Após observar o sucesso do Honda HR-V no mercado, ficando a impressão de que todo mundo quer um, com longas filas de espera nas concessionárias por a fábrica não conseguir atender à demanda, ficou a pergunta: o que o HR-V tem para suscitar tanto interesse desde assim que foi lançado em março último? Veio-me à lembrança a imortal canção “O que é que a baiana tem?”, de Dorival Caymmi, gravada por Carmen Miranda para o filme “Banana da Terra”, de 1939. O que o Honda HR-V tem é um conjunto de atributos que agrada logo ao primeiro contato, como o EX, versão intermediária, que usei durante uma semana.
Contudo, isso por si só não explica a grande procura, havendo também a questão de ser um tipo de veículo que virou o mais querido do brasileiro, o que é maior (e mais alto) do que hatchbacks, sedãs e peruas, seja um crossover, que é o caso, ou suve. Deve-se levar em conta também a questão de confiança na marca associada à boa fama de eficiente assistência técnica, o que resulta em menos desvalorização do que produtos de outras marcas.
Logo nos primeiros quilômetros vem a impressão de ser um veículo bem feito, tudo funciona como deve, o visual interno é agradável, o quadro de instrumentos tem leitura “Wolfsburg” a não ser pelos ponteiros brancos em vez de vermelhos, tudo parece ter sido feito para agradar — mesmo àqueles que gostam de apertar o dedo no painel e sentir maciez, pois o do HR-V é duro.
Dentro, a sensação de amplidão logo se faz notar, mais pela largura de 1.772 mm e pela distância do teto em relação à cabeça, pois o comprimento é relativamente contido, 4.294 mm. Mas o que cativa, e muito, é o espaço no banco traseiro, decorrente da boa distância entre eixos de 2.610 mm e, claro, da sua altura de 1.586 mm. Ou seja, não há aperto dentro do HR-V, e o porta-malas é generoso com seus 437 litros.
Outra característica típica da marca é o arranjo do banco traseiro, já conhecido no Fit. Ao rebater o encosto do banco o assento acompanha até sumir da vista, ou seja, dos bancos dianteiros à extremidade do porta-malas têm-se um superfície perfeitamente plana (foto abaixo). Repito, num movimento só, operação das mais simples.
Mas não é só. Como no Fit, os assentos (banco traseiro é dividido 60/40) podem ser levantados de maneira a ser possível transportar volumes altos tipo um vaso com planta (foto abaixo). Ficam travados nesse posição pelo pé de apoio quando escamoteado, um solução inteligente. Para completar, o túnel do assoalho quase não existe. Os três ocupantes contam com cinto de três pontos e apoio de cabeça, louvável.
Há o detalhe da maçaneta da porta traseira ser oculta na coluna, solução criada pelo estilista italiano Walter de Silva para o Alfa Romeo 156 e imitada por algumas marcas, com o Citroën DS4.
Mas — sempre há um — é decepcionante abrir o capô e ver pior acabamento de cofre que conheço, coisa de protótipo terminado às pressas. Além de grande parte da pintura ser primer, estão visíveis cordões de massa de vedação de cor diferente nas partes soldadas, tipo torre de suspensão e saia interna. A Honda, sempre tão caprichosa, tinha de rever isso. É feio demais.
Como anda
O motor 1,8-litro, comando único, 16-válvulas, desenvolve 140 cv a 6.500 rpm com gasolina e 139 cv a 6.300 com álcool. Como a versão EX pesa 1.270 kg, a relação peso-potência de 9,07 kg/cv só poderia resultar num desempenho mais do que adequado para o veículo que é. A Honda informa aceleração 0-100 km/h em 12,1 segundos, mas não a velocidade máxima, que certamente passa de 190 km/h. O fato é que não há sensação de lerdeza, associado ao funcionamento muito suave do motor, que tem o sistema i-VTEC de gerenciamento de fase do comando e levantamento de válvulas, mais o coletor de admissão de dois comprimentos. Por isso a pegada em baixas rotações é boa, responsabilidade também do torque de 17,3/17,4 m·kgf a 4.800/5.000 rpm (gasolina/álcool).
