Mesmo caso de seminovo, eufemismo de “usado” tão em voga hoje — ainda bem que não existe mulher semigrávida — o Detran de São Paulo tem insistentemente distribuído relatórios acerca da fiscalização da “lei seca” e falado, de maneira velada e com a maior naturalidade, que existem semibêbados e bêbados. Não estou inventando nada.
Veja o que diz o último relatório sobre fiscalização (e autuações) recebido há cinco dias (meus grifos):
Vale lembrar que tanto dirigir sob efeito de álcool — quando o teste do etilômetro aponta o índice de até 0,33 mg de álcool por litro de ar expelido — quanto recusar-se a soprar o bafômetro são consideradas infrações gravíssimas, segundo os artigos 165 e 165-A do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Em ambos os casos, o valor da multa é de R$ 2.934,70 e o condutor responde a processo de suspensão da carteira de habilitação. Se houver reincidência no período de 12 meses, a pena é aplicada em dobro, ou seja, R$ 5.869,40, além da cassação da CNH.
Nos casos de embriaguez ao volante, que ocorrem quando o motorista apresenta índice a partir de 0,34 miligramas de álcool por litro de ar expelido no teste do etilômetro, há configuração de crime de trânsito: quando condenado, o motorista, além das multas e suspensão da CNH, cumpre de seis meses a três anos de prisão, conforme prevê a Lei Seca, também conhecida como ‘tolerância zero”.
O que se lê acima é surreal, não? A diferença entre infração de trânsito e crime de trânsito ser 0,1 mg.
É claro que o Detran de São Paulo não inventou isso, apenas segue, por obrigação, o que diz a lei 11.705 de 19/06/2008 e suas modificações posteriores que simplesmente desprezaram o conceito mundial de dirigir sob influência — de álcool no caso — que não contempla porcentagem de álcool no sangue ou no ar expelido pelos pulmões para classificar motoristas alcoolizados em dois grupos, o dos semibêbados e dos bêbados, por si só total aberração.
É desnecessário bater na tecla da impropriedade de se realizaram blitze (plural de blitz) para verificar desobediência à lei seca que prejudicam o trânsito em razão do aparato montado que exige força policial que poderia estar cumprindo papel consideravelmente mais importante e que anda em baixa ultimamente, que é cuidar da segurança pública.
Mas tenho que continuar bater na tecla do completo absurdo combinando com desrespeito ao cidadão que é a lei seca, como se pequena porcentagem de álcool no sangue ou a correspondente no ar dos pulmões tirasse a capacidade de conduzir veículo automotor.
A prova inconteste do que afirmo é TODO acidente grave ou atropelamento ser associado a motoristas com elevada porcentagem de álcool no corpo — aí sim, bêbado — MUITO além do limite estipulado no Código de Trânsito Brasileiro original de 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou 0,3 mililitro de álcool por litro de ar dos pulmões medido por etilômetro, o popular “bafômetro”.
O que mais me revolta é mesmo com o estabelecimento de limite de álcool no organismo definido pelo CTB original nunca ter havido nenhuma fiscalização de longe parecida com a adotada em seguida à promulgação da lei seca.
Esse fato — 10 anos e cinco meses, de 22/01/98 a 19/06/2008 sem fiscalizar para tirar os bêbados do volante — me permite afirmar que as blitze têm como principal objetivo o faturamento para os três níveis de administração mediante multas.
Aproveito para cumprimentar todo pai nesse que é o seu dia, seja esse pai autoentusiasta ou não, e lamentar que vocês não possam comemorá-lo totalmente por obra de quem sancionou a inadmissível lei, o atua presidente da República.
BS
A coluna “O editor-chefe fala” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.