Uma picape C-20 carinhosamente chamada de Princesa
Por Mauro Corrêa
O ano de 1994 tinha começado e eu com um firme propósito de finalmente comprar uma picape, tinha que ser ao estilo americano, grande, com motor a gasolina, as únicas disponíveis no mercado nacional eram a F-1000 da Ford e a C-20 da Chevrolet.
Nessa ocasião tinha um Gol 1989 a álcool e um Tanger, pequeno jipe feito em plástico reforçado com fibra de vidro. Fui até a concessionária Chevrolet na minha cidade (Belém, PA) e achei uma C-20 vermelha 1988 em bom estado de conservação. Acertei com o vendedor que ficaria com o carro se ele me desse dois dias para vender o Gol e o Tanger, e assim foi feito.
No prazo combinado, retornei com o dinheiro em mãos para fechar o negócio e para minha surpresa e decepção a C-20 havia sido vendida. Desolado e bastante irritado com a falta de palavra do vendedor, procurei o gerente para reclamar, estava sem meus carros e sem a C-20.
O gerente, pessoa sensata, vendo a situação e querendo contemporizar, propôs me vender um outro carro, um zero-km, e já mais calmo, lhe expliquei que meu sonho era uma picape C-20 e que só dispunha o dinheiro suficiente para comprar aquela usada, e que só me restava agora procurar uma em outro lugar. Foi quando me disse: Tenho uma zero-km no estoque e vou lhe vender! Perguntei: “Como, se não tenho todo esse valor?” E ele disse: “Isso a gente dá um jeito.”
Conversa vai, conversa vem, acabei ganhando um descontão e sai de lá com a C-20 Custon S zero-km, azul Riviera. Coisa mais linda! Uma verdadeira Princesa (foto de abertura).
Usava minha picape na cidade como carro do dia-a-dia e em algumas curtas viagens, sem nenhum problema, desde que fosse no asfalto, nunca em estrada de terra. Aí a família foi aumentando, dois filhos em fase de crescimento, não cabíamos mais no único banco inteiriço, minha esposa começou a sugerir que vendêssemos a picape. Tinha que achar uma solução, foi então que em 2000 resolvi transformá-la em cabine dupla. Consultei algumas empresas especializadas nesse tipo de transformação em São Paulo e o valor cobrado, quase o preço de um carro novo mais o frete, inviabilizava a negociação.
Foi então que conversando com um amigo, dono da oficina onde sempre fiz as manutenções, expus minha intenção de fazer a transformação em Belém, e que só precisaria de uma boa oficina para levar adiante o projeto.
Meu amigo conhecia bem minha picape, ficou alguns minutos em silêncio, me olhou sério e disse: “A boa oficina eu tenho, mas não quero ser responsabilizado pela destruição do seu carro, isso é loucura.”
De louco, todos temos um pouco. Alguns dias depois cheguei à oficina com uma cabine dupla de C-20 em cima de uma plataforma, havia-a encontrado em um desmanche e estava em bom estado. Pedi-lhe que a recuperasse pintando-a na mesma cor azul Riviera. Enquanto isso, fui garimpando na internet todas as peças que precisava, portas traseiras, vidros, frisos, trincos, carpete e o mais difícil de encontrar, o banco traseiro, comprado em um desmanche em Goiás.
Por conta e risco autorizei meu amigo a desmonta minha C-20 todinha, queria que ficasse só a parte de baixo, chassis, motor, transmissão e os dois eixos. Coloquei em uma plataforma e levei até a Randon da minha cidade. Expliquei o que queria que fosse feito, alongar o chassis do mesmo jeito que se faz para trucar um caminhão, dei as medidas, os reforços que seriam necessários e alguns dias depois estava tudo pronto.
Retornei com o chassis e após a pintura começamos a montá-la. Cardã devidamente adequado à nova distância entre eixos, tubulações, fiações, cabos do freio de mão ajustados, tudo pronto para o grande momento. Havia chegado a hora de colocamos a cabine no lugar. Se eu tivesse errado nas medidas, tudo estaria perdido. Alívio, a cabine assentou perfeitamente, os suportes que anteriormente eram quatro, agora são seis, todos milimetricamente reposicionados, tinham encaixados os parafusos dos coxins, depois devidamente apertados. Depois foi montada toda a parte dianteira, os pára-lamas e capô do motor, e finalmente a caçamba, exatamente como era em seu tamanho original. Propositalmente não quis diminuí-la, poderia ter utilizado a caçamba original da cabine dupla, que é menor, mas não o fiz, e por essa razão minha Princesa é maior do que qualquer picape C-20 cabine dupla que saiu de fábrica, ficando mais harmoniosa em suas proporções e mais parecida com suas irmãs americanas.
Até hoje, passados vinte anos, a Princesa ainda mantém a mesma imponência, tal qual o dia em que saiu da concessionária Chevrolet. Por onde passa, sua beleza chama atenção. Que seja assim por muitos anos.
Fotos: autor
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Como ficou a minha Princesa, cabine dupla com caçamba da cabine simples