Poucas atividades humanas sofrem mais com o sabor dos ventos quanto o esporte. Desde o técnico de futebol que cai quando o time sofre uma derrota após um longo período de vitórias e empates, até diretores de equipes de automobilismo, cujos pilotos não conduzem um carro que seus engenheiros não conseguem transformar em minimamente competitivo. Vez por outra até mesmo os pilotos içam velas que fazem sua própria nau navegar para outros portos.
A Fórmula 1 e a Stock Car brasileira parecem viver momentos que se encaixam nesse preâmbulo. A primeira, onde as somas investidas são de um planeta tão distante quanto aquele onde está situada a atual equipe AMG-Mercedes, regularmente proporciona novas performances extra-pista da Ferrari, organização tão importante para a categoria que tem bônus extra na distribuição dos prêmios pelo simples fato de ser a Ferrari. Com uma cultura empresarial que tem na força do esporte a espinha dorsal de seu planejamento de mercado – ou marketing para dar um mais business flavour a este texto. Você se lembra quanto tempo faz que viu um anúncio vendendo o novo modelo da casa de Maranello? Praticamente todo o orçamento de publicidade é direcionado para o Riparto Corse da Scuderia.
Ano e meio após o início da era Arrivabene os resultados esperados não apareceram e provocaram uma esperada tempestade nos céus de Maranello e Fiorano, cidades tão próximas quanto Recife e Olinda ou Santo André e São Caetano. Em Maranello fica a fábrica da Ferrari, em Fiorano a pista de provas e a casa onde a residência alternativa e o escritório de Enzo Ferrari. Hoje em dia paira sobre esses dois municípios a aura de Sergio Marcchione, atual chefe supremo do grupo FCA e que tem mais poder sobre a marca que Piero Lardi Ferrari, o herdeiro de Enzo e acionista minoritário da marca.
O filme atualmente em exibição nas páginas de jornais, revistas e internet que acompanham a F-1 não é nada novo. Após ter conquistado o vice-campeonato de construtores de 1985, a Ferrari não conseguia dar a Michele Alboreto e Stefan Johansson carros em condição de melhorar ou sequer repetir esse resultado na temporada de 1986. O campeonato estava na metade e a Ferrari não conseguia fazer parte da disputa pelos primeiros lugares, andando atrás da Williams, McLaren e da Lotus, entre outros. Foi quando começaram os rumores de John Barnard negociando com Luca di Montezemolo.
Troque 1985 por 2016, Michele Alboreto e Stefan Johansson por Sebastian Vettel e Kimi Räikkönen, Williams e McLaren por Mercedes e Red Bull — com a Williams e Force India debatendo-se pelo papel da Lotus —, e não fica difícil ver Ross Brawn substituindo John Barnard no papel de mocinho da história. Bom pescador — ele tem até uma loja de artigos de pesca, acredite se quiser —, Brawn sabe administrar o tempo como poucos; por outro lado, amante de bons vinhos — já o encontrei em uma outra vinícola renovando o estoque de sua adega —, ele tem pleno conhecimento do prazer que as boas garrafas italianas podem proporcionar quando bebidas com moderação.
As apostas são de que o inglês de Manchester poderá prestar um trabalho de consultoria para a Ferrari, talvez a única diferença em relação à temporada anterior, quando Barnard construiu uma filial da Ferrari em Guildford. Anos mais tarde soube-se que algumas das máquinas compradas como novas para essa “antena tecnológica” não eram tão novas assim… O mais intrigante para quem gosta de suspense e mistério é que o assunto ganha corpo às vésperas do GP da Hungria, etapa que sempre produz resultados e episódios surpreendentes.
Também no Brasil mudanças começam a tomar corpo na categoria que concentra os grandes orçamentos do automobilismo nacional, a Stock Car. Maior vencedor da categoria depois do insuperável Ingo Hoffmann, Cacá Bueno está próximo de deixar a equipe de Andreas Mattheis, onde conquistou três títulos consecutivos dos cinco que possui: 2006, 2007, 2011, 2012 e 2013. A mudança poderia ser na verdade uma troca de pilotos entre equipes atualmente sob o comando de Mattheis: Cacá ocuparia o lugar de Felipe Fraga na equipe Cimed, o que garantiria ao jovem de Tocantins, atual líder do campeonato e patrocinado pela Red Bull, a vaga do carioca.
Ventos moderados e fortes ajudam a compor um cenário mais dramático a essa movimentação. O empresário João Adib, proprietário da Cimed e apaixonado por corridas, estaria disposto a montar uma estrutura própria para sua equipe e a Red Bull parece interessada em rever sua participação na Stock Car, ou no mínimo, na estrutura de Andreas Mattheis. Atualmente o ex-piloto coordena três equipes — a terceira é a equipe apoiada pela Shell, chefiada por seu filho e onde correm Ricardo Zonta e Átila Abreu. Na etapa de Cascavel, disputada no último fim de semana, Abreu reafirmou seu perfil explosivo e não poupou críticas ao trabalho de sua equipe, que não estaria lhe oferecendo um carro competitivo.
WG