Período de campanha eleitoral é o suprassumo das bobagens. Se o Conar não fosse um órgão de autoregulamentação publicitária e, portanto, de punições limitadas, seria uma festa. É tanta propaganda enganosa e tanta incoerência que considero que só acredita quem quer ou quem não se informa.
Sou viciada em notícias de todo tipo. Mas minha adicção não me tira o senso crítico que, pelo contrário, fica cada vez mais agudo pela quantidade de dados a processar. Por isso mesmo leio muito, escuto muito rádio e vejo muita TV. Mas tem coisas que nem assim consigo entender.
É claro que saúde, educação e segurança são as primeiras preocupações da população e, justamente por isso, os focos das atenções dos candidatos às Prefeituras e às Câmaras Municipais. Nesse caso, a maioria segue um roteiro previamente aprovado pelas assessorias e já tem respostas prontas e números na ponta da língua. Acredito que algumas coisas realmente podem e devem ser feitas sim, mas quando a pessoa é questionada no varejo e fora desses carros-chefes costumamos ouvir besteiras.
Vemos candidato que vetou proposta de passe gratuito para os desempregados nos ônibus depois de ter sido aprovada pela Câmara de Vereadores brandir essa ideia como algo que fará se reeleito. E então por que vetou quando podia implantar?
No debate da televisão com os candidatos à Prefeitura de São Paulo no dia 29 quando Luiza Erundina perguntou ao candidato à reeleição por quê ele não havia feito nada pela mobilidade das motos a resposta me deixou estupefata. O alcaide disse que “estudos internacionais” que ele e sua assessoria haviam consultado apontam que não há vantagem em utilizar vias segregadas para motos. Segundo ele, os técnicos consultados “foram categóricos em dizer que elas aumentam em vez de diminuir a vulnerabilidade do motociclista” (sic). Segundo ele, a solução recomendada pelos organismos mundiais seria a redução do limite máximo de velocidade.
Na hora confesso que me assustei. Não sei por que, pois não deveria após quatro anos de ouvir coisas desse tipo. Mas ainda assim às vezes eu tenho lá meus momentos Velhinha de Taubaté e me surpreendo com o óbvio. Na dúvida, consultei meu marido que assistia ao debate comigo. Não, eu não havia alucinado. Era isso mesmo o que ele havia dito. Descrente ainda, no dia seguinte foi consultar diversos vídeos e encontrei a mesma coisa que meus ouvidos e meu cérebro haviam registrado. Vai ver que a insone Norinha havia sido vencida pelo cansaço e havia confundido as coisas? Não, necas. Cá está a prova:
https://youtu.be/cfdXJP_YAVw
Caros leitores, raciocinem comigo. Não vou entrar no mérito dos tais estudos, nem os da ONU, da OMS ou de onde for, nada disso. Nem se corredor para motos é recomendável ou não pois pretendo pesquisar mais e voltar ao assunto com números. Aliás, nem pesquisei sobre o assunto e pretendo fazê-los mais adiante. Só não o fiz pois me deparei com um problema logo de cara com essa teoria. Vamos trabalhar em cima do, vá lá, raciocínio do burgomestre e vamos repetir o que ele disse: motociclista fica mais vulnerável em faixas segregadas – lembrem-se, segundo ele.
Desnecessário dizer que imediatamente lembrei das muitas semelhanças que há entre um motociclista e um ciclista. Ambos circulam sobre duas rodas, os ângulos de visão são basicamente os mesmos, a proteção física (ou falta) de ambos é praticamente a mesma (para-choque das duas categorias é joelho, lateral é cotovelo e por aí vai). A principal e talvez única diferença é a velocidade máxima alcançada. E aí vem a segunda parte da teoria da “otoridade”: “seguro para o motociclista é andar mais devagar”. Foi o que ele disse, caros leitores. Não eu, ele, tá? Pronto, igualamos as duas categorias sobre rodas, já que ciclistas andam, genericamente, mais devagar do que motos. A pergunta do milhão de dólares que me tortura desde a semana passada então é: para que ciclofaixas e ciclovias então?