A versão EX testada só é oferecida com câmbio CVT, sendo o manual de 6 marchas disponível apenas na versão inicial LX, com opção para o CVT. Na versão-topo EXL, só CVT também, há borboletas para trocas manuais. Esse CVT é de nova geração e vai muito bem. Suas 7 marchas virtuais não podem ser escolhidas como no EXL, havendo apenas a alavanca seletora com as posições P-R-N-D-S-L. Mas o funcionamento nada tem do que se conhece em CVT mais antigos, o câmbio não fica “louco” ao menor movimento do pedal do acelerador, senão pequenas e adequadas reduções. Acelerando normalmente chega-se a notar “trocas” de marchas, ou seja, agrada plenamente. Dispõe-se faixas de relações menores em S e L, de maneira a se ter controle em qualquer situação. A 120 km/h o motor gira a 2.000 rpm em “7ª”. Mesmo não informada a faixa de relações máxima e mínima, pode-se supor que seja bem ampla neste novo CVT.
O rodar é confortável com leve viés para duro, mas não chega a incomodar de fato, o que é compensado por boa atitude e velocidade de curva. Há controle de estabilidade tração desligável; suspensão, McPherson/eixo de torção. O bom volante de 370 mm de diâmetro comanda a caixa de direção eletroassistida de calibração irrepreensível, particularmente leve em manobras. Os pneus são Michelin Primacy 215/55R17V e o estepe é temporário de seção estreita. Não há informação de distância mínima do solo, mas pelo jeito de “voar” por cima dos dejetos viários chamados lombadas deve estar muito próximo de 200 mm.
Itens bem-vindos são o freio de estacionamento elétrico e o freio automático quando o veículo pára, este podendo ser desativado. Quando ativado e o veículo permanece parado, as luzes de freio ficam ligadas, como se o pedal de freio estivesse acionado. Há também o assistente de arrancada em rampa permanente. Navegador GPS em tela tátil de 7″ e câmera de ré estão entre os itens obrigatórios hoje, bem como o controle automático de velocidade com comando no volante. A Honda se lembrou que o Brasil é ensolarado e dotou o HR-V de faixa degradê no pára-brisa, mas permanece o toque japonês no quadro de instrumentos permanentemente aceso.
O computador de bordo é operado de maneira inusitada: em vez de numa das alavancas da coluna de direção, é por botão saliente do mostrado, com um extensor. Funciona, dispensando enviar a mão por dentro do volante por ser alcançável por cima com os dedos.
A Honda, dona de uma das fichas técnicas mais pobres que conheço (acho que se Soichiro Honda estivesse vivo seria diferente), não informa consumo de combustível, o que não custa nada. Pela medição Inmetro, com gasolina é 10,5/12,5 km/l cidade/estrada e com álcool, 7,1/8,5 km/l, mesma ordem. A equivalência entre os dois combustíveis é 67/68% cidade/estrada. Com gasolina, consegui 12 km/l na rodovia dos Bandeirantes a 120 km/h com ar-condicionado ligado. O tanque de 51 litros dá para rodar 550~600 quilômetros sem dificuldade com gasolina, mas com álcool será preciso parar mais nos postos.
A versão testada custa R$ 80.400 e a topo de linha EXL, R$ 88.700. A básica LX com câmbio manual, R$ 69.900; se CVT, R$ 75.400.
Depois de uma semana descobri “o que é que a baiana tem”: um veículo agradável, espaçoso, eficiente e, fazendo jus à facilidade de colocar os banquinhos de crianças por ser mais alto, tem engates Isofix e fixação superior para dois desse itens de segurança. Está explicada a grande procura.
BS
Fotos: Paulo Keller
Veja a (pobre) ficha técnica na matéria do Josias sobre o HR-V e agora assista ao vídeo: