A imaginação está no cerne de toda invenção. Reprimi-la acaba com toda diversão em fazer qualquer coisa, deprime qualquer um, e lentamente destrói a alma do sujeito. Nietsche já disse que viver como um autômato do dever, sem uma escolha pessoal, é receita para a decadência, o que é uma verdade absoluta. A maior tristeza disso não é constatar esta verdade, mas sim perceber que muitas vezes não temos escolha. Ainda mais hoje aqui em nosso país, onde os empregos sumiram, e nossas opções com eles. Mas ainda assim, inovar, fazer algo novo que saiu de nossa cabeça, é o que realmente nos move.
O engenheiro automobilístico de vocação é por definição amante da inovação. Nenhum deles acorda cedo todo dia para trabalhar imaginando em fazer mais do mesmo, em copiar, em ser eficiente (esta palavrinha maldita) e nada mais. Não, ele se levanta da cama disposto a fazer algo novo, legal, entusiasmante, cheio de criatividade e novidade. Mas infelizmente, na maioria das vezes, ele se frustra.
Isto porque, observando-se a história da indústria automobilística, vê-se claramente que o tradicional, na esmagadora maioria dos exemplos, sempre vence. O eterno paradoxo da inovação, já disse Scaruffi, é que ela só é reconhecida como inovação depois que foi copiada. Só quando se torna o padrão, se valoriza. É na realidade, de onde tudo vem. Os inovadores são, portanto, absolutamente necessários para a evolução da humanidade, em todos os campos, mas nem sempre são eles os seres humanos de maior sucesso.
Edward N. Cole era sem dúvida um destes inovadores. Um engenheiro da General Motors, Cole foi, junto com Kettering e Leland, a base de inovação que impulsionou a companhia até seu ápice nos anos 60, onde tinha mais da metade do mercado americano e era a maior companhia do mundo por uma boa margem. Mas a sua sanha inovadora não foi o que fez ele avançar; suas maiores inovações foram também seus maiores fracassos. Na verdade, no cerne do sucesso de Cole na GM (chegou a presidente-executivo, cargo que ocupou de 1967 a 1974) está sua capacidade de produzir carros extremamente conservadores também. Foram seus maiores sucessos.
O Ed Cole que criou o superinovador Chevrolet Corvair de 1959, uma família completa de carros com motor de seis cilindros contrapostos arrefecido a ar na traseira (feito um Porsche 911), criou também o ultraconservador Chevy II/Nova em 1962 para substituí-lo, quando percebeu que o Falcon da Ford era o que o público americano de carros compactos queria de verdade. O Chevy II/Nova era uma cópia descarada, um Falcon da Chevrolet, e como ele um tradicional carro americano de motor dianteiro arrefecido a água e tração traseira, apenas reduzido em tamanho. Mas como era praxe então, a GM de Cole fez o Chevy II com tanto carinho que ficou um carro muito bom, que logo desbancava o Falcon da liderança de vendas da categoria.
O Corvair não foi descontinuado em 1962, quando o Chevy II foi lançado, porém. Um mercado entusiasmado e constante se formou em volta principalmente das versões de duas portas. Um público que queria algo mais esportivo e jovem, mas sem gastar muito dinheiro ou aturar os problemas de confiabilidade, e o reduzidíssimo tamanho, dos carros esporte europeus de então. Logo as versões utilitárias do Corvair, a perua, picape e a van, são descontinuados, e o foco se vira para performance: quatro carburadores aparecem como opcional, e depois, novidade absoluta então, um turbocompressor também é oferecido.
Lee Iacocca, então na Ford, percebe o potencialmente lucrativo nicho que o Corvair ocupava sozinho, o de um carro compacto com viés de estilo esportivo e jovem, e imaginou que podia fazer melhor. Baseando-se no compacto Falcon, criou um dos maiores sucessos da história da indústria: O Ford Mustang de 1965.
O Mustang era o carro certo na hora certa. Oferecido em versões sedã, conversível e fastback, sempre em duas portas, rapidamente se tornou um ícone de seu tempo. Era um carro barato e simples, mas com uma aura de sofisticação e desempenho que o tornava irresistível. No ano do lançamento, apareceu na telona perseguindo o Aston Martin DB5 de 007 (então o jovem Sean Connery) por estradinhas europeias, e ninguém achou isto estranho. O Mustang , apesar de sua origem e mecânica pobres, era um carro chique.
