A Sabrico, a primeira concessionária VW no Brasil e que teve várias sedes em São Paulo, sempre despertou minha atenção. Já escrevi sobre ela no meu primeiro livro, (“Eu Amo Fusca – A história brasileira do carro mais popular do mundo”) e também algumas vezes aqui nesta minha coluna. É um assunto diretamente ligado à chegada do VW Fusca no Brasil e que apresenta gloriosos altos e tristes baixos.
Quando ouço falar de Sabrico logo me interesso e vou ver do que se trata. E assim foi quando meu amigo de longa data, Luiz Antônio Buozzi, gentilmente me enviou o livro “Histórias que Transformam – Grandes líderes revelam os segredos da superação”. Fui direto ver a página 149 onde está a participação dele nesta coletânea.
Logo no início, no subtítulo “Quanto custam 40 anos de sua existência”, ele conta: “Meus primeiros passos no mundo profissional se deram como office-boy em uma concessionária Volkswagen, a Sabrico.” Li a excelente contribuição do Buozzi até o fim, mas aquela frase já tinha me marcado.
Entrei em contato com ele para parabenizá-lo por seu escrito e pela participação naquele trabalho, coordenado por Rebeca Toyama. Não perdi tempo e perguntei se ele não gostaria de contar como foi o tempo dele na mais grandiosa das localidades que a Sabrico teve durante sua existência. Ele gentilmente concordou e aí vai o que ele enviou:
Minha vida na Sabrico
Por Luiz Antônio Buozzi
Aos 14 anos, fui chamado para uma entrevista para a vaga de office-boy numa concessionária Volkswagen chamada Sabrico. Fui orientado a ir vestido de paletó e gravata, ou seja, de terno, pois era uma vaga para trabalhar diretamente com a Diretoria.
Achei o lugar lindo e grande, localizado na Avenida Francisco Matarazzo. Acredito que era uma das revendas Volkswagen mais bonitas, com um estilo próprio. O que mais chamava a atenção era uma rampa por onde os carros chegavam à oficina.
Eu estava nervoso, e ao chegar fui instruído para procurar a d. Lourdes, secretária do presidente, sr. José Ortiz. Eu seria o office-boy dela. Na entrevista, ela se mostrou bastante rígida; tanto que, ao perceber que eu estava mascando chiclete, mandou-me ir ao banheiro para jogá-lo fora. Pensei comigo mesmo que tinha começado mal, mas depois me saí muito bem na entrevista e fui contratado.
Posso dizer que foi uma das melhores coisas que poderiam ter acontecido comigo, pois a rigidez dela me ensinou desde cedo como me comportar no mundo corporativo. Quando não tinha nada para fazer, eu tinha que estudar, ler um livro ou uma revista. Na época, ela me dava uma revista chamada Realidade, que tinha assuntos interessantes, principalmente ligados à educação, ciência e tecnologia.
Eu me sentava em uma mesinha ao lado da mesa dela, em frente a um corredor que dava para ver a contabilidade e a tesouraria ao fundo, onde ficavam os outros office-boys, que passavam o tempo todo jogando baralho ou dominó. Sofri muito no começo, pois não conhecia bem as ruas do centro de São Paulo. Quando precisava ir a algum lugar, o Guia Quatro Rodas era minha salvação, além do passe de ônibus, fichas telefônicas (para os telefones públicos da época) e muitas informações que eu pedia às pessoas.
O que eu mais gostava era quando o diretor comercial, Sr. Brito, que também era presidente da associação que depois se tornaria a Assobrav (entidade que congrega os concessionários VW), me mandava junto com o motorista dele a algumas revendas pegar assinaturas em documentos. O carro era um VW Passat, e o sr. Waldomiro, o motorista, dizia para eu, que estava de terno, ir no banco de trás para que os outros pensassem que ele era meu motorista. Mas eu gostava mesmo era de ir na frente com ele (risos). Outro carro que era usado nestas atividades de colher assinaturas era um VW SP2, no qual eu só podia ir na frente., claro.
Outra coisa que eu gostava era, na hora do almoço, ir à oficina e ficar vendo os mecânicos mexerem nos carros. Eu adorava carros e talvez tenha sido a partir desses momentos que decidi estudar engenharia.
Eu me dedicava bastante, e a d. Lourdes começou a gostar de mim. Mais legal ainda foi a d. Norman, esposa do diretor administrativo, Sr. Carlos Bickar. Na época do Natal, ela me pediu para ajudar a distribuir os presentes e panetones para os funcionários no sábado. Foi aí que fiz minha primeira demonstração de que gostava de fazer diferente. Disse para a Dona Norman: “Essas famílias vêm aqui na Sabrico, pais, mães, filhos, apenas para pegar um brinquedo e um panetone. Por que não organizamos uma festa para eles com gincanas, comidas e bebidas? Nada muito caro, mas com certeza eles irão valorizar muito o que estamos fazendo para eles.” Ela concordou e, de verdade, fez a diferença.
