O governo brasileiro comete a imoralidade de manter as multas do veículo que já mudou de mãos. O congresso aprovou, há alguns anos, um projeto de lei para corrigir esta aberração, vetado pelo presidente Silva.
Multa de trânsito, para o código de trânsito, é punitiva/educativa. Para a maioria dos motoristas, não passa de uma bem montada arapuca para incrementar a arrecadação dos cofres públicos. Já ouvi do secretário de finanças de um prefeito que o faturamento previsto com multas é incluído no orçamento do ano seguinte…
Numa rodovia, por exemplo, as “lombadas” eletrônicas (portais sobre a estrada com radares) podem ser educativas. Mas “pardais” escondidos nos postes e radares do tipo “pistola” são agentes da indústria da multa…
Uma discussão ainda mais complicada é da multa surrealista, sem nenhuma sintonia com os critérios do código de trânsito. Rigorosamente inexplicável, por exemplo, a que considera o próprio veículo como o responsável pela infração, não quem está ao volante. É o que se deduz diante da imoralidade praticada pelo governo de manter as multas do veículo que já mudou de mãos. Antes de comprar um carro, o freguês pesquisa junto aos órgãos de trânsito e se assegura de não haver nenhuma irregularidade ou infração pendente. Fecha o negócio e tem o dissabor de receber, dois meses depois, a notificação de uma infração cometida pelo proprietário anterior, de quem o Detran tem nome, endereço e CPF. Mas é muito mais “prático” cobrar do dono atual pois, se não paga a multa, perde o direito de circular com o veículo. E, se põe a boca no trombone, o Detran recomenda que, depois de quitar a dívida com o governo, que procure receber na Justiça de quem cometeu a infração. Foi aprovado no Congresso, há alguns anos, um projeto de lei que tentava corrigir esta aberração. Vetado pelo então presidente, Sr. Lula da Silva. Motivo esclarecido nos bastidores: receio de perder faturamento….
Outro absurdo da legislação é o atraso na transferência de propriedade do veículo. O novo dono tem um mês de prazo para registrá-la no Detran. Passados 30 dias, além de pagar pela transferência, é punido com uma multa classificada de grave, no valor de R$ 127,69. Até aí, nada contra: desrespeitou o prazo, multa! Mas, aí vem o lado surrealista: ele é também contemplado com cinco pontos no prontuário. Punição prevista para quem desrespeita as leis do trânsito e que perde a carteira de habilitação se acumular 20 pontos num ano, só recebendo-a de volta depois de cumprir um curso de reciclagem de motorista na autoescola. Esta barbaridade jurídica significa a possibilidade de um cidadão se ver sem a carteira de habilitação (CNH) se, por qualquer motivo, ultrapassar quatro vezes o prazo para a transferência de veículos. Uma rigorosa distorção da ideia da punição com pontos que, imagina-se, seja exclusivamente para lembrar ao motorista da importância de respeitar as leis do trânsito.
Outra “punição”, esta sem base legal mas cometida pelo Detran, é não emitir a CRLV, o documento anual que atesta o licenciamento do veículo e sem o qual o carro não pode circular. O dono pagou o imposto e seguro no início do ano, mas tem uma multa pendente por ter recorrido judicialmente contra seu pagamento. O Detran se sente no direito de chantageá-lo: ou paga a multa ou não recebe o CRLV. Simples assim…
Mais uma preciosidade jurídica do trânsito é o infeliz que teve clonadas as placas de seu veículo. São tantas e tão descabidas as exigências para ter as infrações (comprovadamente cometidas por outro carro) canceladas e as placa substituídas, que o dono do carro se sente pior que Josef K. no “O Processo” de Kafka. Josef acorda um belo dia e se vê às voltas com um inexplicável e longo processo por um crime de que ele não faz a menor ideia…
BF