Décadas de problemas: diz o jornalista Bob Sharp que se lembra quando — ainda criança, começo da década de 50 — ajudava o tio a carregar um galão de 20 litros com gasolina especial para seu automóvel. Porque as disponíveis nos postos não eram compatíveis com o motor do carro. Só tínhamos veículos importados e as fábricas “tropicalizavam” os motores dos carros que viriam para o Brasil para não serem danificados pela gasolina de baixíssima octanagem (de 70 a 80 RON).
Na década seguinte (anos 50), um “notável” avanço: a Petrobrás criou uma gasolina diferenciada, com maior octanagem, chamada de “azul”, pois adicionava um colorante para diferenciá-la.
Carro a álcool: “um dia você vai ter um”…
Em novembro de 1975, o governo criou o Proálcool, (Programa Nacional do Álcool) para carros que só funcionassem com o combustível obtido da cana-de-açúcar que o Programa se incumbiria de estimular. Como a indústria não produzia carros para o “novo combustível brasileiro”, o pontapé inicial foi converter os motores da frota em circulação por retificadoras homologadas. Em 1978 já havia álcool em alguns postos, mas estes só podiam abastecer carros “convertidos”, identificados pelo selo da imagem de abertura.
Em 1979 surgiram os primeiros carros a álcool — Fiat 147 e VW Passat — e impulsionado pela campanha “Carro a álcool. Você ainda vai ter um.” ,combinada com a proibição de vender gasolina nos fins de semana, mais o preço do litro que era bem baixo, e alíquota do IPI diferenciada, o carro a álcool pegou para valer.
Mas o que teve foi um enorme aborrecimento: o brasileiro sofreu em filas nos postos pois no final da década de 1980, os usineiros preferiram produzir açúcar para exportar e faltou álcool. O brasileiro percebeu o perigo desta dependência e voltou para a gasolina. O álcool, só reapareceria em 2003, quando a eletrônica possibilitou o carro flex. Em 1982 o governo já tinha decidido misturá-lo à gasolina na proporção de 12% (E12, expressão que significa gasolina com essa porcentagem de álcool).
No final dos anos 90, o álcool sobrava e os usineiros pressionaram o governo para elevar o teor na gasolina para 22%. E ficou oficializado o E22 nas bombas.
Alegria durou pouco: D. Dilma autoriza, em 2014, a mistura de 27,5% de álcool, mantendo-se 25% na premium.
E agora, em 2023, nova pressão dos usineiros e o governo cria uma comissão para aumentar o teor para 30%. O argumento é ser um combustível mais “limpo”, que reduz a emissão de CO2, mas se “esquece” do aumento de aldeídos (cancerígenos) e hidrocarbonetos (HC).
A rigor, apesar do álcool, nossa gasolina está entre as melhores do mundo quando sai da refinaria. Mas sofre com as maléficas interferências governamentais e desonestidade de intermediários até chegar ao tanque.
Diesel faz sofrer ainda mais…
O primeiro golpe no diesel foi em 1976, desfechado pelo Departamento Nacional de Combustíveis (DNC), antecessor da atual ANP. Com a crise do petróleo, foi proibido seu uso em veículos com capacidade de carga inferior a 1.000 kg, com exceção dos 4×4 e agrícolas. Para reduzir sua importação e evitar que automóveis fossem também beneficiados com a redução de impostos do diesel. A proibição permanece até hoje. E agora faz sentido, por seu elevado teor de emissões.
Surgiu então a ideia de se acrescentar o biodiesel ao diesel, por ser de origem vegetal, renovável e estimular o desenvolvimento agrário. Começou em 2008 com um percentual de 2% (B2) que iria aumentar gradualmente até 15% (B15) em 2023. O processo caminhou bem até 2020, mas aí, com 12%, começaram a entupir motores por sua degradação no tanque, provocando a borra. Em 2021, quando veio o B13, a situação se agravou e o governo retornou o percentual para 10% (B10), pressionado também pelos preços, pois o biodiesel custa o dobro do diesel.
Agora, em abril, o Ministério de Minas e Energia autoriza, instigado pelos produtores, a voltar o B12. E a gasolina de 27% para 30%. No caso do diesel, às pressas e sem tempo sequer para os testes que comprovariam a eficácia de novas exigências especificadas pela ANP na tentativa de reduzir os problemas provocados pelo biodiesel.
Tem solução para o biodiesel…
Solução? Existe: o diesel verde ou HVO, que pode ser utilizado até 100%, mas sua produção exige — e os produtores recusam — investimentos adicionais. Mais fácil a “canetada” do governo…
Quanto à gasolina, nenhum incômodo para os carros flex que aceitam qualquer percentual de álcool (rebatizado etanol em 2010). E que se danem carros e motos mais velhas a gasolina não calibrados para tanto álcool. Mas todos sofrerão no bolso pois quanto mais álcool, maior o consumo.
Quanto ao diesel B12, não é solução, mas sugestão para tentar minimizar os problemas da borra:
1- Limpeza (ou troca) com maior frequência dos filtros;
2- Uso do aditivo Fuel Cleaner que contem biocida (combate bactérias e fungos que surgem com o biodiesel e que propiciam a formação da borra).
BF
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
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