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A Renault virou estatal depois da morte de seu fundador e único dono, Louis Renault, em 1944. Depois de passar quase meio século sob a tutela da República da França, foi privatizada pouco menos de 20 anos atrás, tornando-se uma empresa de capital aberto. Olhando estas três eras distintas, alguém pode imaginar o que liga isso tudo, o que há de comum entre elas. A Renault de Louis carregou algo para a Renault estatal do pós-guerra? E esta estatal do passado, por sua vez, tem algo de comum com a moderna Renault de 2015?
Na verdade, a empresa é um dos raros casos onde o espírito e as paixões iniciais passaram de geração a geração por décadas a fio, através de grandes crises e de tempos prósperos, e por sucessivos donos, sem mudar quase nada. Existe uma linha de evolução clara, ininterrupta, na história da empresa, algo realmente muito difícil de acontecer. O mais comum é tudo mudar assim que o novo chefe se senta na cabeceira da mesa… E este espírito imutável, para nossa alegria, é a paixão pelo automóvel.
Em nenhum lugar ele fica mais óbvio que na dedicação da companhia às competições. Desde o início, com Louis e Marcel Renault pilotando seus carros de Grand Prix pré-históricos, até à Fórmula 1 de hoje, a dedicação da fabricante ao esporte-motor nunca falhou. Seja nas estradas de Le Mans, nas florestas onde carros de rali batalham, seja em Mônaco ou Nürburgring, a Renault sempre esteve presente. E mais ainda: sua dedicação ao esporte a fez criar categorias de entrada como a Fórmula Renault, verdadeiro berço dos pilotos da F-1 atual.
Mas não só aqui esta duradoura paixão da empresa pelo automóvel aparece. Quase como conseqüência, os carros esporte que ela produziu e vendeu ao público se tornaram também lendas. A Renault é uma empresa de alto volume, sim, mas nem por isso deixa de lado o entusiasta. Na verdade, como veremos na lista a seguir, é uma empresa que se dedica a colocar desempenho de primeira linha ao alcance dos meros mortais. Os Renault esportivos sempre tiveram um viés de realidade, de carros que realmente podem ser comprados por uma grande parcela da população, e que muitas vezes podem ser usados como o único carro da família. Às vezes não seguem a velha definição de carro esporte (pequeno, dois lugares), mas o são atrás do volante. Se você, como eu, simplesmente não pode manter um carro para usar só como brinquedo de fim de semana, pode entender o forte apelo de alguns deles.
Então, sem mais delongas, apresento-lhes os dez melhores carros esporte já vendidos pela Renault ao público durante sua longa história. Em ordem cronológica, são eles:
1) 40CV Type HF “9 litre” (1920)
O Renault 40CV era o topo da gama da empresa nos anos 1920. Equipado com um enorme motor seis-em-linha de 9,1 litros, era normalmente encaroçado como limusine para a camada mais importante da sociedade francesa, um rival à altura dos Rolls-Royce e Hispano-Suiza. Mas dois engenheiros da empresa, Plessier e Gartfield, tiveram uma idéia para mostrar o potencial esportivo deste leviatã: uma versão para recordes de velocidade.
O resultado foi um cupê minimalista, com área frontal reduzidíssima, capaz de ultrapassar os 200 km/h, algo impensável nos anos 1920 fora das pistas. O carro foi levado para o então novíssimo autódromo francês de Montlhéry, onde bateu dois recordes: 50 milhas (80 km) à média de 190,013 km/h e 24 horas a uma média de 173,649 km/h.
2) Renault 1093 (1962)
A versão mais potente do Dauphine/Gordini, criada originalmente para ser homologada visando as competições de rali. Veio também para o Brasil, onde toda a linha Dauphine era produzida sob licença da Renault pela Willys-Overland do Brasil. Curioso é que muitos achavam que 1093 era a cilindrada do motor, mas na verdade este deslocava os mesmos 845 cm³ do Dauphine e do Gordini: 1093 era a designação interna do projeto na Renault, que acabou virando nome oficial (o Dauphine era o 1090 e o Gordini, 1091).
Um carrinho esportivo divertidíssimo, o 1093 vinha com taxa de compressão mais alta (9,2:1 em vez de 8:1 do Gordini), carburador Solex 32 de corpo duplo progressivo, comando mais bravo, molas de válvulas duplas e coletor de escapamento tubular 4-em-1, 4ª marcha mais curta, tambores de freio dianteiro aletados e, algo raríssimo então, um conta-giros mecânico da marca Jaeger no painel! Como era um tempo mais simples aquele!
Em 1965, o Bob comprou um dourado, carro que lembra com extremo carinho hoje. Em retrospectiva, nos conta que: “Era notável o som mecânico do motor devido ao comando de rampa de ressalto mais abrupta, era música para autoentusiastas, aquele som de motor atiçado, com leve ruído metálico emanando do cabeçote. Era girador para seu tempo, potência máxima a 5.800 rpm mas ia com facilidade a 6.200~6.300 rpm.”
