Caro leitor ou leitora,
Um dos leitores que mais comentam no AE assina com o nome de Ilbirs. A maioria aqui o conhece pelos textos longos e altamente explicativos. Anteontem o Ilbirs teceu longo comentário a respeito da matéria do Carlos Meccia, “Roda que te roda”, que quando li durante a moderação me chamou a atenção e achei que tinha mais ar de matéria do que comentário propriamente dito. Assim, ocorreu-me a ideia de publicá-lo com esse status, e por e-mail consultei o Ilbirs a respeito, se ele me autorizava a publicação do seu comentário. “Autorizadíssimo”, respondeu.
Portanto, aí vai o que o Ilbirs comentou a respeito de rodas. A foto de abertura não pertence ao comentário, é meramente ilustrativa, já que o assunto é este mesmo.
Boa leitura!
AE/BS
Sobre o interessante texto do Carlos Meccia, gostaria de tecer alguns comentários:
1) Quanto ao lance das rodas influírem no raio negativo de rolagem, vou sempre lembrar do caso envolvendo o cantor Cristiano Araújo, que estava em um Range Rover Sport da atual geração com rodas de 22 polegadas, maiores do que as previstas no projeto original (que são de grandinhas, 20 polegadas. Tudo bem que naquele caso havia o agravante de as mesmas estarem trincadas e de o sensor de pressão dos pneus, por causa do conjunto, simplesmente não entender quantas libras por polegada quadrada estavam nas peças emborrachadas em questão, aparentando sempre estarem descalibradas para o sistema;
2) Sobre off-set, sempre me lembro das rodas de carros nacionais da Chevrolet da segunda metade dos anos 1990 cuja tração fosse dianteira. Estes não só tinham um off-set altamente positivo como também isso fazia a face externa da roda ter muito problema de ficar ralada, como se pode ver principalmente em uma certa roda de aro 14 usada no Corsa B:
E em uma de mesmo aro utilizada no Vectra B GLS:
Essas rodas são extremamente comuns de apresentarem a superfície riscada ou ralada por contato com a guia da calçada, e isso porque no Vectra B GLS ela em tese estaria mais protegida, pois seus pneus são 185/70, contra os 185/60 requeridos na roda do Corsa B mostrada acima. Não à toa, ao menos no Corsa com o passar dos anos adotou-se uma roda com face externa mais plana, neste caso a partir do modelo 1998, em que os raios eram escavados:
E com o tempo esta deu lugar a uma roda com face bem mais reta, que não saberei se foi possível pelo fato de a suspensão dianteira ter passado a partir do ano-modelo 1999 a uma especificação conhecida por HPS (high performance suspension, barras estabilizadoras e tensores mais grossos e amortecedores a gás):
Ainda assim, há um problema que noto principalmente quando o pneu é do tipo ultrabaixo (perfil 55 para baixo): se a rua é de perfil chapéu-chinês (junção com a calçada baixa e centro da via alto), o pneu pode não conseguir proteger dependendo da proximidade da roda com a guia, pois não apenas seu ponto mais alto será mais baixo que o ponto mais alto da guia como também a inclinação que ficará a roda, que com o pneu sempre copiará fielmente o prumo da guia, poderá fazer com que um ponto desprotegido pelo pneu fique mais perto da guia do que o ombro do pneu. Como não existem mais pneus de série com ombros tão gordos quanto os de um Firestone Wide Oval dos anos 1970, ruas como as paulistanas são perigo para quem tiver um carro com pneus de perfil 70 para baixo na hora de estacionar.
3) Sobre calotas presas pelos parafusos da roda, há uma situação em que elas são perigosas: quando os freios estão sendo muito exigidos em uma serra. Voltarei novamente a falar da rodovia Oswaldo Cruz, extremamente perigosa a ponto de haver placas falando para se ir no máximo em segunda marcha e a velocidade bem baixa, algo compreensível por essa estrada bem antiga ter um desenho que na prática é maquete de estrada andina, com vários <i>caracoles</i>:
O resultado disso se vê nas curvas:
Crédito das fotos acima, na ordem:
https://ziquinhodealmeida.files.wordpress.com
https://lh5.googleusercontent.com
https://i.ytimg.com
http://www.fatonovo.com.br
Sim, vemos calotas fixadas por grampos no aro nessas que caíram, mas também surpreende a quantidade daquelas fixadas por parafusos. O motivo? As rodas esquentam com a exigência do freio e, por conseguinte, também os parafusos que as fixam, que transmitem o calor às calotas e acabam derretendo os buracos de fixação, que ficam largos e fazem a cobertura em questão cair da roda.
