Golpe da Seguradora Líder pode chegar este ano a 1,8 bilhão de reais, 20% dos valores arrecadados pelo seguro obrigatório.
Cada vez que o dono de um veículo, no começo do ano, paga a licença anual para o governo, é obrigado também a recolher o seguro obrigatório para uma empresa que congrega 78 companhias de seguros de todo o país, a Seguradora Líder. Ela continua monopolizando o DPVAT (Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres, ou por sua Carga, a Pessoas Transportadas ou Não) e movimenta quase R$ 9 bilhões por ano apesar de várias denúncias dos Ministérios Públicos de Minas Gerais (Montes Claros) e Rio Grande do Norte (Natal) que levantaram dezenas de documentos que comprovam milhares de irregularidades. E estimam que o golpe nos valores arrecadados pode chegar a cerca de R$1,8 bilhão por ano.
O DPVAT pago por todos os veículos (carros, motos, caminhões, ônibus, picapes, jipes) deveria ser o suficiente para cobrir as vítimas de acidentes de trânsito. Mas existe um superfaturamento que permite desvios bilionários destes valores. Do total que se arrecada, metade vai para o governo (45% para o SUS, 5% para o Denatran). A outra metade se destina ao pagamento de indenizações às vítimas, despesas administrativas e operacionais, impostos e outras. Entre elas, uma incompreensível “despesa de corretagem”, pois se este seguro obrigatório, pagar corretagem no valor (este ano) de R$ 61,1 milhões a título de quê?
Outra maracutaia do DPVAT é o valor fixo da indenização: a legislação que criou o seguro obrigatório em 1966 estabeleceu, para casos de morte ou invalidez permanente, o valor de 40 salários mínimos, que corresponderiam hoje a R$ 35.200. E de 8 SM (R$ 7.040 atualmente) para reembolso de despesas médicas e hospitalares. Mas o lobby das seguradoras eliminou a correção e fixou a indenização, em 2007, em R$ 13.500 (morte) e R$ 2.700 (reembolso de despesas). Hoje, dez anos depois, o valor pago pelo dono do veículo subiu 39% (de R$ 76,08 para R$ 105,65 no caso dos automóveis) e a indenização continua a mesma, com valores irrisórios diante dos custos crescentes de médicos, hospitais, remédios e funerais. A Líder tem suficiente “cara de pau” de justificar o valor fixo sob o argumento de que o número de acidentes aumentou muito no período. E se esquece de que aumentou também o número de veículos que pagam o DPVAT… e o número de idiotas forçados a acreditar em suas ponderações.
Entretanto, o problema mais grave do DPVAT são as fraudes, os milhares de pagamentos feitos irregularmente e comprovados pelo Ministério Público. Em abril do ano passado, a Polícia Federal realizou uma operação (“Tempo de Despertar”) com 229 mandados judiciais no Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia que resultaram na prisão de médicos, dentistas, fisioterapeutas, policiais e agentes de seguros. Segundo o MP, a Seguradora Líder é conivente com a maracutaia, o que não é de se estranhar: vários de seus diretores e membros do conselho de administração são sócios das empresas envolvidas, todas acusadas pelo MP de atividades ilícitas e fraudulentas. A Líder conseguiu habilmente reverter a situação e alega que ela seria, na verdade, a vítima das fraudes cometidas por empresas prestadoras de serviços. Que são as mais variadas, desde falsificação de assinaturas em procurações, falsas declarações de residência, pedido irregular de indenização de invalidez permanente, pagamentos de seguros baseados em laudos médicos e ocorrências policiais falsificadas e diversas outras.
Este monopólio do seguro obrigatório vem sendo questionado e projetos de lei no Senado e na Câmara dos Deputados já tentaram pôr um fim a essa maracutaia. Mas, por enquanto, o lobby da Líder fala mais alto que o interesse do cidadão.
BF