% de participação societária. Mas, numa época de economia em frangalhos, foi a solução para evitar a saída da Ford do país. Porém, duas culturas, norte-americana e alemã, que nunca se entenderam e, como eram concorrentes lá fora, negavam passar o “pulo do gato” para a engenharia da holding. Depois de lançamentos malsucedidos e brigas internas que quase chegavam às vias de fato, a Autolatina foi desfeita em dezembro de 1995.
A Ford tentou se reabilitar com novos modelos, mas nunca mais foi a mesma. Até pela inabilidade ao enfrentar novos tempos de abertura do mercado (1990) e as novas fábricas implantadas a partir do final da década de 90.
Jeep – Ao comprar a Willys-Overland do Brasil, a Ford recebeu “de presente” a marca Jeep. Que cedeu, posteriormente, por US$ 1, para a Chrysler que se instalava aqui e pretendia trazer o Jeep Cherokee. Entregou — na bandeja — uma das mais valiosas marcas do mundo e, tivesse visão, EcoSport ou Troller poderiam ter ostentado este logo. Mais esperta, foi o que fez a Fiat.
PowerShift – A ideia da caixa robotizada de dupla embreagem é das mais geniais, “estado da arte” do câmbio automático. Mas devido à decisão da fábrica de usar embreagens a seco, e não em banho de óleo, provaria ser errada. O câmbio era alemão, Getrag, fabricante da qual a Ford era sócia desde 2001 (vendeu sua parte em 2018 para a americana Magna International, fabricante global de transmissões), mas problemas de superaquecimento das embreagens, principalmente por mau uso, geraram muitos transtornos para os proprietários e para a Ford.
Ka x Fiesta – Inacreditável os executivos da Ford terem decidido lançar em 2015 o novo Ka com a mesma plataforma do Fiesta. Industrialmente, uma boa redução de custos. Comercialmente, se esqueceram de um “pequeno detalhe”: custava menos, oferecia maior espaço traseiro, mesma mecânica e mimos eletrônicos. E o Ka matou o Fiesta….
BF
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
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