Foi um sucesso estrondoso. Programado para vender 100 mil carros por ano, atingiu esta marca no terceiro mês de venda. Fechou o ano com quase 500 mil vendidos, e em dezoito meses do lançamento, capacidade de produção ampliada, chega a um milhão de carros vendidos. O Mustang podia ser um carro para todo dia de uma jovem trabalhadora, conversível e com um econômico e lerdo seis-em-linha, e podia ser também um carro de corrida, na sua versão GT350, e mais um milhão de variações entre estes dois extremos. Uma nova categoria nascia: os pony-cars.
A Chevrolet de Cole não podia ficar atrás, claro. Ao final de 1966, há exatos 50 anos, aparecia a resposta: o Chevrolet Camaro. Baseado na segunda geração do Nova, seguia à risca a fórmula do Mustang, mas como sempre na GM de então, executada de maneira impecável. O Camaro, que hoje completa 50 anos de idade, foi um imenso sucesso, e é hoje tão reverenciado quanto seu nemesis de Dearborn. O fato de que não foi uma ideia original de nada empalidece este fato; o Mustang também nasceu por causa do Corvair, apesar de ser muito diferente dele. Uma interessantíssima cadeia de eventos.
E para comemorar os 50 anos do Camaro, nada melhor que uma lista de dez melhores. Ao fazê-la, uma coisa fica clara: além de uma lista de carros, é também uma lista de motores. Os V-8 da Chevrolet são parte integrante da história do Camaro, e sua mais constante vantagem. Desde que Cole criara o V-8 bloco-pequeno em 1955, incrivelmente compacto, leve, e potente, e extremamente inovador, todos os outros ficaram para trás por pelo menos 20 anos. E hoje, com a família LS, a tradição continua: o V-8 Chevrolet ainda é a melhor coisa que a GM faz.
Em ordem cronológica, são eles:
1) Camaro Z/28 (1ª geração -1967-1969)
Criado como uma homologação especial de competição para a série Trans-Am, que limitava a cilindrada a 5 litros, o primeiro Z/28 tinha usava uma versão inédita então do V-8 de bloco pequeno: usando o bloco da versão 327 pol³ ( 5,4 litros), com diâmetro de pistões de 101,6 mm, e a árvore de manivelas do antigo 283, com curso de 76,2 mm, o motor tinha exatamente 4.942 cm³, ou 302 pol³. O nome Z/28 era justamente o código interno (RPO, Regular Production Option) do motor na GM.
Mas era mais que apenas isto; como o carro de corrida que na realidade era, tinha tudo que a gente gosta: nasceu como um “catadão” de todas as opções de alta performance já disponíveis no Camaro, somadas ao novo motor. Suspensão “heavy duty”, freios dianteiros a disco e sapatas especiais para os tambores traseiros (o Camaro básico ainda tinha quatro sofríveis tambores), câmbio de quatro marchas com alavanca no assoalho, e diferencial autobloqueante (“Positraction”), direção (por esferas recirculantes) de relação rápida (17:1) e rodas de aro 15 com largos pneus diagonais Firestone Sports Car 200. Mas na verdade, acabou por, devido ao desenvolvimento em competição, ser bem mais que isso, e se tornar um pacote único. A partir de 1968, já contava até com freio a disco nas 4 rodas opcional, e até uma suspensão independente traseira foi tentada, mas descartada por não se traduzir em tempos melhores na pista. Um pacote integrado, um carro ótimo para quem gosta de dirigir rápido.
Por fora, defletor traseiro, duas grandes faixas pintadas por cima do carro inteiro, e um capô com uma tomada de ar frio na base do para-brisa distinguiam a versão do carro imediatamente. Podia ser pedido com ou sem o pacote de decoração RallySport, que no ano de 69 escondia os faróis circulares. O carro pesava 1.460 kg, leve para os padrões americanos, mas mais pesado que um Opala, por exemplo, um carro de tamanho semelhante.
