Durante o encontro mensal com jornalistas no início do mês passado, Antônio Megale, presidente da Anfavea, acenara com uma expectativa positiva para os dois últimos meses do ano. A despeito da média diária de emplacamentos haver apresentado um recuo preocupante, estacionando abaixo dos 8.000/dia, os fabricantes estavam se aprontando para uma reação. Ela veio.
Em novembro, venderam-se 178.156 unidades, sendo 173.746 automóveis e comerciais leves. Não chega a superar agosto em termos absolutos (183.890), ainda o melhor mês do ano, mas o faz no ritmo de vendas diárias, respectivamente 8.907 (total) e 8.687 (leves), nos 20 dias úteis do mês. Os emplacamentos de leves superaram outubro em 12%, ou 18.700 unidades a mais. O que não contávamos era que as vendas diretas ficariam com mais da metade dessa porção. Ou seja, não foi bem uma corrida de compradores às lojas, mas sim algumas lojas e fábricas tendo de correr atrás de seus velhos clientes. Difícil dizer se foi sede ou fome dos frotistas por fartos descontos para abastecer suas locadoras de veículos ou mesmo um descomunal esforço dos fabricantes em melhorar os seus números e desovando sua produção a eles. Ou ambos.
Esse tema é antigo e conhecido. Em todo revés de mercado, seja recessão leve ou profunda, os fabricantes, para evitarem demissões ainda maiores, recorrem às vendas diretas como salvação. Em desovando parte de sua produção por esse canal menos lucrativo, conseguem assim manter suas fábricas ocupadas e um balanço menos vermelho no final do ano. Nenhum deles morre de amores por locadoras, elas acabam se tornando aquele parceiro incômodo, pronto a ajudá-lo nas horas difíceis, mas não os perdoam nas negociações de preços e sempre deixam as suas margens no ralo.
Num estudo realizado pela publicação Automotive News sobre vendas a frotistas nos EUA, em 2010, em pleno início de recuperação da violenta recessão do ano anterior, que cortou produção e vendas à metade, a Ford escoou aos frotistas 32% de sua produção, FCA 36% e GM 28%. No acumulado dez meses de 2016, a parcela Ford aos mesmos frotistas tinha caído para 30%. A FCA se deu melhor, com 25% (queda de 11 pontos percentuais) e a GM foi ainda mais ousada, abriu mão de market share, trocou por melhores resultados e ficou com 19%. Num dos melhores momentos de sua história recente, é a de maior lucro por automóvel vendido entre os três de Detroit.
Neste ano, ápice da recessão nas terras tupiniquins, vemo-nos na mão contrária da tendência dos americanos, ou seja, enquanto os fabricantes de lá reduziram a venda direta para obter melhores resultados, os daqui a subiram para salvar os seus. Alguns até apelaram. No acumulado de 2016 a média geral está em 34%, porém em novembro atingiu-se incomuns 39%, números bastante elevados para qualquer padrão. Renault liderou a lista do mês com 62% a frotistas, seguida da Fiat, com 57% e Chevrolet, com 46%. Talvez os 34% de vendas diretas da VW expliquem em parte a sua menor participação.
Tanto nos EUA quanto aqui os fabricantes asiáticos mantêm certa distância desse modal de vendas, preferindo preservar lucros. Mas enquanto a Toyota de lá destinou aos frotistas não mais que 10%, a brasileira, em novembro vendeu a eles 22% de sua produção. A Honda brasileira manteve-se em seu patamar de costume, com 11%.
Uma análise mais aprofundada nos mostra que as vendas diretas de alguns modelos em novembro atingiram níveis bastante superiores à média nacional do mês. Nada menos que 71% dos Duster foram destinados à venda direta, em seguida o Palio, com 63% e Sandero com 61%. Nos comerciais leves essa prática foi ainda mais intensa, 94% das Montana, 82% das Strada e 80% das S10 foram comercializadas por esse modal.
Podemos chamar os frotistas de “os santos de novembro”? Ou muy amigos?
