Exatamente em 21 de abril de 1960, o Brasil conhecia seu primeiro carro aqui produzido com alto nível de tecnologia construtiva e avanços tecnológicos dignos dos bons modelos europeus, o FNM 2000 JK. Seu nome indicava sua fabricante, Fábrica Nacional de Motores, motor de 2 litros e JK, homenageava o presidente da República Juscelino Kubitschek de Oliveira, empossado em 31/01/1956 e que tem a seu crédito dois feitos de grande significância, a implantação da indústria automobilística brasileira e a construção da nova capital do Brasil. Pouco depois da instauração do regime militar nos primeiros dias de 1964, as iniciais JK foram retiradas do nome do modelo.
O carro era a versão brasileira do sedã Alfa Romeo 2000, lançado na Itália em 1958 com vistas ao mercado americano com o nome Alfa Romeo 2000 Berlina (sedã em italiano), onde não foi bem-sucedido, tampouco na Europa, cuja produção nunca superou 1.000 unidades por ano.
Produção do JK era fluminense, mas seu projeto, Alfa Romeo, tinha descendência italiana (Foto: FNM/divulgação)Como a estatal italiana Alfa Romeo tinha laços industriais com a também estatal Fábrica Nacional de Motores, fundada em 1942 com fábrica em Xerém, distrito do município de Duque de Caxias, RJ, na região metropolitana da cidade do Rio de Janeiro, onde já produzia o caminhão FNM D9000, com o fracasso naqueles dois mercados ofereceu seu sedã à FNM, que passou a ser montado e paulatinamente nacionalizado até ser totalmente fabricado aqui. Seu lançamento ocorreu na data de inauguração de Brasília, 1/abril/1960..
Não era um carro barato por aqui, tanto que, na época, seu preço correspondia a cerca de 150 salários mínimos, que, hoje, com as devidas correções de inflação, seria o equivalente a cerca de R$ 330 mil. Sem dúvida, era um para poucos felizardos brasileiros.
Seu grande destaque ficava por conta da alta tecnologia empregada naquele projeto italiano, que surpreendia o mercado do Brasil, ainda em tempos de recuperação dos efeitos da Segunda Guerra Mundial. Nossa indústria automobilística ainda engatinhava, embora desse mostras de ter um enorme potencial à frente. Mas o poder aquisitivo da população permitia apenas que o consumidor, em sua grande maioria, comprasse os Renault Dauphine, Fusca 1200 e DKW-Vemag, além do Romi-Isetta, todos pequenos, econômicos, de projeto simples e baixo custo de manutenção. E o JK era indiscutivelmente superior ao seus concorrentes diretos, o Simca Chambord de 1959 e o Aero-Willys, também de 1960.
Nesse contexto, o FNM 2000 JK se destacava como um carro de altíssimo luxo, uma vez que foi pensado e projetado também para o mercado americano. Sedã de dimensões generosas, 4;710 mm de comprimento com entre-eixos de 2.720 mm, ele tinha motor 1.975-cm³r de quatro cilindros com cabeçote em alumínio, duplo comando de válvulas, câmaras de combustão hemisféricas, válvulas de escapamento arrefecidas a sódio, carburador de corpo duplo de 34 mm, coletor de escapamento do tipo 4 em 2 e 2 em 1.
Seu câmbio já era de cinco marchas, grande novidade no Brasil, em que até a primeira era sincronizada, algo que só o DKW tinha. A suspensão dianteira era independente por triângulos superpostos com mola helicoidal e a suspensão traseira por eixo eixo rígido trazia molas helicoidais, também novidade absoluta nos carros nacionais, sendo o eixo devidamente localizado por triângulo sobre a carcaça do diferencial, dois tensores inferiores e barra transversal Panhard. Os freios a tambor eram de alumínio aletado para melhor arrefecimento, sendo os dianteiros duplex como os do Simca Chambord e, outra primazia nacional, os pneus eram radiais, no caso Pirelli CF67 165-400.
Boa parte desses recursos era inédita em praticamente todos os carros comercializados no nosso país, sendo que os de produção nacional sequer sonhavam em possuir tantos recursos. Até mesmo o Aero-Willys, lançado um mês antes do JK, podia ser considerado um carro “tosco”, desprovido de muita coisa de série do FNM.
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Espaçoso, o interior do JK tinha um chamativo velocímetro de escala horizontal, onde o motorista conferia a velocidade do carro através da marcação de uma espécie de fita vermelha que percorria toda a numeração, sem falar no conta-giros mecânico mediante um cabo ligado diretamente na base do distribuidor, e marcadores de temperatura da água e pressão do óleo. Como o Alfa original era um projeto pensado também para os EUA, as preferências daquele tipo de consumidor influenciaram em alguns pontos do sedã europeu, como alavanca de câmbio na coluna de direção, e banco dianteiro inteiriço — de couro, como traseiro —com encosto totalmente reclinável podendo virar uma confortável cama.
Já na sua fase como FNM 2000, ele teve até uma versão esportiva, inicialmente programada para se chamar Jango, em homenagem ao então presidente João Goulart. Por motivos políticos, quando a versão realmente chegou, em 1964, teve seu nome mudado para timb (Turismo Internacional Modelo Brasil). Nesse caso, o motor 2,0 do timb utilizava a mesma fórmula do que movia o Alfa 2000 sedã na Itália: tinha maior taxa de compressão (8,25:1) e dois carburadores horizontais de corpo duplo de 40 mm, que faziam sua potência subir dos originais 95 cv para cerca de 120 cv.
Embora não tivesse adereços especiais ou faixas decorativas, como é padrão em versões esportivas, o timb adiantava as linhas do que seria o futuro FNM 2150, lançado em 1969 no lugar do 2000 (tinha capô liso, grade mais baixa, para-choque sem garras, e suporte da placa de licença deslocado para baixo). O mesmo acontecia no interior do esportivo, que adotou bancos individuais na dianteira e alavanca de câmbio no assoalho, além de detalhes como o volante em madeira. Essas também foram mudanças que se tornaram padrão para toda a linha do sedã FNM a partir de 1969.
Dentre JK e 2000, a linha de sedãs da FNM até 1968 era bastante desejada, mas a produção fluminense tinha suas limitações, tanto que dificilmente conseguiam fazer mais do que 500 carros em um ano inteiro. No final, antes da chegada do 2150 ao Salão do Automóvel de 1968 como modelo 1969, números indicam que não muito mais do que 4.300 unidades dos FNM 2000 JK, FNM 2000 timb e FNM 2150 foram produzidos. Na próxima semana, não perca mais detalhes sobre sua sofisticada e moderna motorização 2-litros de projeto italiano!
DM
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