Mas a melhor parte era mesmo o motor. Pequeno para os padrões americanos da época, e leve como todo Chevrolet de bloco pequeno, era apesar disto um monstro. Comando de válvulas bravo, daqueles com marcha-lenta alta (900 rpm) e embaralhante, e um enorme Holley quádruplo em cima, girava livre a partir dos 3.000 rpm apenas, mas chegava às 7.000 com facilidade. A taxa de compressão era alta (11:1), e apesar de inicialmente o virabrequim forjado ser suportado por mancais de dois parafusos apenas, a sua melhor e mais evoluída versão, de 1969, já tinha quatro grandes parafusos por mancal. Em 68 e 69, podia também receber opcionalmente dois carburadores Holley quádruplos, em um coletor de alumínio com dutos longos.
Consumia quantidades realmente prodigiosas de combustível de alta octanagem apenas, e era incrivelmente barulhento e incivilizado, a ponto de sacudir e vibrar o carro todo em marcha-lenta. Era também intratável antes de 2.000 rpm, mas quando passava deste ponto, era simplesmente sensacional. Um motor forte e que pede para girar, o 302 HO (seu nome oficial) depois dos 3.000rpm é liso feito seda japonesa, e puxa feito um trem desgovernado. A GM declarava 294 cv (290 hp), mas todo mundo sabia que o mundo real estava muito acima disso. Documentos internos da GM descobertos por entusiastas da marca falam em 408 cv no carro de rua, e 454 cv em competição.
A revista Motor Trend testou um com os dois Holley em 1969, e disse: “Já era um carro bravíssimo em 1968, mas hoje é simplesmente imoral. O carro vibra e faz um barulho inacreditável, mesmo em marcha-lenta. Os motoristas ao lado olham espantados, e os pedestres ficam assustados.”
O carro de rua testado pela Car and Driver americana, de novo com o mais violento esquema de dois carburadores quádruplos, fez o 0-60 mph (0-96,5 km/h) em 5,3 segundos, e o quarto de milha em 13,77 segundos, a uma velocidade ao final de 173 km/h! A velocidade final em cada marcha era: 101 km/h em primeira, 140 em segunda, 190 em terceira, e estimados 240 em quarta e última marcha.
O início de uma lenda.
2) Camaro Yenko S/C 427 (1ª geração -1969)
Por mais legal que fosse o Z/28, naquela época o que importava nos EUA era arrancada. Todo mundo queria mesmo é um motor grande, e os cinco litros do Z eram, por incrível que pareça, precedidos sempre da palavra “apenas”.
O Camaro lançou também a maior versão até então do V-8 de bloco pequeno: 350 polegadas cúbicas, ou 5,7 litros, um tamanho que se mostrou depois extremamente popular. Opcionalmente, podia ser equipado também com o novo V-8 de bloco grande da marca. Este motor, bem maior fisicamente que o de bloco pequeno, fora desenvolvido para as corridas da Nascar, e tinha válvulas inclinadas, o que gerou o apelido “semi-Hemi”. Era um motor enorme, mas inicialmente deslocava apenas 396 pol³ ( 6,5 litros). O motivo era que a GM tinha então uma regra interna que impedia o uso de motores de mais de 400 pol³ em carros compactos.
Mas o piloto, entusiasta da marca e dono de concessionária Don Yenko descobriu uma maneira de contornar o problema. Usando o formulário de encomenda especial da Chevrolet (COPO – central office production order), usado normalmente para pedir modificações para frota, táxis etc, conseguiu encomendar e vender uma versão exclusiva equipada com o V-8 de 427 po³ (7 litros) do Corvette, na versão mais brava, claro, a L72, que usava tuchos mecânicos, comando bravo para girar acima de 6.000 rpm, e declarados (conservadores) 435 cv.
Outros concessionários criaram Camaros 427 usando o COPO, mas o de Yenko, do qual apenas 200 foram produzidos, é de longe o mais lendário. Uma poderosa arma para as corridas de rua dos anos 60.