3) Alpine A110 (1962)
O Alpine A110 era descendente direto do A108, carro que conhecemos aqui como Willys Interlagos. Derivado do Dauphine/Gordini e herdando a sua mecânica, o A108 era um berlinette — pequeno sedã esportivo em francês, equivalente a berlinetta em italiano — de desenho belíssimo e atemporal, com carroceria fabricada em resina poliéster reforçada com fibra de vidro.
O A110 foi uma versão mais parruda do A108/Interlagos. Em aparência, rodas maiores, mais aberturas de refrigeração, faróis auxiliares de longo alcance incrustados na frente. No cofre, saiam os pequenos quatro em linha de 845 cm³, e entravam os motores maiores do R8, de 1,1 até 1,4 litro. Eventualmente, receberia também versões desenvolvidas do motor de alumínio do R16, bem como outros motores de quatro cilindros da Renault, em versões até 1.600 cm³. As suspensões e freios também passavam a ser as do R8.
O A110 era um carro baixíssimo, e muito leve. Com uma capacidade de tração invejável e uma suspensão bem acertada, era um carro de rali quase imbatível. E nas ruas, seus pequenos motores Renault Gordini, preparados, bravos, ardidos, tornavam eles carros muito difíceis de acompanhar, mesmo se você estivesse num carro esporte caro e exótico. Um verdadeiro matador de gigantes, um clássico imortal.
4) R8 Gordini (1965)
Sempre pintado de azul, e com duas faixas brancas, o pequeno R8 Gordini é bem diferente do que sua pacata aparência de caixotinho em três volumes leva esperar. O carro é leve, pesando 865 kg. Suspensões de triângulos superpostos na frente e traseira por semieixo oscilante com tensor controlada por dois amortecedores por roda são complementadas por freios a disco nas quatro rodas, algo raríssimo em 1965.
O motor é um quatro-em-linha de cinco mancais, comando no bloco e 1.108 cm³. Parece algo sem graça até aqui, mas tem mais: o cabeçote especial Gordini é de fluxo cruzado, vela central, válvulas opostas e câmara de combustão hemisférica, tal e qual um DOHC. É alimentado por dois Solex duplos horizontais, para nervosos 95 cv. Logo evoluiu para 1.255 cm³, dois Webers 40 DCOE, e 110 cv a quase 7.000 rpm. E lembre-se: 865 kg. Um carrinho de dar água na boca, não?
O R8 Gordini ainda é sonho de todo entusiasta que tenha um gosto apurado para o que realmente importa em um carro esporte: motor bravo, girador, liso, ardido. Baixo peso, comportamento exemplar em curvas, e freios de primeira linha. Pode não ser bonito, nem veloz olhando-se apenas os números, visto de 2015. Mas ainda é, mesmo no cínico ano de 2015, uma das mais incríveis experiências ao volante que se pode ter.
5) Renault Torino (1978)
O Torino entra na família Renault tarde em sua vida, que se iniciou na verdade em 1966 na IKA (indústrias Kaiser de Argentina), tornando-se um Renault só em 1978. Mais um fruto da longa história de joint ventures da Renault com as empresas que viriam a formar a American Motors Corporation, e que culminam com a compra da AMC pela Renault em 1980. O Torino, filho adotivo, é, portanto, intrinsecamente parte da história da empresa francesa, emblemático até desta longa ligação com a AMC e de sua grande dedicação ao nosso mercado sul-americano.
O carro é um híbrido baseado no Rambler American de 1965, mas equipado com um seis-em-linha Jeep que fora abandonado nos EUA, que teria vida longa e grande sucesso na Argentina. Com sete mancais, tinha comando no cabeçote e válvulas opostas, para uma câmara de combustão hemisférica. A versão mais interessante era a 380W, com 3,8 litros e três carburadores Weber DCOE duplos horizontais de 45 mm, para 220 cv e mais de 210 km/h de final. O resto do carro também era bem diferente do Rambler: estilo retrabalhado pela Pininfarina, painel de madeira, câmbio manual de 4 marchas, suspensões mais esportivas.
Ainda hoje é adorado por uma multidão de argentinos, que se reúnem em vários clubes, e mantêm uma indústria de peças de preparação para os carros. Um Renault como nenhum outro e um verdadeiro muscle car da Argentina.
6) R5 Turbo (1980)
O R5 turbo nasceu como um carro para rali, um carro de competição dedicado enquadrado nas regras do Anexo J/Grupo B ditadas pela FIA, carros especiais derivados de modelos produzidos em série, mas que para homologação esportiva era requerida a produção mínima de 400 unidades num período de 12 meses. Quando a Renault percebeu que turbocomprimindo o seu motor Gordini “Hemi” de 1,4 litro o potencial era quase ilimitado para potência, percebeu também que precisava de um carro de rali mais moderno para usá-lo; o Alpine A110 estava no fim de sua vida útil como carro de corrida.
