Depois de alguns anos sofrendo com o fraco desempenho do carro, a McLaren está voltando a ser uma equipe de ponta na Fórmula 1. Neste ano, conquistaram um incrível 1° e 2° no GP de Monza, e o jovem Lando Norris deu um show na corrida da Rússia, passando muito perto de conquistar sua primeira vitória na categoria.
O nome McLaren tem muito peso na categoria. Nada menos que doze títulos mundiais de pilotos (incluindo os três de Senna e um de Emerson) e oito títulos de construtores. E todo este império começou com apenas um homem, que desde a juventude esteve em meio a oficinas, motos e carros de corrida.
Bruce McLaren não foi campeão na Fórmula 1, nem como piloto, nem como construtor. O sucesso da equipe McLaren veio apenas alguns anos depois de sua morte, com o título de Emerson em 1974. Bruce conseguiu um vice-campeonato de construtores em 1968, e ele próprio foi vice-campeão em 1960, correndo pela Cooper.
Uma das principais qualidades de McLaren era sua engenhosidade. Atuando como piloto, mecânico, preparador, projetista e chefe de equipe, ganhou muito conhecimento técnico sobre os carros. Sabia na prática o que funcionava e o que era perda de tempo. Como todo o construtor da época, tempo e dinheiro não sobravam e tinham que ser muito bem aproveitados.
O jovem neozelandês chegou na F-1 por meio da equipe Cooper, depois de ser classificado como um talento em potencial na sua terra natal, fazendo parte de um programa de incentivo à jovens pilotos para competirem na Europa nas categorias principais. Bruce correu pela Cooper na Fórmula 2. Ainda pela equipe inglesa, migrou para a F-1, ao lado de seu (quase) conterrâneo, o australiano Jack Brabham, e a Cooper desbancou as rivais.
No segundo ano na categoria, Bruce conquista sua primeira vitória, no GP dos Estados Unidos de 1959, com apenas 22 anos de idade. Foi o mais jovem piloto a vencer na categoria, uma marca que durou 44 anos. Este foi um marco importante na carreira de McLaren, pois em um futuro próximo, as corridas locais nos Estados Unidos teriam um grande efeito na sua vida.
A dupla dominou a temporada de 1960 da F-1. Das dez corridas do ano, venceram seis. Só Stirling Moss e Phil Hill conquistaram o lugar mais alto do pódio além da dupla vinda da Oceania. O americano Jim Rathmann venceu a 500 Milhas de Indianápolis, evento que contava pontos no campeonato, mas a maioria dos pilotos da Europa não participava.
Um dos pontos fortes de McLaren, além da excelente parte técnica, era a sua capacidade de conquistar pessoas. Bruce sabia como se relacionar, sabia como explorar as oportunidades e promover seu trabalho.
Cada vez mais forte no automobilismo, Bruce estreou sua equipe em 1966 com um carro projetado por ele e por Robin Herd, que assinaria diversos projetos para a equipe McLaren, dos Fórmula 1 até os primeiros Can-Am. Depois de anos ao lado de Bruce, Robin partiu para investir na sua empresa, a recém-criada March, a qual ele foi um dos fundadores. Antes de trabalhar para McLaren, Robin participou de um pequeno projeto na aviação, chamado Concorde.
Bruce também ficou conhecido nas provas de longa duração, em especial pela participação no projeto do Ford GT40. Na famosa vitória de 1966, em que os GT40 cruzaram a linha de chegada quase juntos (na verdade, McLaren cruzou a linha de chegada um pouco à frente), e Miles supostamente perdeu a corrida por ter largado mais à frente no grid, McLaren e Chris Amon foram os vencedores.
Ao embarcar na nova categoria norte-americana chamada Can-Am, que contamos aqui no AE, a McLaren estava traçando seu caminho no mercado dos EUA e conquistando espaço no mundo como um construtor de carros de primeira linha. Todos queriam um novo McLaren para disputar a categoria. Era de longe o melhor.
Bruce foi campeão da categoria em 1967 e 1969, revezando com seu parceiro Denny Hulme, que levou os títulos de 1968 e 1970. Na corrida canadense de Mont-Tremblant, em 1969, Bruce teve uma surpresa durante os treinos.
Sem muita explicação aos olhos dos expectadores, o M8B número 4 de Bruce encosta. Ele desce do carro, anda pela pista, pega algo do chão, volta para seu carro e retorna aos boxes.
Bruce havia encontrado uma tartaruga tentando atravessar a pista. Sem pensar duas vezes, parou e a recolheu, levando-a para os boxes em segurança. A boa amizade de McLaren com as pessoas pelo visto se estendia aos animais.
A pequena tartaruga canadense tornou-se parte do time McLaren, e foi chamada de Rick McTurtle. Onde o time ia, Rick ia junto. Era um sucesso nos boxes por onde passava. Ironicamente, o mascote de uma equipe de corrida era uma tartaruga, como na foto de abertura deste post.