3) Camaro ZL1 (1ª geração -1969)
Os Camaro “COPO” 427 de 1969 são já tão raros e lendários que não se pode imaginar algo ainda mais exótico para os amantes do modelo. Mas eles existem na forma dos 69 carros equipados com o V-8 “ZL1”.
O ZL1 era uma versão toda em alumínio, bloco e cabeçote, do V-8 Chevrolet de bloco grande. Desenvolvida secretamente para os Chaparral de Jim Hall pela equipe de Zora Arkus-Duntov, eram feitos um a um em uma sala cirurgicamente limpa, com todo cuidado. O motivo básico do alumínio era simples: fazia o V-8 grande pesar o mesmo que o V8 de bloco pequeno. Ninguém sabe ao certo os valores de potência (a GM anunciava 375 cv, menos que o 396, para desencorajar leigos), mas com certeza era algo acima de 500 cv. Estes carros já foram cronometrados na casa dos 11 segundos no quarto de milha.
Criado basicamente para competições de arrancada, custava o dobro do valor de um SS 396.
4) Camaro Z/28 (2ª geração – 1970)
O ano de 1970 marca o aparecimento da segunda geração do Camaro, que iria sobreviver até 1981. É também o último ano da corrida armamentista de potência na América; em 1971 em diante, fruto de legislações de emissão de poluentes e depois crises de abastecimento de petróleo, a potência passou a diminuir ano a ano, só começando a crescer novamente a partir do meio da década de 80. Foi nesse ano que a potência dos carros americanos passaram a ser expressas em cv SAE líquida, resultando em números menores.
O novo Camaro Z/28 era novo debaixo do capô também: o motor V-8 de bloco pequeno agora deslocava 350 pol³ (5,7 litros), e mantinha seu incrível apetite para altas rotações, mas agora era bem mais tratável a baixas. Como acontecia no Corvette do mesmo ano, o Z/28 tinha desempenho dos carros “big block”, mas com um comportamento muito melhor devido ao menor peso. Eram tão agradáveis que a Car and Driver deixou como subtítulo do seu teste de lançamento do carro: “Chevrolet desafia Ferrari”.
Este bravíssimo e delicioso V-8 de 360 cv, chamado LT1, foi o ápice do V-8 Chevrolet de primeira geração, e durou apenas um ano, o que faz este Camaro hoje um cobiçado item de coleção.
5) Camaro IROC-Z (3ª geração – 1986/1990)
Anos e anos de desempenho pífio se passaram até que, com o advento da terceira geração do Camaro em 1982, começa-se a usar injeção eletrônica, para que finalmente a potência voltasse a subir.
O novo Camaro tinha uma novidade a mais além disso: era um carro baixo, moderno e fazia curvas e freava como nenhum Camaro até então. Ainda tinha qualidade de construção indiferente, e a suspensão era dura, não muito apta a absorver as imperfeições da estrada, e o eixo traseiro ainda era rígido. Mas era um progresso enorme, o carro agora sendo capaz de ser dirigido à moda em outros lugares senão a linha reta.
A IROC, International Race of Champions, era uma categoria onde pilotos famosos corriam em carros idênticos, e a versão IROC-Z do Camaro nasce para homenagear o uso do modelo a partir de 1986. Equipada com o V-8 de bloco pequeno, tinha versões de 305 ou 350 pol³ (5 e 5,7 litros), e injeção multiponto, produzindo 205 e 230 cv (potência líquida). Equipados com câmbio manual de cinco marchas, eram carros muito bons de dirigir, com potência para chegar aos 100 por hora na casa dos seis segundos.
Podem não ser mais os monstros de outrora, mas marcam o início de uma ênfase no pacote completo de desempenho, e não apenas no motor.
6) Camaro z/28 (4ª geração, 1993-1998)
O Camaro de quarta geração é uma evolução do tema da terceira; eixo traseiro rígido, construção barata, suspensão bem dura, mas desempenho exemplar em qualquer situação. A novidade aqui é um novo V-8, na verdade a última evolução do V-8 Chevrolet de bloco pequeno de 1955. Com inúmeras modificações (inclusive fluxo invertido de líquido de arrefecimento, entrando agora primeiro no cabeçote), este V-8 recebeu o nome de GENII, e no Corvette e Camaro reviveu o lendário nome do melhor “small block chevy” do passado: LT1.
