A Simca do Brasil nasceu em maio de 1958, com o objetivo de produzir em terras tupiniquins o Vedette, um projeto Ford que depois se tornou Simca (sigla de “Societé Industrielle de Mécanique et de Carrosserie Automobile”). No pós-guerra, a Ford queria de reconstruir sua indústria automobilística na França mas já em meados dos anos 1950, resolveu abrir mão dessa sociedade, e a marca francesa acabou por herdar o carro que havia sido projetado nos EUA no final dos anos 1940, utilizando inclusive seu famoso motor V-8 de 1932 que tanto sucesso fez no mundo.
Na hora de dissolver a sociedade, a Simca herdou o aparato industrial, e o projeto do carro, que, de imediato, já em 1958, viria para o Brasil em sua nova carroceria, apresentada no Salão de Paris quatro anos antes. A mesma base mecânica com outro design, utilizando o trem de orça típico da Ford, com motor V-8 de cabeçote plano (por as válvulas serem no bloco), câmbio de três marchas, tração traseira e suspensão dianteira independente McPherson (primeira no mundo) e traseira por eixo rígido com feixes de molas. Sua grande novidade era a construção unitária, monobloco, em vez carroceria sobre chassi.
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Aqui o sedã ganhou o nome de Chambord nome de famoso castelo na França) e foi produzido em São Bernardo do Campo, onde antes estava sediada a Varam Motores, que até então montava alguns carros americanos (Hudson e Nash). Sua produção como Simca Chambord começou em março de 1959, ainda com índice de nacionalização: muito baixo, apenas 25%. Na realidade, o carro vinha quase inteiro desmontado da França, e apenas alguns componentes específicos tinham produção nacional.
O novo sedã, de dimensões médias, manteve o V-8 de cabeçote plano (flathead em inglês) de 2,35 litros, batizado de Aquilon, que desenvolvia parcos 84 cv SAE brutos (cerca de 62 cv NBR atuais), potência inferior ao de motores 1-litro de aspiração atmosférica atuais), com torque que não ia muito além dos 15 m·kgf brutos. A transmissão também não era nada eficiente: p câmbio tinha apenas três marchas, sem sincronização da primeira, tendo que enviar a força do motor lá para as rodas traseiras, em um carro de quase 1.200 kg. Ou seja, é fácil concluir que desempenho não era seu ponto forte, muito pelo contrário.
Era a grande queixa da imprensa e consumidores da época: um carro bonito, de linhas modernas e bastante luxo, porém frouxo e lerdo para andar. Números oficiais da época informavam eternos 26,5 segundos para acelerar de 0 a 100 km/h, com velocidade máxima que mal atingia 135 km/h. Seu desempenho era desapontador.
Ainda assim, a Simca do Brasil marcou sua passagem com os sedãs V-8 pelo o dinamismo e rapidez com que promovia mudanças e melhorias nos seus produtos para atender os anseios do consumidor o mais rapidamente possível. Já em 1959 o Chambord surpreendia o mercado com alguns itens interessantes: iluminação no cofre do motor, porta-luvas e porta-malas, além de espelhos nos para-sóis, reostato da iluminação do quadro de instrumentos,, acendedor de cigarros e cinzeiro para os ocupantes do banco traseiro, luzes de localização dos interruptores e outros itens.. Sem contar o esmero no acabamento e estilo, especialmente do habitáculo.
A linha logo cresceu, em agosto de 1960, quando estreava o Simca Présidence, um Chambord ainda mais luxuoso e requintado, que custava cerca de 20% a mais que o modelo de origem, superando inclusive o rival FNM 2000 JK no preço final. Esteticamente, o luxuoso sedã era facilmente identificado pelo estepe fixado na tampa do porta-malas (alongando sua carroceria), e calotas metálicas raiadas nas rodas de aço, que o destacavam do Chambord, que seguia como opção mais barata. Como destaque, o trabalho árduo da Simca para nacionalizar ainda mais seus modelos, que, no início dos anos 1960, já tinham alto conteúdo nacional.
O ar-condicionado era outro grande destaque do novo Simca, item de conforto raramente encontrado em um carro nacional da época, acompanhado de bancos inteiriços forrados em couro e carpete de lã, que deixavam seu interior ainda mais acolhedor, além de descansa-braço e até um pequeno refrigerador para os passageiros traseiros.
Mais pesado, o Présidence teria problemas ainda maiores de desempenho, por isso a Simca se apressou em aperfeiçoar o antigo V-8. O motor ganhou dupla carburação e maior taxa de compressão, o que fez sua potência crescer em 10 cv, chegando a 94 cv SAE bruto (cerca de 70 cv atuais), mas ainda muito abaixo do necessário para seu porte e peso.
As atualizações da linha Simca não paravam. Ainda em 1961, tentando resolver o alto consumo e fraco desempenho, o V-8 teve aumentada sua cilindrada para 2.4 litros. no que a potência subia bastante no Chambord e no Présidence: 90 cv SAE no primeiro (ao redor de 67 cv NBR) e 105 cv SAE no segundo (78 cv de hoje). Se não resolviam o problema por completo, ao menos, o amenizava. A Simca ainda não dispunha de um câmbio de quatro marchas para seus sedans, então manteve a caixa de três marchas de alavanca na coluna de direção, agora com a primeira também sincronizada. Daí veio o novo nome da família: Três Andorinhas, em alusão as três marchas.
Mais um pioneirismo da marca no Brasil aconteceu em 1962 com o lançamento do Simca Rallye, um Chambord com aspecto esportivo e motor de Présidence (105 cv SAE). Foi o primeiro carro nacional com estética diferenciada remetendo a esportividade, graças as duas tomadas de ar circulares na dianteira, junto de diferenças de acabamento internas e externas, e uma paleta de cores com tons mais vivos. Era o carro com melhor desempenho da linha Simca da época, afinal utilizava o motor mais potente numa carroceria mais leve: levava pouco mais de 21 segundos no 0 a 100 km/h e passava dos 140 km/h de velocidade máxima.
Uma grande curiosidade, exclusiva da versão Rallye, era o recurso do avanço inicial da ignição regulável a bordo de acordo com a gasolina utilizada, a altitude da região e a demanda de desempenho. Quem regulava o avanço inicial era o próprio motorista por meio de uma pequena alavanca no painel. Dessa forma, era possível obter o máximo desempenho do motor em diferentes situações de uso, mas, claro, exigindo um bom conhecimento de mecânica por parte do proprietário, que podia danificar o motor se utilizasse o recurso de forma errada.
Depois, em 1963, também foi da Simca a primazia de oferecer a primeira camioneta de quatro portas de produção nacional. Ela, chamada de Jangada, era inteiramente baseada no Chambord, o que incluía o motor V-8 na configuração de 90 cv SAE. Além da harmonia estética, inclusive herdando o rabo-de-peixe do sedã, oferecia um ótimo espaço para bagagens, graças também ao banco traseiro de encosto rebatível (acomodando assim até 1.800 litros) e o acesso descomplicado ao bagageiro por uma tampa dividida, em que o vidro abria para cima e a outra parte, para baixo. A camioneta podia ter mais dois bancos no seu enorme compartimento de bagagem, elevando sua capacidade para impressionantes oito passageiros.
Na próxima semana, a continuação desta história: novo visual em 1964, Tufão, Super Tufão, Alvorada, motor Emi-Sul e mais. Não perca!
DM
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