A solução para este problema foi genial: pegaram o carro de maior venda da empresa, o R5, e colocaram o motor onde normalmente ficava o banco traseiro. Acoplando este motor a um transeixo, fazia-se a transformação do R5 de motor e tração dianteiros em um carro de motor central-traseiro e tração traseira! O R5 Turbo resultante, com seus pára-lamas traseiros alargados e sua suspensão dianteira herdada do A110, se tornou não somente um campeão de rali, mas um dos mais fantásticos carros de rua jamais criados. Um clássico imortal.
7) Clio Williams (1993)
Em 1993, a maioria das pessoas ainda achava que carros de tração dianteira nunca seriam carros esporte de verdade. Sim, existiam carros divertidos com tração dianteira, mas ainda eram considerados algo de segunda linha, um placebo para quem não podia ter um tração-traseira. O credo vigente era que nunca se conseguiria atingir o nível excelência em comportamento e de precisão de direção presente nos melhores tração-traseira num carro com motor e tração dianteiros. Muito subesterço inerente, muitas intervenções na pureza da direção.
O Clio Williams original foi um dos grandes agentes de mudança aqui. Uma versão esportiva do Clio, carro pequeno que substituiu a segunda geração do R5 em 1990, o Williams tinha este nome em homenagem à equipe de F-1 que usava os motores Renault na época. Mas a equipe Williams não teve influência alguma na engenharia deste carro, obra de pessoas que, na verdade, começava ali a fazer história: a Renault Sport.
O carro tinha um brilhante 2-litros DOHC de 16 válvulas e 147 cv. A suspensão era toda reformulada, eram usadas rodas Speedline douradas e os pára-lamas foram alargados. Mas era o comportamento dinâmico que brilhava aqui: o carrinho atacava as curvas com uma voracidade incrível, com uma controlabilidade e diversão semelhantes às os melhores tração-traseira, aparentemente ignorando o fato que isso devia ser impossível…
O Clio Williams ainda é hoje considerado um dos melhores hot hatches — hatchbacks de alto desempenho — já feitos em todos os tempos. A imprensa especializada não se cansa de colocá-lo num pedestal. Um marco histórico e o primeiro carro de uma linhagem que perdura até hoje.
8) Renault Sport Spider (1996)
Os criadores do Clio Williams se superaram em sua criação seguinte: um carro esporte de dois lugares. Criado para ser vitrine tecnológica da empresa, era levíssimo, baixo, espartano e tecnologicamente avançado.O chassi era totalmente em alumínio e a carroceria, em compósito de plástico reforçado com fibra de vidro. Era extremamente espartano, sendo desprovido até de qualquer tipo de teto de lona. Até pára-brisa era opcional!
O motor era central-traseiro, um quatro-cilindros de 2 litros, 16 válvulas e 150 cv, o que para um carro de apenas 900 kg era suficiente para muita diversão. Apenas algo em torno de 1.800 carros foram fabricados.
9) Clio V-6 Renault Sport (2000)
Outro produto da Renault Sport, o Clio V-6 foi um renascimento do conceito do R5 Turbo para o ano 2000. Praticamente um presente da empresa para o entusiasta da marca, um reedição do clássico hatch familiar com alma de carro esporte e motor central.
Mas o Clio desta vez não usava turbocompressor como seu irmão R5; seu motor era um V-6 3-litros de aspiração natural e 255 cv. Se o antigo R5 Turbo era uma tonelada de dinamite (“copyright” JLV), do que chamar isto? Três megatons de energia nuclear? Outro futuro clássico.
10) Mégane R.S. Trophy 275
Versão mais atual e mais extrema do Mégane R.S. testado pelo Ae no início deste ano, e que me deixou pasmo com seu desempenho superlativo em qualquer situação. Um carro que pode ser usado normalmente no dia a dia, mas com um desempenho de gente grande, de superesportivo.
É simplesmente o mais veloz e fantástico carro de tração dianteira jamais criado, capaz de fazer uma volta no Nordschleife (anel norte) de Nürburgring, de 20,832 km, em 7 minutos e 54 segundos, média de 158,217 km/h, novo recorde para tração dianteira. Se você ainda acha que tração dianteira é chato, precisa dar uma volta com vontade num Mégane R.S.: é um carro que torna tênues as fronteiras de um carro familiar e um supercarro, algo inimaginável pouco tempo atrás. Simplesmente incrível.
11) Sandero R.S.
Tudo bem, a lista é de dez, e o Sandero está sendo lançado hoje (9/9), então teoricamente não poderia estar aqui. Ser o décimo primeiro numa lista de dez é ficar de fora, na verdade. Mas coloquei-o aqui porque não podia deixar de falar dele numa lista assim. O Sandero R.S. é simplesmente a melhor notícia de 2015 para o autoentusiasta brasileiro. Um carro que pode ser o único carro da família, e ao mesmo tempo divertir horrores o pai de família num trackday no fim de semana. E na segunda feira voltar a levar as crianças à escola.
Toda esta magnífica linhagem de carros esporte da Renault está agora disponível para nós em um pacote de desempenho brilhante, preço justo e praticidade ímpar. Não sei vocês, mas eu quero um para mim! Muito!
MAO