Este motor dava 305 cv, e depois quando virou LT4 em 1996, 330 cv. Hoje parece pouco, mas era o suficiente para dar desempenho comparável a Porsches e Ferraris aos humildes Chevrolet.
7) Camaro SS (4ª geração, 1999-2002)
A quarta geração do Camaro, apesar do desempenho brilhante, nunca foi um sucesso, o que hoje costuma a ser atribuído ao seu design externo. Seja lá qual for o motivo, eram carros extremamente velozes e bons de dirigir, com desempenho comparável aos esportivos europeus de primeira linha, por uma fração de seu preço.
Mas o fato é que as fracas vendas não justificaram o desenvolvimento de um substituto, e em 2002 o Camaro parava de ser produzido. Na verdade uma decisão que mostra a falta de visão da empresa naquele momento, como foi provada no renascimento do modelo em 2010.
Mas antes de morrer, este modelo fez a ponte entre a quarta e a quinta/sexta gerações: o motor. Em 1998, 43 anos depois do lançamento do V-8 de bloco pequeno, aparecia seu substituto. O LS1, primeiro de uma família que permanece viva até hoje, era um novo V-8 de bloco pequeno, com todas as vantagens do anterior, mas também com uma série de soluções que eram impossíveis no antigo. Nenhuma peça é comum entre os dois, mas a família LS é obviamente uma evolução do que Ed Cole criou em 1955.
Todo em alumínio, com câmaras de combustão e dutos idênticos em cada cilindro, com controle eletrônico moderno, o LS é tão leve quanto um V-6 de duplo comando, e cabe no mesmo lugar que ele, apesar de deslocar de 4,3 até 7,0 litros. Um incrível feito de engenharia.
No Camaro 1998, o primeiro LS deslocava 5,7 litros e dava 325 cv. Era apenas o segundo motor em alumínio a ser montado no modelo, o primeiro sendo o ZL1 de 1969, e seria apenas o primeiro de muitos Camaros equipados com um V-8 “LS”.
8) Camaro SS “Transformer” (5ª geração – 2010)
Ao redor de 2008, a GM era um lugar bem diferente daquele que acabara com o Camaro em 2002. Bob Lutz fora convencido a voltar à companhia em que iniciara sua carreira como vice-presidente encarregado de produto. Rick Wagoner trouxe Lutz em 2002 justamente para dar lustre à linha da GM, então perdida com produtos que nunca caíam no gosto da população.
Certo dia Lutz, estacionando em sua vaga no departamento de Design criativo, vê um belíssimo Camaro SS 1969, amarelo com faixas pretas no capô, estacionado na vaga do chefe do Design, Ed Welburn. Para por alguns minutos observando as linhas do clássico, e sobe para falar com seu dono.
Os dois entusiastas passam então um bom tempo conversando sobre os mais interessantes pontos do desenho de quarenta anos de idade; acabam por descer e olhar o carro de perto. Quando a conversa descamba para a tristeza de não existir mais Camaro, e o inevitável “por que não fazemos coisas como esta hoje?”, vem a idea: fazer uma reinterpretação do carro de Welburn. Um Camaro moderno.
O resto é história conhecida. O carro-conceito foi um sucesso, abrindo condições para sua aprovação como carro de produção. Lançado em 2010, aparece como protagonista do filme “Transformers”, e é um tremendo sucesso (inclusive virando música caipira do Brasil), regularmente superando o Mustang em vendas, algo quase inédito em sua história. Sua cor mais popular é uma combinação de amarelo com faixas pretas, exatamente como o carro de Welburn que o inspirou.
9) Camaro Z/28 (5ª geração- 2015)
O Camaro de quinta geração era baseado no Holden Commodore, que por sua vez era baseado no Opel Omega. Plataforma de tamanho médio, tamanho de Mercedes classe E e BMW série 5. Era portanto um carro com uma moderna e sofisticada base: suspensões independentes McPherson dianteira e multibraço na traseira, enormes freios a disco nas quatro rodas, pneus de perfil baixo. O motor V-8 LS3 deslocava 6,3 litros, e era uma verdadeira joia, leve, girador, torcudo e vocal. Produzia 430 cv e dava desempenho de Porsche ao Chevrolet.
