Eu sempre digo que na minha vida tem de tudo menos tédio. Bom, dentro dessa teoria, a sexta-feira passada foi como outra qualquer. Só que não. Fomos acordados pelo interfone pouco depois das seis e meia da manhã para ouvir um rápido: “Dona Nora, os bombeiros mandaram todo mundo sair. É para evacuar o prédio. Já.” Meio sonolenta por uma curtíssima noite de sono, insisti. É sério? É para sair agora mesmo? Que aconteceu?. “Um acidente. Temos um vazamento de gás. Saiam já”. Senhor, sim senhor, pensei eu. Voltei para o quarto correndo para repetir a ordem para o meu marido.
Ao abrir a porta de serviço, o forte cheiro de gás não deixou dúvidas. Descemos correndo pela escada, só pensando em chegar ao térreo antes que tudo fosse pelos ares. Lá embaixo, vimos um monte de gente sonolenta, dois helicópteros, bombeiros paramentados como se esperassem uma explosão nuclear, policiais, Comgás, CET… e aí entendemos tudo. Um carro todo arrebentado, de lado, contra a mureta do prédio, bem na entrada de água e gás do edifício.
Estamos entre os primeiros moradores do prédio, há oito anos. Já não sei quantas vezes e quantos síndicos pediram providências à CET para a rua. O percurso é sinuoso, com subidas e descidas, asfalto (hein? Nem dá para chamar o que há nesta pista de off-road de asfalto) em péssimas condições, curvas mal feitas que brigam com as forças centrípeta e centrífuga e insistem em jogar os veículos para fora do traçado. Toda essa incompetência faz com que tenhamos pelo menos um acidente por mês, de maior ou menor gravidade. Um com morte há alguns meses. As árvores que dividem as pistas já foram repostas não sei quantas vezes e ainda assim faltam mais de 50% delas, assim como as luminárias. As do meu prédio então… os jardineiros não param de repor coqueiros e outros espécimes que não conseguem vingar. Coitadinhos, na mais tenra idade falecem de fraturas múltiplas e expostas ou mesmo decapitações.
As respostas das autoridades aos diversos apelos chegam a ser kafkianas. Ao pedido de colocação de lombada eletrônica disseram que não porque há uma a menos de 2 km. Quanta à utilidade da outra, ou remanejamento dela, nenhuma reposta. Pedido de mudança do local do ponto de ônibus, que fica exatamente onde o carro capotou semana passada por ser obviamente um local extremamente vulnerável. “Não há linhas de ônibus nessa via”. Ora, as duas que vemos todos os dias passarem por ali e onde eu mesma desci várias vezes seriam clandestinas? Mas estão no site da SPTrans! Ao pedido de se tomar “alguma medida”, a resposta foi de que “não há volume de acidentes significativo” que justifique a adoção de medidas na via. E tudo isto foi por escrito, portanto não é fruto de alguma alucinação ou mal entendido. Ora, 76 mortes num ano, na marginal Pinheiros fizeram a CET baixar o limite de velocidade para 70 e 50 km/hora em toda a marginal mesmo com o volume gigantesco de veículos que circulam por lá, mas acidentes todos os meses com vários graus de gravidade não? Um prédio com umas 200 pessoas que poderia ter ido pelos ares não é suficiente? Ah, e esqueci da escola que fica ao lado e deve ter uns 3.000 alunos. Mas por ser particular deve ser considerada de “coxinhas” e então, literalmente, que se exploda…
O motorista deste furdúncio todo fez o teste do bafômetro no local que acusou 0,35 mg/l, segundo me disse um dos policiais. O toque tragicômico ficou por conta da esposa que disse que ele bebeu a noite inteira e que ele fazia isso sempre, e que apesar de ser um homem maduro se comportava como moleque. Ele foi levado ao hospital e provavelmente vai pagar multa e perder a CNH por um ano. Eu tenho minha CNH desde os 19 anos e nunca, nunca, me foi pedida. Ela me é mais útil como documento de identidade do que para qualquer outra coisa. Não seria o caso de se exigir de pessoas que provocam acidentes provem que estão realmente em condições de voltar a dirigir com exames práticos mais rigorosos e talvez uma habilitação temporária até que conquistem o direito de uma definitiva se não houver novos acidentes?
