Como meus caros leitores já sabem, moro em São Paulo e dirijo a maior parte do tempo na cidade ou no interior do Estado. No entanto, ainda me surpreendo com a dificuldade das autoridades em sinalizar adequadamente as ruas e avenidas. Na capital é ainda pior. Segundo a CET a cidade tem 410 mil placas de sinalização, mas li em algum lugar que faltam outras 5 mil e eu tenho certeza absoluta de que é sempre alguma dessas que eu preciso. E isso não tem nada a ver com uma eventual falta de senso de orientação feminino. Os problemas causados pela falta de sinalização atingem igualmente homens e mulheres.
Normalmente sou uma pessoa afável e bem humorada, mas meu lado obscuro tem um diabinho que surge de vez em quando e me assola com pensamentos cruéis. Um dos mais freqüentes é que os responsáveis pelo trânsito deveriam ser obrigados a dirigir o próprio carro (nada de motoristas), pago às próprias custas (assim daria dó tentar uma marcha à ré depois de ter passado a rua onde tinham de virar), não poderiam usar GPS nem Waze (para não mascarar as deficiências do trabalho deles) e por aí vai. Mas estou trabalhando nisso e um dia hei de superar esses pensamentos malévolos e trilhar o caminho do nirvana. Isto é, se encontrar as placas que indiquem a direção…
Lembro de uma frase que meu pai e minha mãe, ambos químicos e apaixonados por ciências exatas, sempre disseram a respeito do trânsito brasileiro, especificamente da (mal) traçada malha de ruas e avenidas. “Aqui é o único lugar onde as paralelas se cruzam e as perpendiculares não se encontram.” Nada mais verdadeiro. Acentuadamente piorado pela deficiência de sinalização.
Já perdi a conta de quantas vezes socorri motoristas. Tenho mania de olhar os modelos de carros e as placas e presto ainda mais atenção quando percebo que é um estrangeiro. Já estive no lugar deles e sei como é difícil estar num país que não é o seu e ainda por cima tentar chegar a algum lugar sem desrespeitar normas de trânsito. Explicar é tão difícil que acabo dizendo “venha atrás de mim” . Assim todos perdemos menos tempo. Uma vez minha mãe e eu ajudamos um motorista que estava na esquina da Amaral Gurgel com a Frederico Abranches. Esquina é força de expressão, pois aquele recanto de Santa Cecília, perto da Praça da República, tem seis ruas no mesmo cruzamento — fora o Minhocão, que passa por cima. E eu nem falei para o coitado do gringo que ainda tinha o metrô embaixo!
E melhora com o passar do tempo? Não, como diz minha mãe depois de morar tantos anos em São Paulo, é que ela continua se perdendo — a diferença é que agora ela já sabe onde está perdida.
Eu receio que falta placa em todo o País, não apenas em São Paulo. Morei um ano no Rio de Janeiro e todos os dias fazia o mesmo caminho do hotel, em Copacabana, para o jornal, na Cidade Nova, bem na Av. Presidente Vargas, pertinho da Linha Vermelha. Um final de semana meu marido voou para lá e resolvemos ir a Petrópolis, mas várias interdições em Botafogo fizeram com que me perdesse no emaranhado de ruas e da falta de placas, apesar de ser meu caminho de sempre. Cansada de rodar em vão por mais de uma hora em eras pré-Waze e GPS, desci do carro e peguei um táxi. Fiz ele me levar até a Linha Vermelha sem correr para que meu marido o seguisse e, chegando lá, paguei a corrida e entrei no nosso carro. Chegamos a Petrópolis a tempo de almoçar tardiamente. Ufa! Estive por lá faz pouco tempo e constatei que ainda faltam placas também na Cidade Maravilhosa.
Toutes directions – É claro que com complicações como esquinas múltiplas a sinalização deveria ser ainda mais caprichada, mas na verdade é ao contrário. As autoridades parecem querer incluir sempre um componente de filme de suspense. O problema é que quase sempre o resultado beira o filme de terror. E ainda tem as pegadinhas. Você vem seguindo as placas para um determinado local, por exemplo, “Aeroporto” e eis que, do nada, quando você chega numa bifurcação, não tem nenhuma que informe para onde você tem de virar. E ai? Uni, duni, tê? Minha mãe mandou eu escolher…? E viva o Waze!
Sem defender o indefensável, pois nivelar por baixo é sempre ruim, tenho que reconhecer aqui que os franceses têm uma placa fantástica: “Toutes Directions” ou às vezes “Autres Directions”. Ela está em todas as bifurcações, saídas, rotatórias. Assim, se você vai de Paris para Lyon e chega num “carrefour” com cinco ou seis saídas, como é freqüente, a lógica diz que você vai descartar as que dizem “Strasbourg”, “Mt Saint Michel”, “Carcassonne”, “Avignon”, “La Rochelle” e procurar uma placa que indique a via para “Lyon”. E se não tiver “Lyon”? Na minha experiência de muitas idas à França e muitos quilômetros rodados por lá, sempre aviso aos amigos: pegue qualquer saída, até mesmo Strasbourg ainda que você tenha de ir para o Sul e esta cidade fique a Leste. Qualquer uma, menos a “Toutes Directions”. Ela NUNCA vai levar você para onde você quer, independentemente de qual seja seu destino. É batata. Não importa onde você está ou para onde você quer ir. “Toutes directions” não leva a lugar nenhum. Já tentei essa opção inúmeras vezes e em nenhuma delas fui parar sequer próxima de onde queria. Vai ver que tem uma cidade fantasma chamada “Toutes directions” que muda de lugar e por isso também não a encontrei. E olha que eu tenho um senso de direção absurdamente bom. Melhor que qualquer bússola.
Eureka – O mau exemplo das placas atinge os lugares mais insuspeitos. Recentemente, me vi forçada a fazer uma manobra não recomendada, para dizer o mínimo. Procurava eu a saída do estacionamento dentro de um shopping center da Zona Sul de São Paulo quando me deparei com duas placas, cada uma indicando uma rua. Eba! Pensei ingenuamente e virei na direção da rua que eu queria pegar. Depois de dirigir por uns 50 metros dentro do corredor do estacionamento, sinalizado como de mão única, no sentido que eu trafegava, dei de cara com uma placa que indicava contramão. Assim, no meio do corredor e das vagas. E agora, José? Pelo que me lembro de Arquimedes e a banheira, dois corpos não ocupam o mesmo espaço ao mesmo tempo. Assim, eu não poderia virar no meio do corredor lotado de carros estacionados. Daria eu marcha à ré por 50 metros? Também não. E tive de seguir em frente, na contramão. Será que alguém testou as placas? Diria que não. Xii, lá voltam os pensamentos malignos sobre querer que os responsáveis pela sinalização dirijam os próprios carros e sofram com o próprio trabalho… Bem, acho que a tarefa de ter somente pensamentos puros em relação ao trânsito ficará para outra encarnação.
Mudando de assunto: Apesar de não conseguir acompanhar a F-3 Brasil é claro que gostei de ver de novo o sobrenome Piquet associado à palavra “campeão”. Vi pouquíssimas corridas, mas parece que o Pedro também tem talento. E tem o mesmo jeito blasé do pai e dos irmãos. Bacana.
NG