A Ford na Europa sempre manteve o gosto por veículos de competição e mantinha um grupo dentro da organização, o Team RS, que desenvolvia trabalhos específicos em conjunto com a engenharia, focando principalmente veículos de rali. Em 1968 e 1969 o Ford Taunus já era alvo de preparações em sua motorização, desde o V-4 1,6-L, passando pelo V-6 2-L e o V-6 2,3-L, recebendo a sigla RS, Rallye Sport.
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Em 1970 a Ford anunciou a separação do Team RS e a criação de uma nova divisão independente para desenvolvimento e manufatura de veículos de competição, nascendo a AVO, Advanced Vehicle Operations, em Essex, no Reino Unido. Na realidade foi uma megaoperação envolvendo manufatura específica, onde os veículos normais de produção eram enviados à unidade AVO para receber as modificações necessárias às suas transformações esportivas e após, enviados às revendas também especializadas, para a sua comercialização. A ideia ambiciosa seria estender as vendas para toda Europa, além do Reino Unido.
O primeiro produto AVO foi o Escort RS 1600 em sua primeira geração, com motor Kent 1.557-cm³ com cabeçote especial com duplo comando e quatro válvulas por cilindro, desenvolvido em conjunto com a Cosworth, empresa especializada em veículos de competição. Com tração traseira e motor longitudinal, foi o primeiro RS de sucesso nos circuitos de rali na Europa. O Escort MK1 era leve, com seus 870 kg bem distribuídos entre os eixos, o que proporcionava excelente tocada esportiva e velocidade máxima respeitável de 178 km/h graças aos seus 130 cv.
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Falando um pouco da Cosworth, fabricante inglesa de motores para carros de corrida, ela nasce em 1958 com Mike Costin e Keith Duckworth fundando a empresa independente e que se juntou à Ford na preparação e desenvolvimento de motores de F-1, F2, F-3 e em competições de rali, com relevante sucesso. A Cosworth conquistou 176 vitórias, 13 campeonatos de pilotos e 10 de construtores na Fórmula 1, ficando na categoria até 2006, quando forneceu seus motores V-8 para a equipe Williams, continuando com sua forte parceria com a Ford.
O bom casamento Ford-Cosworth resultou em muitos modelos esportivos e de competição derivados de veículos de rua, com destaque aos Escort, em suas várias gerações. A saga teve início em sua primeira geração MK1, tração traseira, produzida entre 1968 e 1974, liderando vários campeonatos de rali com os motores Cosworth 1,6-L BDA e 1,7-L BDB, ambos de quatro cilindros. Continuando com a segunda geração, a MK2, produzida entre 1975 e 1979, também com tração traseira e com os motores Cosworth 1,8-L BDE e 2-L BDG — “BD” significando belt driven, acionamento dos comandos de válvulas por correia dentada.
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A divisão AVO tinha como lema construir esportivos de sucesso e nesta linha, desenvolver trem de força, motor, câmbio e diferencial, bem definidos em valores de torque, potência e relações de marcha, compatíveis com o peso do veículo e suas características de aerodinâmica e área frontal. Relação peso-potência menores e suspensões, direção e freios desenvolvidos para aguçar a sensibilidade do condutor em termos de precisão e segurança das manobras, propiciava a característica fun to drive (divertido de dirigir), fundamental para a finalidade esportiva. Em 1975 a divisão AVO foi novamente reintegrada à engenharia da Ford, deixando de atuar de forma independente.
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E veio a terceira geração do Escort, produzida entre 1980 e 1986, com duas importantes modificações que prejudicaram a sua aplicação em rali. Sua tração era dianteira com motor e transeixo instalados transversalmente, diferentemente das gerações anteriores com motor e câmbio longitudinais e tração traseira.
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E muitos projetos com base no MK3 foram estudados, incluindo uma versão 4WD, mantendo o motor e transeixo no sentido transversal e incluindo uma caixa de transferência para a tração traseira. Na realidade esta versão não se concretizou comercialmente e a Ford desenvolveu outra proposta com motor longitudinal e tração traseira, resultando no modelo RST 1700 que adotava o motor Cosworth 1,8-L BDT Turbo (300 cv). Foi descontinuado após 18 unidades produzidas.
![escort-rst-cosworth-1](https://www.autoentusiastas.com.br/ae/wp-content/uploads/2016/12/escort-rst-cosworth-1-750x536.jpg)
E então um projeto totalmente novo, o Escort RS 200 foi desenvolvido especificamente para ralis. Projetado em conformidade com o regulamento da FIA, Federação Internacional do Automóvel, Grupo B, era carro normal de linha e com exigência de produção mínima de 200 unidades por ano. O RS 200 foi apresentado pela primeira vez ao público no Salão de Belfast, capital da Irlanda do Norte. O novo veículo apresentava carroceria de compósito de fibra de vidro, desenhada pelo Estúdio Ghia e motor traseiro-central com tração nas quatro rodas. Seu trem de força tinha uma complexidade enorme para distribuição da tração nas quatro rodas. O motor era o Cosworth 1,8-L turbo, de 250 cv na versão de rua e 350 cv na de competição.