Claro que as condições de minha rua são horríveis, mas o que dizer dos nossos motoristas? Tenho certeza que cerca de 30% não passariam num exame minimamente rigoroso — e outros 30% dos veículos que circulam por aí também seriam reprovados. E me refiro às condições dos veículos, não à documentação, que embora possa estar irregular não tem a ver com segurança.
Para não parecer que estou exagerando, apenas no dia anterior a este incidente (recuso-me a chamar algo tão previsível como isto de acidente) havíamos trocado o portão da outra garagem pois outro carro havia capotado na outra entrada apenas 12 dias antes. As marcas de pneu na parede não me deixam mentir. Por mais imbecis que haja na cidade, duvido que todos eles resolvam sair para dirigir na minha rua. Deve ter alguma coisa errada com o traçado e a manutenção dela, não? Quando saio para caminhar corro até entrar no parque a uns 50 metros de casa pois tenho medo de ser atropelada na calçada. E, sinceramente, faz quase um mês que não vou apesar de ser um dos meus passeios prediletos pelo mesmo motivo. É ridículo correr na calçada para caminhar no parque. As pessoas normais costumam fazer ao contrário.
Não sei se vai mudar alguma coisa, mas desta vez apareceram um monte de jornalistas e houve (mais uma vez) cobrança às autoridades por alguma providência. Como a rua ficou interditada um tempão nos dois sentidos, o trânsito travou até o raio-que-o-parta. Veio rádio, TV, tudo. Eu fui entrevistada e apareci na televisão, em duas emissoras e na rádio. Aliás, é impressionante como tem gente que vê o noticiário do meio-dia e o da tarde – ou como eu tenho amigos, sei lá. Passei boa parte da tarde respondendo e-mails e WhatsApp.
Como nestes oito anos nem a CET, nem a Prefeitura nem a subprefeitura fizeram absolutamente nada, eu preparei uma lista das coisas que já sei farei da próxima vez, baseada na minha experiência da semana passada. Afinal, eu sim aprendo com os erros e extraí algumas lições:
– deixarei um terninho Louis Vuitton ao lado do criado mudo que vou comprar hoje, já, agora, assim como uns sapatos mega lindos Louboutin. Não quero que a imprensa me pegue novamente de tênis, calça de ginástica e a primeira camiseta que encontrei na gaveta – OK, do Barça, e legítima, paguei 85 euros, mas ainda assim.
– idem para a maquiagem. Assim, de cara lavada e despenteada, nunca mais!. De chuquinha no cabelo? Daqui para frente, escova e linda, sempre.
– não deixarei que me filmem de perfil. É meu pior ângulo. Agora sei disso. E é verdade que a câmara de TV nos aumenta 5 kg. E tinha umas duas apontadas para mim. Tenho certeza disso.
– óculos de sol, sempre! por isso os famosos não os tiram nem à noite. O sol estava batendo no meu rosto e eu não parava de piscar durante as entrevistas.
– fazer alongamento de hora em hora, mesmo à noite. Aliás, acho melhor nem dormir. Descer 14 andares assim, de supetão, me deu um baita estiramento na panturrilha direita que ficou dolorida por dois dias.
Mudando de assunto: Alonso reclamar já faz parte do “combo”. É como o número 1 do McDonald’s: sanduíche Big Mac, batata frita e refrigerante. A gente pede uma coisa e vem tudo junto. Mas que cansa, cansa. Ele é bom piloto, ninguém nega, mas quer tudo pronto. E usar o rádio para dizer que a McLaren tem motor de GP2 em Suzuka propositadamente, para todo mundo ouvir quando o salário dele é pago pela Honda é de uma indelicadeza ímpar. Afinal, foi ele quem foi pedir emprego lá — e ainda tem o maior salário entre todos os pilotos deste ano, com 35 milhões de euros. Podia pagar umas aulinhas de boas maneiras com isso.
NG