Este é um dos raros casos de estrada em que a sinalização está certíssima: desça em primeira ou segunda marcha a até 20 km/h e nada acontece, com as quatro calotas ficando intactas quando o nível já é mais do mar. Porém, tenho cá minha preocupação com carros automáticos que tenham calotas, pois boa parte deles fica solto que nem um carrinho de rolimã mesmo que se esteja em primeira marcha e obviamente o freio vai ser mais exigido e, assim, aumentar a possibilidade de uma Oswaldo Cruz da vida colecionar mais calotas;
4) Sobre ângulo de deriva, aqui posso testemunhar bem a favor de pneus modernos e até mesmo com perfil de 55 para cima. No fim do ano passado montei um quarteto de Michelin Energy XM2 na viatura e me parece que a direção está sendo mais fiel àquilo que indico no volante. Como essa família de pneus também tem medidas para carros mais antigos (há, por exemplo, o 195/70R14 que um Opala usaria) e seus índices de velocidade são mais altos que os dos pneus originais desses veículos (voltando ao exemplo do Opala, com XM2 ele passa a ter índice H, para até 210 km/h, em vez do S, para até 180 km/h, com que os radiais originais desse modelo vinham), tenho cá minha impressão de que em automóveis mais velhos que usem esse pneu mais moderno ou outros assemelhados se sinta uma melhora na direção ainda mais acentuada;
5) Sobre centro de gravidade, fico cá pensando como devem se sentir aqueles que trocaram carros normais por SUVs sobre base de carro de passeio ao fazer curvas:
Este para mim é um exemplo emblemático, uma vez que estamos falando de dois carros sobre uma mesma base (a B da Ford), mas com o Fiesta Mk6 sendo mais baixo que o EcoSport Mk2. De frente o Eco parece mais um retângulo em pé, enquanto o Fiesta parece mais um retângulo deitado, em que pese ambos terem largura maior do que suas respectivas alturas.
6) Sobre rodas com três parafusos, fico aqui com a segurança e que preferencialmente sejam presas por porcas em vez de parafusos, uma vez que prisioneiros são uma garantia a mais de que as ditas cujas fiquem onde devem ficar. Por esse motivo que me decepcionei quando vi que a Renault brasileira continuará com os três parafusos por roda no Kwid, quando muito bem poderia ter adotado mais compartilhamento de peças com Logan e Sandero de segunda geração, que por sinal usam rodas com furação 4×100, medida extremamente comum e que inclusive ajudaria no desempenho desse carro no mercado de acessórios. Quem adquirir um Kwid na prática só vai ter mesmo as rodas do smart fortwo para dar uma incrementada que seja, e aqui partindo do princípio que sejam rodas adequadas e que não se faça as besteiras que anulem um raio negativo de rolagem;
7) Sobre as rodas “trevo”, de fato são bonitas e digo que são uma ótima oportunidade de reflexão em uma época na qual estamos vendo desenhos extremamente repetitivos nessas peças (estrela e palito são quase <i>commodities</i> de tanto que se repetem). Vou deixar aqui também outras rodas cujos estilos me apetecem:
Estas aqui são a essência da ausência de frescura: ficam lindas sem calota e estão aí para durarem muito tempo, além do desenho bem agradável e serem feitas de aço. Para mim são aquela prova de que poderíamos e deveríamos continuar tendo rodas bonitas o suficiente para que não se precisasse de calotas.
OK, são rodas com calota central que nem sempre ficava lá, mas aqui apenas falo de desenho e estas aproveitaram muito as possibilidades oferecidas pela liga leve.
Outra que considero belíssima. Sim, tem o manjado desenho de estrela, mas aqui a graça está nas linhas que fizeram para ela, com essas protuberâncias no aro sugerindo que não eram peça monobloco mas sim em mais de uma parte (tipo aquelas rodas raiadas aro 15 dos primeiros Omegas B CD nacionais). Aro desta roda? Muito racionais 14 polegadas. Já vi inclusive Passat III (na especificação estilística conhecida por B4) com essa roda e ficava simplesmente ótimo com elas.
A roda conhecida por Bundt, tão popular em Mercedes do passado, é outro exemplo de coisa bonita e sem frescura para durar muito. Também simboliza aquele tempo em que os Mercedes tinham uma cara de mais suntuosos que um BMW equivalente, algo que as próprias rodas já denunciavam e faziam questão disso. Há inclusive a curiosidade de entre 1969 e 1985, ano em que foram usadas nos carros da marca, serem feitas por um processo de forja que fazia o alumínio de que são feitas ficar com os grãos do metal alinhados de maneira uniforme, de maneira a terem a mesma resistência de uma roda de aço. Pena que depois disso a Mercedes passou a preferir as fundidas, menos resistentes que uma Bundt da vida.
Outro conjunto de rodas da Mercedes de que gosto e talvez dos últimos respiros do tal lance de ser bonito e sem frescura.
Créditos das fotos acima: http://www.carbuildindex.com
A roda “turbina”, comum no BMW M5 E34, tinha esse desenho bonito e aerodinâmico, com a calota tendo real utilidade prática de jogar ar nos freios. A borda que fazia a mesma ter desenho que lembrava pneu de faixa branca também não era acentuada por acaso, pois ajudava a prevenir que o pneu saísse da roda em caso de um furo. Outro exemplo de coisa bela e de fato com função.
“I”