McLaren ainda conseguiu utilizar seu novo mascote como forma de propaganda, junto com a Gulf Oil, um de seus principais patrocinadores. Diversas publicações mostravam Rick devidamente aparatado como um membro da equipe McLaren.
APENAS MAIS UM? CERTAMENTE, NÃO
Bruce McLaren não foi o único a ter sucesso no automobilismo, como construtor e piloto. Seu parceiro e, de certa forma mentor, Jack Brabham, conseguiu ir até mais longe, sendo campeão com seu próprio carro. Mas, o caminho até o sucesso da McLaren não foi fácil. Não mesmo.
As primeiras participações (e consequentemente, vitórias) nas corridas na Nova Zelândia vieram quando ele tinha cerca de 14 anos, com um velho Austin 7 que seu pai havia recuperado para ele correr em provas locais de subida de montanha. Até ai, nenhuma surpresa, se pensarmos que Max Verstappen chegou na F-1 com 17 anos.
Mas Verstappen não passou dois anos literalmente amarrado a uma cama com as pernas imobilizadas. Bruce tinha um problema chamado Doença de Perthes, que afeta a junção do fêmur com o quadril por uma falha na circulação sanguínea. Bruce enfrentou esta doença aos 10 anos de idade, e nunca se recuperou totalmente. Ele ficou uma perna mais curta que a outra, e sofria com dores no quadril de tempos em tempos.
Quando Bruce juntou-se à equipe Cooper para competir na F-2 da Europa, ele não recebeu um carro pronto para correr. No canto da fábrica da Cooper havia um monte de caixas, peças soltas e um chassi incompleto. John Cooper, ao recebê-lo na equipe, mostrou a ele aquele monte de peças e disse: “ai está seu carro, pode começar a montá-lo”. E assim McLaren fez.
As coisas mudaram drasticamente para Bruce quando ele mostrou seu talento no GP da Alemanha de 1958, em Nürburgring. Naquele tempo, esta corrida misturava carros da F-1 e da F-2. Bruce, com seu Cooper F-2, não só venceu a categoria da F-2 como terminou em quinto na classificação geral, realizando diversas ultrapassagens sobre pilotos da categoria principal. Este foi o dia que conseguiu conquistar seu lugar na F-1.
Quando Bruce percebeu que não conseguiria colocar em prática suas habilidades de construtor dentro da equipe Cooper, uma vez que John Cooper não gostava que ninguém desse palpite nos seus projetos, e vendo que seu amigo Jack Brabham estava seguindo seu próprio caminho com a Brabham, partiu para criar sua própria equipe.
Mas, com que dinheiro? O que ganhava correndo daria para começar alguma coisa, mas longe de ter condições de manter uma estrutura e bancar um carro de qualidade, feito do zero. Ele sabia que precisava de dinheiro, e poderia conseguir algo com suas habilidades de piloto mesclado com engenheiro.
Na época, a Ford estava desenvolvendo o projeto do GT40, e Bruce foi contratado como piloto de testes, justamente por sua grande capacidade de pilotar, analisar e repassar aos engenheiros o comportamento do carro, e principalmente, o que poderiam fazer para melhorar. McLaren e Ken Miles foram decisivos neste ponto para o sucesso do GT40.
De certa forma, o sucesso do GT40, reflexo do trabalho duro de toda a equipe, e de Bruce McLaren, pagou o começo das operações da Bruce McLaren Motor Racing Team, em um pequeno galpão na Inglaterra.
Pouco a pouco, conquista a conquista, McLaren conseguia aumentar sua equipe, reinvestindo os ganhos e bancando seus novos projetos. Bruce continuou a pilotar seus carros, fez um grande nome nos Estados Unidos na Can-Am, tanto como piloto e como fabricante. Focou muito esforço lá, especialmente porque os prêmios em dinheiro eram muito bons, e ele precisava deste dinheiro para continuar a desenvolver seu tão sonhado F-1 vencedor.
Até a sua vitória em Spa-Francorchamps, em 1968, com o M7A, sua primeira e única conquista na F-1 com um carro que levava seu nome, as melhorias feitas no projeto vinham de sua sensibilidade e capacidade de criação.
Disputando simultaneamente o campeonato de Fórmula 1, basicamente na Europa, e a Can-Am, na América do Norte, a equipe viajava constantemente sobre o Atlântico para corridas nos dois continentes, muitas vezes consecutivas, de forma exaustiva. Mas, era a forma que ele via para conseguir bancar sua equipe. E seu time o acompanhava onde quer se fosse, pois Bruce tinha uma personalidade mágica, fazia da equipe uma família.
Bruce morreu em 1970, testando um M8D Can-Am em Goodwood, buscando melhorar ainda mais seu carro, recém-modificado para melhorar o downforce. Depois se sua morte, a equipe manteve o trabalho normalmente, pois todos sabiam que era isso que McLaren gostaria.
“Fazer algo bem feito vale tanto a pena que morrer tentando fazer ainda melhor não pode ser besteira. Seria desperdício de uma vida não fazer nada com sua habilidade, por isso sinto que a vida é medida em conquistas, não apenas em anos.” – Bruce McLaren
MB