Como foi meu primeiro encontro com o Maverick Quadrijet de competição, Turismo Divisão 1, em 25 de julho de 1974.
No começo de julho de 1974 o Luiz Antônio Greco me telefonou, para o Rio, convidando-me a pilotar para a Ford. Seria já para a 12 Horas de Goiânia no dia 28 de julho, prova de inauguração do belo autódromo da cidade.
Até então eu vinha correndo de Opala com amigos Jan Balder e José Carlos Ramos, o dono do cupê 4100 1972 laranja, desde agosto do ano anterior, quando chegamos em segundo na I 25 Horas de Interlagos, a 47 segundos do Maverick do Greco, que representava a Ford nas competições, tripulado pelos irmãos Bird e Nilson Clemente e pelo gaúcho Clóvis de Moraes.
Fizemos mais quatro provas com o Opala até o final daquele ano. Ainda corremos eu e o José Carlos na Mil Quilômetros de Brasília, em março de 1974, com outro Opala, agora 250-S, e eu com o Jan e o Fausto Dabbur na II 25 Horas de Interlagos, em maio.
Como eu não tinha nenhum compromisso com a GM, muito menos qualquer ajuda, aceitei o convite, fora que me dava bem há anos com o Greco, sua família e seus pilotos.
A foto acima é do Maverick Quadrijet, enquadrado na categoria Turismo Divisão 1, que eu dividiria com o santista Marivaldo Fernandes — brinquei, era a “dupla praiana”, eu morava no Rio —, mas uma dupla bem diferente em compleição física: o banco do Ford tinha que estar bem atrás para mim e todo à frente para ele.
Para resolver, o mecânico-chefe Mariano (João Mariano de Oliveira) aplicou batentes nos trilhos, de tal forma que quem entrasse no carro nas paradas de boxe ia primeiro direto na alavanca de ajuste do banco e colocava o banco para si. Perfeito!
Esse dia 25 de julho era quinta-feira, eu havia chegado na noite anterior a Goiânia dirigindo meu Passat L ’74 (escolhi o L por ter bancos ainda alemães, mais baixos do que os nacionalizados do LS). O Marivaldo iria de avião na quinta-feira mesmo, mas o voo dele era com conexão em Brasília, houve algum problema de atraso e ele não chegou a tempo para o primeiro treino.
Minha primeira guiada no Maverick foi emocionante e inesquecível. Ao sair do boxe, pegar a pequena rampa de saída e cair na reta principal, acelerando aquele V-8, com aquele som característico, foi mesmo incrível. Me senti num carro da Nascar!
Mas na curva 1, o “curvão”, epa! Cadê o freio? Pedal tinha, bem alto, mas resposta ao pressioná-lo, praticamente zero. O que é isso? Esse carro não para? — pensei dentro do Bell.
Continuei pelo circuito para conhecer o carro, mas agora com um pé atrás, pois não havia freio no sentido estrito. Nem aplicando muita força no pedal. Dei mais um volta, desta vez completa, e fui para o boxe.
— O que houve? — veio o Greco me perguntando com sua característica voz rouca, de trovão.
— Nada errado, Greco, só que o carro não tem freio…
— Como assim, não tem freio??? O Paulão e os outros andam com ele e não reclamam!
— Pois eu reclamo, e é preciso fazer alguma coisa. O carro não para.
— Mas aqui, hoje, no boxe? — perguntou, meio nervoso.
— Isso, aqui mesmo — respondi — posso cuidar disso?
— Pô, carioca, você chega e já quer inventar moda??? Tudo bem, pode fazer o que quiser.
Antes pedi ao Greco para sair do autódromo com o Maverick e andar na avenida defronte, pois queria simular um uso normal para comprovar minha percepção de que o carro não freava, o que foi confirmado. Não freava mesmo nada.
Houve certo mal-estar no boxe entre Greco, eu e os mecânicos. Mas pus mãos à obra, pedi que desmontassem o freio dianteiro. O Paulão viu aquele movimento todo, me perguntou por que estava mexendo no freio. Expliquei-lhe e ele disse, “É, freio não tem mesmo…” E quase em seguida disse “Quero que você faça o que vai fazer no seu, no meu também.” Bobo é o que o Paulão não é…
Para entender, o freio dianteiro do Maverick, quando foi lançado, era de pinça flutuante de um só pistão:
Por só ser um pistão, o corpo da pinça precisa deslizar solto, sobre guias, para a reação comprimir as duas pastilhas por igual. A charada estava esclarecida com a desmontagem: o corpo da pinça não estava livre nas guias, mas emperrado. Nessas eram claras as marcas de engripamento, visíveis também nas pinças.
Um funcionário da equipe foi a uma concessionária Ford e voltou com discos, pinças, pastilhas, tudo novo, e pasta G e graxa BR2S Molykote, enquanto um mecânico ficou limando as superfícies das guias, removendo as marcas de engripamento, alisando-as.
Nesse ínterim, eu sabendo que haviam colocado válvula de corte na linha hidráulica do freio traseiro para resolver um problema crônico do Maverick, travamento fácil das rodas traseiras, pedi para retirá-la, pois era contra o regulamento. O Greco “chiou” mas concordou, afinal não ficaria bem um carro da equipe oficial da Ford ser desclassificado.
Nisso o Mariano deu a ideia de desbastar, eliminar parte das lonas de freio traseiras para diminuir-lhes a eficácia e com isso evitar o travamento. “Grande ideia, Mariano,” disse-lhe, e foi o que ele fez.
Tudo montado com pasta G e um pouco de graxa BR2S nas guias, freio sangrado, deu para dar uma entrada na pista no final do último treino: o freio agora respondia como devia mesmo pisando de leve no pedal com a ponta do pé. E nada de travamento das rodas traseiras.
Se eu ensinei algo à grande equipe, por outro lado aprendi uma com o Greco: para poupar freio, fundamental numa corrida de 12 horas, deve-se contar com a ajuda do arrasto aerodinâmico: esta ajuda consiste em, no fim da reta, levantar o pé do acelerador e deixar a primeira dissipação de velocidade por conta desse arrasto. Um ou dois segundos depois, aplicar freio.
A corrida começou à zero hora de domingo 28 de julho e meu Maverick já não tinha mais o número 45, mas 3, correspondente ao terceiro tempo na classificação.
Acabamos vencendo a corrida, mas essa é outra história.
BS