Se ciclistas naturalmente andam em baixa velocidade, e isso por si só já elevaria a segurança deles, por que não deixá-los andar junto com os demais veículos pelas mesmas faixas de rolamento em vez de criar faixas segregadas? Novamente, não entro nas questões técnicas. Aponto apenas os pontos da teoria do candidato derrotado. Seguindo essa linha de pensamento, não precisaria ter gasto milhões com ciclofaixas e ciclovias, não? Era só os ciclistas andarem no meio dos carros. Ou isso ou não é verdade que motociclistas estejam mais seguros andando no meio dos carros desde que em baixa velocidade. Mas aí tem outra falha na teoria. A diminuição nos limites de velocidade ocorre há um ano nas marginais e mais do que isso em outras vias — e o índice de mortalidade entre motociclistas no trânsito continua o mesmo. Segundo a CET, nas seis primeiras semanas depois da redução dos limites de velocidade nas principais vias da cidade em 20 de junho do ano passado, 82% dos acidentes envolveram motos. E então, como é que é mesmo?
Mas é fato que não encontrei propostas para o trânsito de motos nem no agora ex-burgomestre de São Paulo nem dos outros. Sequer em outras cidades.
De acordo com o Detran, há 1,1 milhão de motos registradas na capital de São Paulo. Eu sempre digo que essas estatísticas são superestimadas mas não acredito que no caso das motos haja maiores divergências pois o “boom” do mercado se deu nos últimos dez anos. Portanto, proporcionalmente poucas devem ter deixado de circular e não foi dada baixa delas. Ao contrário, é mais provável que haja algumas circulando sem registro. Obviamente a questão das motos é seríssima. Afinal, morrem 3 motociclistas a cada dois dias na cidade e sei lá que quantos ficam feridos — muitas vezes com sequelas irreversíveis e para o resto da vida.
O trânsito de São Paulo não é nenhuma maravilha, mas os números publicados distorcem tudo. A Prefeitura divulga números absolutos de 47 mil mortos no trânsito por ano quando o critério correto e mundialmente aceito é o de mortes por 100.000 habitantes. Se não, a China com 1,36 bilhão de habitantes certamente superaria em centenas de vezes o Uruguai, com somente 3 milhões. De acordo com o Observatório de Saúde Global da OMS (Organização Mundial de Saúde) o Brasil registra quase 23,4 mortes por 100.000 habitantes. Com isso, estamos num nada elogioso 56º lugar no ranking de mortes no trânsito, mas considerando que a ONU tem 193 nações registradas não é a hecatombe que alguns propagam. O que não quer dizer que não deveríamos lutar para estar melhor. Apenas que não é assim que estamos.
Mudando de assunto: Gostei da corrida da Malásia, exceto, é claro, da primeira volta. Onde é que o Vettel estava com a cabeça quando abalroou o Rosberg e ainda quase tira o Verstappen? Belíssima recuperação do Rosberg, Räikkönnen sempre correto e uma ultrapassagem linda e um emocionante pega entre Ricciardo e Verstappen do tipo “por aqui não, mate”. E o que dizer do estouro do motor do Hamilton? Ele saiu chutando o balde com a equipe, mas falta um pouco de autocrítica. O inglês mesmo disse que de oito carros com motores iguais só o dele quebra. Pois é, por que será? Nada a ver com sua forma de dirigir, claro… E o que dizer do comentarista que disse que quem deu sorte na Malásia foi o Rosberg? Óbvio que o sonho dele era largar em segundo, tomar um baita totó na traseira na primeira volta, cair para último, levar um segundo a mais do que o companheiro de equipe na troca de pneus por causa de um parafuso e ainda tomar uma punição de dez segundos… Isso é que é sorte! Pelo mesmo raciocínio, Hamilton deve estar feliz da vida: agora poderá usar um motor novinho em folha.
NG