Números podem enganar. Por isso resolvi dar alguns exemplos na coluna de hoje:
Garantia – De 3, 5 e até 6 anos. Mas a garantia divulgada é contratual — a garantia legal é de 90 dias — e como em qualquer contrato há condições e exigências da contratante, dentro todo o direito. Algumas são usar o veículo para a finalidade prevista, mantê-lo segundo o preconizado no manual (revisões) e atentar para todas as informações do quadro de instrumentos. Caso típico de o cárter do motor se romper por objeto na via — uma lombada, por exemplo —,. o óleo se esvair e o carro continuar trafegando, inutilizando o motor. Nesse caso o conserto ou troca do motor não são cobertos pela garantia. Todas essas exigências e condições constam do manual de proprietário.
Mais vendido – O modelo é anunciado como o mais vendido do mercado, forte argumento estatístico para convencer o freguês, “se é o mais vendido, deve ser bom, vou comprar.” Mas é apenas meia-verdade: o campeão de vendas engloba não apenas o número de unidades adquiridas pelo consumidor final, mas também as chamadas “vendas diretas”, centenas de milhares de carros vendidos para frotistas e locadoras.
IPI reduzido – “Aproveite a redução do imposto para levar seu zero-km”. Muitas vezes não passa de conversa “pra boi dormir”: o governo o reduziu recentemente — definitivo, por lei — em 25% (geral, para veículos automotores foi de 18,5%). Mas o preço do carro aumentou. Como assim? A explicação do fabricante: “Já estava previsto um aumento de 7% na tabela. Com a redução do imposto, nós aumentamos apenas 3%”…
Consumo de híbrido/elétrico – Medir consumo num motor a combustão não é tarefa simples. No Brasil, já existe uma padronização, adotada pelo Inmetro. Mas as coisas se complicam com a entrada de modelos híbridos e elétricos no mercado. Até porque existem dois padrões de medição. O mais realista é o WLTP, mas o menos rigoroso é NEDC, ainda muito usado no caso de híbridos e elétricos
Carga útil – Fundamental no caso de picapes, as fábricas costumam praticar verdadeiro malabarismo nas mensagens publicitárias. Caso famoso foi no lançamento da Ford Courier: a fábrica exibiu um vídeo com um caixotão (“700 kg” pintado em corpo garrafal) sendo colocado na caçamba. Sim, esta era realmente a carga útil da Courier, mas ela inclui o peso do motorista e passageiro. Se cada um pesar, digamos, 75 kg,, a carga na caçamba baixa para 700 – 150 = 550 kg.
Películas – Há uma regulamentação do Contran que limita o escurecimento dos vidros por películas neles aplicadas. O que não fica bem explicado para o dono do carro é que, além do percentual gravado na película, deve-se somar o do próprio vidro. Se o filme tem 20% de transparência e o vidro esverdeado sai de fábrica com 75% de transparência (mínimo legal para os laterais dianteiros), passa a valer a soma: 95%. Se o policial estiver munido do aparelho de medição de transmitância luminosa (luxímetro), é possível configurar a infração, o motorista será autuado, terá pontos registrados na CNH e terá o veículo retido para remoção das películas no local, podendo seguir viagem, ou então ser apreendido.
Redução da dívida – Novo golpe na praça é anunciar a possibilidade de se obter um bom desconto na dívida por atraso nas prestações do financiamento. “50% de redução” é o que anuncia a quadrilha que entra em contato com o dono do carro sem que a instituição financeira credora saiba como os marginais obtiveram o valor, nome, endereço e telefone da vítima. Cobra uma taxa para reduzir a dívida e o dono do carro só percebe que caiu no “conto do vigário” quando o oficial de justiça bate à porta.
Carro de “entrada” – Algumas fábricas sequer enrubescem ao anunciar um modelo que jamais existirá: é o tal “básico dos básicos”, desprovido de qualquer equipamento ou acessório e oferecido por um valor bem atraente. Mas uma versão que só existe na lista de preços, jamais será produzida ou pedida à fábrica pela concessionária, e apenas cumpre o papel de atrair o interessado.
Porta-malas – Volume de bagagem admitida no porta-malas é uma característica importante para o motorista que viaja com frequência e carrega uma razoável tralha. Mas há diversas formas de se medir (e anunciar) este volume. A mais mentirosa é a que se utiliza de saquinhos de água para avaliar quantos litros ele comporta. Só que estes saquinhos se acomodam em qualquer espaço que, a rigor, jamais terá utilidade para coisa alguma. Existe uma norma, a ISO 3832, para determina este volume carregando o porta-malas com blocos com formato de tijolo de 200 x 100 x 50 mm formando um litro (ou 1 dm³). A soma desses blocos é a capacidade do porta-malas. Esse método é conhecido também por VDA, sigla em alemão de Associação da Indústria Automobilística, sediada em Frankfurt.
BF
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
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