Agora em julho de 2024, o Passat fez exatos 50 anos de Brasil, mudando a história da Volkswagen brasileira. Ele foi o primeiro da marca com motor arrefecido a líquido e tração dianteira, características técnicas jamais utilizadas pela VW aqui. Na realidade, o lançamento do Passat marcou o início do fim da era dos envelhecidos modelos de motor boxer arrefecido a ar, aqueles que tinham em comum o chassi-plataforma de túnel central com suspensão, direção, suspensão e freios muito semelhantes aos do Fusca. Literalmente, há 50 anos iniciou-se, dentro da marca de Wolfsburg, uma mudança de era: do ar para a água, da tração traseira para a dianteira, com mecânicas ainda mais eficientes e econômicas.
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O primeiro Passat, surgido na Alemanha em 1973, era oriundo do Audi 80 do ano anterior, e compartilhavam o arcabouço B1, o mesmo do nosso Passat lançado em 1974. Esse arcabouço, ou plataforma, referia-se à linha de sedãs médios da VW e também para camionetas. Basicamente, o Passat era um Audi 80 com carroceria desenhada por Giorgetto Giugiaro, por sua empresa de design Italdesign, de Turim, Itália. A diferença de desenhos estava na traseira, a do Audi uma três-volumes, enquanto a do Passat era semi-fastback.
O Passat inovava na disposição do motor no seu compartimento, longitudinal mas inclinado 20º para a direita (para reduzir sua altura final e possibilitar um capô mais baixo) e deixando espaço para o radiador ficar à sua esquerda, diferentemente do habitual radiador à frente do motor. Junto com essa inovação veio outra, o acionamento do ventilador por motor elétrico em vez de pela tradicional solução de acionamento pelo motor via correia trapezoidal. O ventilador entrava em funcionamento automaticamente sempre que a temperatura do líquido de arrefecimento ultrapassava determinado ponto. e desligava-se sozinha quando o líquido perdesse temperatura. Com isso, não se utilizava uma parte da potência para alimentar o motor do ventilador permanentemente.
O ventilador só funcionava quando havia pouco fluxo de ar pelo radiador, como em velocidade baixa do veículo, especialmente no trânsito urbano com seu anda e para. A partir de 60 km/h o fluxo de ar era suficiente para o radiador efetuar a troca de calor com o ar. Em velocidades de viagem ele permanecia desligado.
O motor EA827 de 4cilindros em linha de 1.471 cm³ (76,5 x 80 mm) do Passat, também emprestado do Audi e desenvolvido pela Mercedes-Benz (proprietária da Auto Union antes da VW), Era uma arquitetura moderna, com a árvore de comando de válvulas no cabeçote acionado por correia dentada que atuava diretamente nas válvulas por tuchos tipo copo com pastilhas removíveis para ajuste da folga de válvula sem necessidade de retirar o comando de válvulas, como era no FNM 2000 JK. Desenvolvia 65 cv a 5.600 rpm com torque de 11 m·kgf a 3.200 rpm.
O câmbio era de quatro marchas e o acionamento das rodas trazia a inovação das juntas homocinéticas em vez de juntas universais como no Ford Corcel, o primeiro tração-dianteira de motor 4-tempos fabricado no Brasil, lançado em 1968.
O motor, utilizava um carburador de corpo simples e mostrava-se valente, potente e elástico, logo agradando o consumidor brasileiro. Ainda que não fosse dos mais rápidos — 0-100 km/h em 17 segundos e velocidade máxima de 150 km/h — o carro acomodava com conforto cinco ocupantes e suas bagagens no porta-malas de 470 litros. Havia ainda no conjunto uma direção precisa, tipicamente alemã, e leve que até dispensava assistência, ajudado pelo peso em ordem de marcha de apenas 930 kg. Um senão era o trambulador um tanto “borrrachudo” e impreciso após algum tempo de uso, problema resolvido em 1977 com o novo comando de câmbio, muito mais preciso, direto e justo e que se tornou referência na indústria.
E, na dinâmica, vantagens: na geometria da suspensão dianteira, a particularidade do raio de rolagem negativo — outra primazia do Passat —, permitindo que o carro mantivesse a trajetória, sem perda de controle, no caso do estouro de um pneu, por exemplo. Pneus, aliás, que no caso dele já eram radiais (155SR13), o segundo carro brasileiro de produção seriada com tal modernidade, precedido pelo FNM 2000 JK em 1960.
Os freios eram a disco na dianteira e a tambor na traseira com duplo-circuito hidráulico em diagonal (só possível com o raio de rolagem negativo, ou carro ficaria incontrolável no evento de falha num dos circuitos hidráulicos) mas sem servo-freio, que fazia falta, tanto que em 1975 passou a ter.
O Passat foi lançado no Brasil em duas versões, L (Luxo) e LS (Luxo Super), em uma época que ar-condicionado, direção assistida e vidros ou travas elétricas inexistiam no segmento. E, tempos depois, além da LM intermediária, chegou a tão falada TS (Touring Sport), versão esportiva que utilizava a variação de 1.588 cm³ (79,5 x 80 mm) do motor do lançamento, equipada ainda com carburador de corpo duplo e sistema de escapamento 4 em 2 até o o primeiro plano de junta. Com cilindrada aumentada, alimentação caprichada e escapamento mais elaborado, o motor do TS entregava 80 cv a 5.600 rpm e 12 m·kgf a 3.650 rpm. Acelerava de 0 a 100 km/h em 13 segundos a atingia 160 km/h.
O TS dava trabalho aos grandões seis-em-linha e V8 (Charger, Opala, Maverick…), especialmente nas curvas, onde o VW mostrava superior comportamento e estabilidade. Era fácil reconhecê-lo: só o Passat TS tinha quatro faróis e uma faixa lateral decorativa. Internamente, um enorme volante esportivo de três raios, bem ao estilo alemão, console central e instrumentação completa (conta-giros, manômetro e termômetro do óleo). O Passat TS era bem mais caro que os demais, mas serviu bem para firmar a imagem do carro da VW como um modelo de alta performance e dinamicamente acertado, fazendo sucesso inclusive nas pistas de corrida.
O Passat durou bastante no Brasil sem trocar de geração: até o finalzinho de 1988, quando era fabricado apenas na versão GTS Pointer 1.8. Nesses 14 anos de produção, quase 900 mil carros deixaram as linhas da VW em São Bernardo do Campo, inclusive aqueles exportados para o Oriente Médio, África, América Latina e afins.
Um marco para a Volkswagen brasileira, que usou o conceito construtivo do Passat na maioria dos seus modelos dali em diante. Cinquenta anos depois, ainda um belo e moderno carro!
DM
(Atualizada em 12/8/24 às 16h10, complemento de informação, o Ford Corcel foi o primeiro tração-dianteira de motor 4-tempos fabricado no Brasil.)
A coluna “Perfume de carro” é de exclusiva responsabilidade do sue autor.