Mas também, pelo tamanho, era um carro pesado. Seu desenho externo, razão de seu sucesso, era também fonte de alguns problemas: pouco espaço interno pelo tamanho, visibilidade limitada, falta de praticidade das aberturas (portas compridas, tampa de porta-malas ridiculamente pequena etc). Um carro pesado, de ótimo desempenho, mas um pouco inadequado às pistas por exemplo. Um cupê rápido e seguro, mas não um carro esporte de verdade.
Todos estes detalhes seriam resolvidos na geração seguinte. Mas antes que ela chegasse, Mark Reuss, presidente da GM da América do Norte, chama o engenheiro-chefe dos Camaro, Al Oppenheiser, e pede uma versão final para marcar o fim desta geração. Reuss pede apenas duas coisas neste super-Camaro: que seja mais leve em pelo menos 100 lb (45 kg), e que possa “bater qualquer coisa em pista”. Objetivos claros e simples, como deve ser, mas dificílimos de realizar.
Primeira coisa a mudar foi o motor: no lugar do LS3, entrou o famoso LS7, visto pela primeira vez no Corvette C6 Z06. Desenvolvido a partir dos motores que ganharam Le Mans em Corvettes, na sua classe, o LS7 é um dos mais incríveis motores já criados. É minúsculo e levíssimo, pouco mais de 200 Kg, como todo LS de alumínio. Mas é enorme por dentro, nada menos que sete gloriosos litros de cilindrada. Mas não pense em um motor grande e apenas torcudo e preguiçoso; este é um motor de carro esporte de verdade, que gira fácil, rápido, sem inércia, até o limite de 7 mil rpm. O cárter é seco, outra herança de competição, e na admissão um enorme filtro cônico já mostra a que veio. São 505cv de prazer tátil, dinâmico e sonoro.
Os amortecedores são magnetoreológicos, que se ajustam infinitamente; o interior tem Recaros com ajuste manual para reduzir peso; os freios são enormes discos carbocerâmicos de primeira linha, criados para uso extremo em pista. As rodas são exclusivas para o carro, em aro 19, e pneus Pirelli P7 Trofeo. O kit aerodinâmico externo é funcional e cria até 68 kg de força vertical descendente. O câmbio é Tremec manual de seis marchas.
Ainda é um carro pesado (1.760 kg), mas não importa: o desempenho é de puro-sangue, e não poderia ser mais diferente da versão vendida aqui no Brasil para pagodeiros, jogadores de futebol e duplas caipiras. Um verdadeiro supercarro fantasiado de pony-car.
10) Camaro 1LE (6ª geração – 2016)
O recém-lançado Camaro de sexta geração, apesar do estilo evolutivo apenas, é uma mudança radical. É uma classe de tamanho menor que a geração interior, baseado que é no Cadillac ATS, um carro na classe do BMW série 3/ Mercedes classe C. Com isso, importantes ganhos de massa foram atingidos, coisa de 100 kg a menos. Os motores permanecem os mesmos, mas o carro é menor.
Mais moderno também. As revistas especializadas de língua inglesa hoje colocam o comportamento de suspensão, direção , freios e câmbio manual deste carro em um pedestal, comparando-o com coisas muito mais caras e chiques, como BMW e Porsche. Especialmente na tradicional versão de pista, a 1LE, com todos os ajustes necessários para ser usado em track days de fim de semana.
A novidade é que agora o pacote 1LE (externamente identificado pelo capô preto-fosco) é também oferecido na versão V-6, e não apenas na V-8 como é tradição. O Camaro V-6, hoje, tem um motor de alumínio com duplo comando e injeção direta, 3,6 litros e nada menos que 335 cv. Isto é muito mais potência que a vasta maioria dos V-8 de antes de 2002, e é capaz de levar o carro a 100 km/h em 5 segundos.
Um exemplo fácil de como evoluiu este ícone americano em 50 anos. Um ícone que hoje tem seu futuro assegurado. Que venham mais 50 anos!
MAO