Tive uma carreira bacana na Sabrico, passando por diversos setores e realizando serviços diferentes, como arquivo, microfilmagem, reconciliação bancária, balancetes. Em quatro anos, cheguei a ser subcontador. Consegui comprar meu primeiro carro, um VW Fusca 1968, todo branco por fora, com rodas de liga leve pintadas de branco, faróis de longo alcance pintados de branco, rebaixado com catraca. O interior era todo preto, com volante de 20 cm, bancos com reclinador, painel e luz interna com iluminação azul, conta-giros, voltímetro e um toca-fitas Teltron. Maravilhoso!
Mas aí passei no vestibular para estudar Engenharia e tive que pedir demissão. Minha mãe até chorou, pois ela queria que eu continuasse na Sabrico, mas o próprio Sr. Carlos me incentivou a sair, pois o filho dele também havia entrado na faculdade de Engenharia. O mais legal foi que, na minha saída, me deram uma gratificação pelo trabalho realizado, o que me ajudou muito a terminar de pagar meu Fusca.
E é isso, resumidamente, o que me lembrei.
Visita à Sabrico da Av. Antártica
A entrada principal da Sabrico ficava na Av. Antártica, que era o seu endereço, se bem que a entrada dos carros ficava na Av. Francisco Matarazzo, que faz esquina com a Av. Antártica. E havia a portaria dos funcionários que ficava na rua de trás que era a Rua Engenheiro Stevenson.
“Uma imagem vale mais que mil palavras” é uma expressão popular de autoria do filósofo chinês Confúcio, utilizada para transmitir a ideia do poder da comunicação através das imagens. Só que uma imagem sem uma legenda muitas vezes fica sem a devida clareza, e é aí que o Buozzi continua a participar desta coluna.
Eu tinha umas fotos oficiais de um álbum da Sabrico na Av. Antártica e eu as enviei para ele que gentilmente as detalhou como veremos adiante. Este trabalho mostra estas imponentes instalações da Sabrico em vários detalhes.
1 – Portaria principal
2 – Posto de combustível, lavagem, serviços rápidos
3 – Diretoria da época do Buozzi composta por:
Presidência Sr. José Ortiz
Vice-presidência: Dr. Calmon
Diretor administrativo: Sr. Carlos Bickar
Diretor comercial: Sr. Brito (presidente da associação que depois se tornaria a Assobrav)
Diretor jurídico; Sr. Ângelo Testa
Secretárias: Lourdes e Noêmia
4 – Recepção, showroom, vendas, entrega de veículos, consultores técnicos, CPD, caixas, café
5 – Contabilidade, tesouraria, cobrança, arquivo, microfilmagem, garantia, compras
6 – Funilaria, pintura, oficina, salas de Treinamento
7 – Estacionamento de veículos novos (no subsolo)
1 – Portaria social (entrada pela Av. Antártica, 408)
2 – Portaria principal de veículos (entrada pela Av. Francisco Matarazzo)
1 – Entrada de funcionários (em frente da antiga loja da Sears)
2 – Chaminé da pintura
3 – Refeitório
4 – Entrada de energia elétrica/cabine primária
1 – Entrada de veículos para o showroom
2 – Espera para retirada de veículos novos ou revisados
1 – Financiamento, cadastro, despachante
1 – Sala de espera
2 – Escada de acesso à diretoria, contabilidade e faturamento
3 – Salas das gerência de vendas e pós-vendas
4 – Cafeteria
5 – Showroom
1- Consultores técnicos
2- Escritório da oficina, sala do gerente da oficina
1 – Compras
2 – Caixas
3 – Faturamento
4 – Contabilidade
5 – Arquivo
6 – Contas a pagar
A Sabrico ministrava cursos para jovens e tinha um programa de curso de mecânica para mulheres.
1 – Área destinada para o pessoal do escritório, mas todos acabavam almoçando juntos. Aqui servia mais para o pessoal jogar dominó na hora do almoço
2 – Aquecedor de marmitas. Era ofertado para todos um copo de leite e um pão francês
3 – Departamento pessoal.
Estas foram as fotos do album da Sabrico, que certamente permitiram uma bela visita a esta que foi um dia uma grande concessionária.
Como ficou a área que era da Sabrico da Av. Antártica?
O Shopping West Plaza tem três blocos. O bloco A foi construído onde era uma loja Sears que eu conhecia. Ela foi construída seguindo o projeto padrão de lojas desta rede nos EUA. Até as vitrines externas e displays internos seguiam um manual americano. Esta loja tinha até um gerador próprio dimensionado para a carga total dela.
O bloco B ocupa a área que foi da Sabrico e o bloco C foi uma construção nova num terreno que estava vago na época. Abaixo uma foto aérea do Shopping West Plaza, já com o Viaduto Antártica, sobre a Av. Francisco Matarazzo pronto:
1 – Bloco A que ocupa a área que foi da loja Sears
2 – O que restou da antiga Rua Engenheiro Stevenson, hoje uma passagem de pedestres entre os blocos A e B. Antigamente esta rua separava a Sabrico da Sears.
3 – Bloco B que ocupa a área que foi da Sabrico.
4 – Bloco C
5 – Viaduto da Av. Antártica
6 – Av. Francisco Matarazzo
Agradeço a mais esta participação do amigo Luiz Antônio Buozzi na minha coluna, desta vez com um mergulho mais profundo no passado trazendo suas memórias e esclarecendo as fotos da Sabrico.
AG
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