A foto de abertura acima na verdade é o final da história de hoje, mais o leitor entenderá ao chegar lá.
Conforme terminei a primeira parte semana retrasada (era para ser no domingo passado, mas o problema do site obrigou o adiamento), a vinda de Bob Sharp para a Volkswagen estava definida. Mas a burocracia, os trâmites internos levaram mais tempo do que eu esperava e o Bob acabou só sendo admitido no final de fevereiro de 1984. De qualquer maneira, a Volkswagen Motorsport agora estava estruturada. O Bob ficou como supervisor com status de gerente, tinha uma secretária, um auxiliar administrativo e um grupo de sete ou oito mecânicos para exclusivos para o rali.
Ao grupo se juntou um personagem que seria fundamental para as atividades esportivas, o engenheiro Luiz Antônio da Silva. Ele foi designado pelo diretor de Pesquisa e Desenvolvimento (atual Engenharia), o alemão Philipp Schmidt, para se dedicar em tempo integral à Motorsport. Não só isso, deu ordem expressa aos seus gerentes de engenharia para atender imediatamente qualquer pedido do Bob. Por seu lado, Marketing escolheu o Voyage como o modelo para pista e rali.
O tempo rugia, primeira prova do Marcas seria em abril, e tínhamos que definir as especificações do carro a ser homologado e quem seriam os pilotos. O Bob forneceu os dados básicos ao Luiz Antônio segundo os regulamentos de homologação e técnicos aprovados pela CBA. Era preciso definir o motor, câmbio, suspensão e anexos aerodinâmicos em dois meses.
Dieter Claasen, engenheiro alemão responsável por Estilo e especialista em aerodinâmica, cuidou dos itens aerodinâmicos como asa traseira, defletor dianteiro e saias laterais, que foram encomendados a um fornecedor de São Bernardo do Campo. O câmbio, como só poderíamos usar o de quatro marchas — ainda não havia Voyage de cinco marchas de série, condição para pode ser usado na categoria que foi batizada de Grupo B Brasil — foi recalculado para ser um 5-marchas sem a primeira.
O Luiz Antônio definiu o comando de válvulas, carburação e outros detalhes do motor. O carro, com os pneus slick Pirelli P7 175/50R13 obrigatório para todos, molas Hoesch e amortecedores Cofap especiais, se mostrou bem competitivo. O motor desenvolvia cerca de 160 cv, era bem forte.
Resolvemos colocar cinco Voyages na pista e três no rali de velocidade, e paramos com o rali de regularidade. Para pilotá-los, o Bob engendrou uma forma de contratação interessante. Para pista, dois pilotos por carro, e cinco equipes/preparadores. No contrato, o piloto só dirigiria para uma determinada equipe e esta só teria os dois pilotos mencionados em seu contrato. Tudo amarrado. A contratante era a VW do Brasil e cada piloto tinha um salário e um Santana CG duas-portas para uso pessoal. As equipes, cada uma tinha uma Kombi e uma Parati para uso próprio, recebia uma pagamento mensal de serviços e uma polpuda franquia em peças por corrida. O Bob colocou no contrato cláusula que dava poder à Volkswagen para ordenar troca de posições numa corrida caso fosse do seu interesse.
Como houve vários pedidos de pilotos amigos para darmos apoio, consegui com a diretoria ceder cinco Voyages, mas o carro apenas, sem nenhuma outra benesse ou auxílio, para mais cinco duplas. Um dos Voyages foi para o Jan Balder e o Fausto Dabbur, ambos paulistanos; outro, para os irmãos gaúchos Leonel e Anor Friedrich. Minha memória não me informa para quem foram os outros três Voyages…
Para o rali era diferente, a equipe era “da casa”, e pilotos e copilotos apenas recebiam salário mensal. O concorrente era a própria VW e por isso o Bob precisou obter carteira de concorrente na CBA, que também o habilitava a entrar com protestos, se necessário, nas provas do Marcas, uma vez que a marca concorria a um título.
Sucesso na pista e nas estradas
Foram quatro anos de muitas vitórias para a marca — 1984, 1985, 1986 e 1987. A Volkswagen foi campeã brasileira de Marcas em pista nesses anos e só em 1985 pilotos da Volkswagen não foram campeões brasileiros. Fábio Greco e Lian Duarte levantaram o título com um Escort da equipe Greco, a representante oficial da Ford.