Veículo difícil de pilotar tanto pelo elevadíssimo desempenho quanto por suas características de resposta muito rápidas, às vezes imprecisas, se envolveu em vários acidentes, sendo o mais dramático o ocorrido no Rali de Portugal de 1986, que provocou a morte de três espectadores, ferindo muitos outros. Outro grave acidente foi no Hessen Rally de 1986, na Alemanha, que tirou a vida do suíço Michael Wyder, copiloto do seu compatriota Marc Surer, ex-piloto de F-1, após o veículo bater de lado em uma árvore. Mesmo com todos os percalços, o RS 200 foi produzido de 1984 a 1987 com mais de 250 unidades produzidas em várias versões, cada vez mais potentes.
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Creio que o maior sucesso da série RS foi o Escort em sua quinta geração. Apresentado ao público em 1992, Escort RS Cosworth tinha tração integral e motorização longitudinal Cosworth 2-L turbo, com 227 cv, que levava o veículo a mais de 225 km/h, acelerando de 0-100 km/h em 6,6 segundos. Tendo como característica especial um aerofólio traseiro enorme, apelidado de rabo de baleia, iniciou sua produção como série especial de 2.500 exemplares produzidos e que foi continuada como normal de produção pelo seu enorme sucesso entre os consumidores. Na realidade, o chassis do Escort RS Cosworth 4×4 era praticamente o mesmo do Ford Sierra, o que resultava em veículo extremamente estável, com respostas precisas e fácil de dirigir.
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Com distribuição de torque de 34/66% entre o eixo dianteiro e o traseiro, robusta suspensão dianteira McPherson, braços semiarrastados na traseira, e rodas 8×16 polegadas com pneus 225/45R18, dava prazer de dirigir. Participou de vários campeonatos de rali, sempre com motores Cosworth turbo muito potentes e que davam característica especial à marca.
Eu, particularmente, conheci e pilotei o Escort RS Cosworth 4WD no Campo de Provas da Ford em Tatuí, no interior de São Paulo, nos idos de 1994. Eram dois exemplares, um azul marinho e outro branco. Mesmo não tendo pratica na tocada de um carro de rali, era um prazer sentir o veículo na mão nas pistas de terra e pedrisco com curvas fechadas não compensadas, com costelas de vaca em alguns trechos. Que eu me lembre, os dois veículos foram devolvidos à Ford, um deles para a Inglaterra e outro para a Alemanha, deixando saudades. O Escort RS Cosworth ficou em produção até 1996, alcançando status de clássico, sendo hoje disputado pelos colecionadores de veículos puro-sangue.
E veio a nova fase dos RS com o Ford Focus em suas primeiras gerações, substituindo os Escort.
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Os Focus RS em suas primeiras duas gerações eram tração dianteira sem opção de 4WD. Com motores potentes apresentavam um detalhe problemático, o puxar a direção em saídas fortes (torque steer), tanto em retas quanto em curvas, ao despejar potência nas rodas dianteiras. O veiculo literalmente passarinhava, como se diz no jargão das corridas. Na realidade a causa principal do fenômeno era o raio negativo de rolagem da suspensão dianteira (scrub radius), que embora ajudasse na segurança em frenagens e em perda súbita de ar dos pneus, atrapalhava na hora de despejar potência nas rodas. Neste caso, quanto mais próximo de zero for o scrub radius, tanto melhor para evitar o fenômeno de puxar a direção. E neste caminho veio a suspensão RevoKnuckle (knuckle é manga de eixo) que acabava definitivamente com o problema, sem prejudicar a segurança em frenagens e em perda instantânea de ar dos pneus.
![revoknuckle](https://www.autoentusiastas.com.br/ae/wp-content/uploads/2016/12/REVOKNUCKLE-750x515.jpg)
O Focus RS em sua primeira geração foi produzido em 2002 e 2003 com motor turbo de 2 litros e 212 cv. Já na segunda geração, de 2009 a 2012, brilhou a versão RS 500 muito mais potente, com 345 cv e que também incluía a suspensão dianteira RevoKnuckle, como detalhe positivo de estabilidade direcional.
E em 2016, modelo 2017 chegou o Focus RS em sua terceira geração, o bolo e a cereja do bolo, adotando novamente o conteúdo 4WD, desprezado erroneamente nas versões anteriores. Com motor turbo 2,3-L 16V, 345 cv a 6.000 rpm, 45 m·kgf e com overboost (sobrepressão), 48 m·kgf entre 2.000 e 4.500 rpm, apresentou um casamento perfeito com o câmbio manual de seis marchas com tração integral. Desempenho brilhante de 0-100 em 4,7 segundos e velocidade máxima de 265 km/h.
![2017-ford-focus-rs-01-876x535](https://www.autoentusiastas.com.br/ae/wp-content/uploads/2016/12/2017-Ford-Focus-RS-01-876x535-750x464.jpg)
Com quatro modos programáveis de resposta, Normal, Sport, Race e Drift, o piloto pode se divertir de várias maneiras ao seu gosto. O modo Sport reduz a assistência da direção e torna a modulação do acelerador mais acentuada. O modo Race, aumenta a carga dos amortecedores em torno de 40%, reduz ainda mais a assistência de direção e torna a modulação do acelerador ainda mais acentuada que o modo Sport. O modo Drift desliga o controle de estabilidade mantendo a rapidez do acelerador e os amortecedores voltam à condição Normal de carga.
Enfim, para quem valoriza um hot hatch de verdade e quiser encarar, o Focus RS 2017 custa em torno de 39.000 euros (equivalente a R$ 144.300) na Europa. Em terra brasilis não se sabe ainda por quanto vai chegar.
A homenagem de hoje fica para a Ford, que ressuscitou o verdadeiro RS 4WD, produto de destaque para quem é autoentusiasta de verdade.
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