Na coletiva deste mês, no último 6 de dezembro, Megale disse à imprensa que mantinha suas previsões de 2.080.000 veículos vendidos para o ano e que a melhora de um dígito para o ano que vem está condicionada a avanços nos fundamentos de nossa economia e aprovação dos pacotes do governo para o teto dos gastos e da previdência, quando se espera os índices de confiança voltem a crescer. Entendamos índice de confiança por aquele indicador que todos esperavam haveria de se recuperar rapidamente com a saída da doutora da presidência, mas que ele o faz de forma lenta e aos tropeços. Para que realmente a confiança cresça de maneira mais acelerada precisaremos de menos turbulência entre as casas legislativa, judiciário e executivo e que a sociedade entenda que os políticos no poder estejam fazendo o melhor para recuperar a combalida economia. Haja coração.
Ranking de novembro e dos onze meses do ano
Num mês em que as vendas se expandiram 12%, as marcas que mais cresceram foram a VW, com 51%, esta que sai do fundo do poço após a queda de braços, com direito a finalização, com seu único fornecedor de bancos, seguida pela Land Rover, com 22%, Renault, com 19% e Citroën com 18%. Mesmo com esse crescimento todo, a marca alemã ainda figurou em 5º lugar no ranking do mês, com 16.044 veículos, ainda longe de seu potencial e lugar habitual.
Novembro não foi um mês proveitoso para a Audi, que apresentou queda de 22%, nem para a BMW, com -13%, ou Mitsubishi, com -1%. Aliás, a marca japonesa tradicional de 4×4 vem sofrendo revezes de seus concorrentes de suves e picapes, primeiro o Jeep Renegade, seguido da picape Toro e agora o recém-lançado Jeep Compass, que não são produtos de competição direta a nenhum da MMC, mas os compradores às vezes não ligam muito para isso e acabam migrando de marca atraídos por novidades. A Mitsubishi tem a reputação de robustos 4×4 e de saber tratar muito bem o seu público comprador. Talvez seja de longe a melhor nisso e talvez as melhores ferramentas de retenção e atração já não sejam as mesmas.
Dentre os automóveis, Onix acompanhou o crescimento do mercado, expandindo-se 11%, com 15.700 unidades. Seu avanço nos onze meses, frente a mesmo período de 2015, atingiu 22%. Este definitivamente é o ano desse compacto da Chevrolet, um feito a celebrar. HB20 permaneceu em 2º com 12.136 veículos, seguido do Ka, com 7.636 e Sandero com 7.029. Palio e Gol reagiram, para respectivamente 6º e 7º lugares, deixando o Corolla em 8º. HB20S e Uno completam a lista dos dez primeiros.
Vale destacar o lançamento do Jeep Compass, um suve cujo preço parte de 100 mil reais, em seu mês de estreia figurou em 19º lugar, com 2.539 unidades. Nota-se que seu irmão menor, o Renegade, foi diretamente afetado pela competição interna, saindo do ranking dos dez mais vendidos, mas seguramente a Jeep saiu ganhando. Os consumidores também.
Nas picapes, a Strada retomou a liderança, com 4.987 unidades, seguida pela irmã Toro, com 4.073; S10, com 2.960 e Hilux, com 2.858. Se somarmos as vendas de Toro com Strada, vemos que neste ano a Fiat praticamente não perdeu volume, num segmento que encolheu 18%, ela caiu apenas 1%. Compradores de Toro não são os mesmos de Strada, o preço de uma quase o dobro da outra, mas revela sim um bom acerto na estratégia de produto da marca italiana. A média-compacta da Fiat oferece eficiente turbodiesel, tração 4×4 e câmbio automático por bem menos que as então líderes tradicionais do segmento, e se o usuário não precisar fazer uso severo, sairá satisfeito com esses novos produtos.
Esta coluna se despede de 2016, um ano desafiador para todos e mais ainda para a indústria automobilística. Voltaremos em janeiro com o fechamento do ano e expressamos votos de Feliz Natal e melhores tempos aos nossos leitores e nosso país.
Até lá.
MAS