No rali só perdemos um título de Marcas. Foi em 1984, quando perdemos para a GM no rali, na última prova. A dupla campeã foi o notável piloto paranaense Sady Bordin Filho e seu copiloto Tuca Cunha, com um Chevette muito bem preparado por Claude “Francês” Bes. Mereceram. Se o Sady tivesse se aventurado no rali europeu teria sido um dos melhores do mundo. Mas seguiu caminho diferente, a aviação comercial, e hoje é comandante de Embraer 195 da Azul. O Tuca faleceu há muitos anos por problemas de saúde.
Eu e o Bob formamos uma verdadeira e saudável parceria. Nunca precisamos discutir qualquer assunto. Reinou a mais completa harmonia dentro do time da Volkswagen Motorsport e sempre contamos com o apoio da diretoria de Relações Públicas pelo saudoso Mathias Petrich e pelo dedicado Linoel Dias.
Reunimos como pilotos no Marcas, nos cinco carros, os paulistanos Ingo Hoffmann e Cláudio Girotto Fº, José Rubens “Coelho” Romano e Egydio “Chichola” Micci, o mineiro Antônio Lúcio “Toninho” da Matta e paulistano e ex-piloto de moto Walter “Tucano” Barchi, o pernambucano Rogério “Jegue Voador”dos Santos e o paulistano Dimas de Mello Pimenta Filho, e os cariocas Jayme Figueiredo e Armando Balbi.
No rali, eram os paranaenses Paul Lemos e Arthur Cezar, os paulistanos Aparecido Rodrigues e Joaquim Lanhoso, e o carioca Cláudio Antunes com seu copiloto paulistano Olavo Barbour. Depois Aparecido/Lanhoso saíram e no seu lugar entraram os gaúchos Jorge Fleck e Sílvio Klein. Seria adicionado um quarto carro para o mineiro Toninho da Matta e o gaúcho Gilberto Schury.
Em 1987, com é sabido, formou-se a Autolatina, a associação Ford-VW presidida pelo belga Alain-Pierre de Smedt. A nova direção tomou a decisão de a Volkswagen e Ford saírem do Marcas e do rali, só ficando a Fórmula Ford. No dia 23 de dezembro pedi à diretoria de Relações Públicas para convocar uma entrevista coletiva de imprensa, ocasião em que eu, junto com o Bob e o Mathias Petrich, anunciei do fim do empenho da Volkswagen nas competições. O Bob ficaria conosco mais um ano, porém desestimulado com o fim da atividade para a qual havia sido contratado, resolveu seguir outros rumos.
Parceria na pista
Nos anos em que eu e o Bob Sharp trabalhamos juntos houve outro tipo de parceria: na pista, em 1985 e 1986. Com o título da Marcas conquistado por antecipação, eu e ele formamos dupla para correr nas últimas etapas do campeonato “para comemorar o título”. Em 1985 corremos com um Voyage da equipe Petrópolis Veículos, de Wulf Seikel, para a qual o Andreas Mattheis dirigia em dupla com o Elio, filho do Wulf, e que havia sido o carro de 1984 (em 1985 a VW correu com o Gol). Era a Mil Quilômetros de São Paulo em 1º de dezembro. O Bob largou, mas no início da terceira volta se envolveu numa batida entre as curvas Um e Dois com o Gol do Luiz Antônio “Titônio” Massa, pai do Felipe (de apenas quatro anos então), terminando a corrida para nós. Uma pena.
Veja como foi a batida nessa sequência de fotos:
No ano seguinte, mesmo esquema, desta vez com um Passat 1,6, também cedido pelo Wulf Seikel, na Três Horas de São Paulo, em 21 de dezembro. Divertimo-nos muito e chegamos em 11º.
Mas, por que o título desta matéria? Porque a parceria não acabaria aí e chegaria aos dias de hoje, quando Bob me convidou para ser colunista do AE em junho do ano passado. Antes, fomos parceiros em duas ocasiões importantes, mas isso deixo para contar outro dia.
RB