Acordo com Toro Rosso esperado a qualquer hora. Renault finalmente consegue Carlos Sainz. Alonso ainda é dúvida na McLaren.
As verdades da F-1 são descobertas num movimento semelhante ao movimento das marés: formadas em alto mar, longe das vistas do público, delas emergem a espuma que embeleza a orla das praias. Esta teoria deverá ser comprovada nos próximos dias, quando uma longa e conturbada crise envolvendo Carlos Sainz Jr, Fernando Alonso, Honda, Jolyon Palmer, McLaren, Renault e Toro Rosso — além de outros que se afogaram pelo caminho — chegar ao fim e revelar a verdadeira crista dessa onda. Por enquanto ninguém confirma nada, mas do mesmo jeito que o mar não repete suas marcas quando quebra na areia, é certo que os elos que hoje unem essas partes em diferentes praias jamais serão vistos da mesma forma.
O cenário desta coluna tem dois núcleos principais. O primeiro é composto por Fernando Alonso, Honda e McLaren; o outro por Carlos Sainz Jr, Renault e Toro Rosso. Ligando um ao outro aparecem a FIA, a FOM e a Red Bull e tudo isso junto compõe um roteiro que pode ser digno de novela mexicana, de um filme noir sobre choque entre gerações ou de um thriller envolvendo investidores que atuam em mercados mundo afora.
A novela mexicana tem tudo a ver com os caprichos de Fernando Alonso, piloto de habilidade irretocável quando desafiado a acelerar qualquer carro; seus genes latinos, porém, geram conflitos em famílias mais tradicionais como as de culturas nipônica ou inglesa. Para explorar ao máximo seu potencial de promoção, a McLaren não hesita em dar-lhe o melhor equipamento possível e garantir que seu status de primeiro piloto jamais seja ameaçado. Ao denunciar publicamente as deficiências da Honda, o espanhol provoca a ira do mais calmo habitante do arquipélago japonês. Ter conquistado dois títulos com a Renault não garante ao representante das Astúrias status de prima donna no futuro.
Nunca antes na história da humanidade os jovens ocuparam tanto destaque nos caminhos da fama e poder. Tal qual o efeito que a frase usada por um famoso político causa em brasileiros e brasileiras, a ideia de não assumir a chefia do conselho um punhado de meses após começar em um novo emprego causa arrepios e brotoejas à geração Y. Max Verstappen, Carlos Sainz, Daniil Kvyat, Lance Stroll e Estebán Ocón são alguns exemplos dessa movida no universo da F-1.
Apadrinhado por Helmut Marko, Max Emilian Verstappen pilotou um F-1 da equipe Toro Rosso pela primeira vez quando tinha 17 anos e 2 dias e no dia 15 de março de 2015 disputava seu primeiro GP ao lado de Carlos Sainz Vásquez de Castro. É dado como certo que nenhuma equipe inscreveu uma dupla mais jovem em toda a história da F-1. Mesmo sem títulos importantes, o holandês Verstappen tornou-se o piloto mais jovem a pontuar na F-1 (sétimo colocado no GP da Malásia daquele ano) e cerca de um ano mais tarde surpreendeu novamente ao vencer o GP da Espanha de 2016.
O triunfo em Barcelona aconteceu quando Verstappen estreou pela equipe Red Bull aos 18 anos e 229 dias de vida, algo inédito na categoria. Praticamente três anos mais velho — Sainz nasceu no dia 1º de setembro de 1994 e Verstappen, no dia 30 de setembro de 1997 —, não demorou muito para o espanhol externar sua decepção de ter sido preterido na escolha do substituto de Daniil Kvyat, o russo que perdeu seu posto na Red Bull após uma série de “excessos de arrojo”.
E assim nasceu a cizânia: desde então Sainz regularmente contesta as limitações que a vida em uma equipe pequeno-média impõe aos seus planos de carreira. Nem mesmo os energéticos que patrocinam sua causa deram-lhe asas suficientes para evitar o que ele considera um estol, aquela situação em que o avião não consegue subir mais por falta de potência e perde velocidade e sustentação. As turbulências com seus superiores hierárquicos passaram a ser notadas entre os pousos e decolagens impostas pelo calendário da F-1. O ETA (hora estimada de chegada, na sigla em inglês) para romper seu contrato tornou-se uma questão de tempo, tempo cada vez mais curto.
O mercado espanhol, um dos que mais cresce este ano — em agosto subiu 13%, contra 7,2 do total europeu — é o quinto na escala de valores de vendas da Renault no Velho Continente, atrás da Alemanha, França, Inglaterra e Itália. Seus pilotos atuais são o alemão Nico Hulkenberg (responsável pelos 34 pontos marcados pela equipe nesta temporada) e o inglês Jolyon Palmer. A indisponibilidade de pilotos franceses ou italianos e as boas campanhas de 2016 (46 pontos) e 2017 (34 até agora) fazem de Sainz o substituto ideal para Palmer, que marcou seu único ponto na F-1 no GP da Malásia de 2016.
Entra em cena o destino da Toro Rosso, equipe que usa o motor Renault, tem Sainz sob contrato e nas mãos exibe o script de um filme que mostra o subterrâneo do mercado financeiro. Como a Honda não aceitou pagar o preço pedido por Helmut Marko e Franz Tost — os homens fortes do time —, e a Renault optou por ter a McLaren como terceira equipe, a solução foi encontrada e incluiu negociar o passe de Sainz, supostamente por € 8 milhões. Outro tanto deverá vir em forma da possível adoção de um piloto japonês, “cortesia” feita à Honda para a vaga que muitos acreditam estar destinada a Pierre Gasly, francês que ainda cursa o vestibular para a F-1.
Os efeitos dessa negociação deverão ser vistos ao longo do tempo. Os apressadinhos já dão conta que Palmer pode ficar a pé antes do final da temporada, pois este ano a Renault quer terminar o Campeonato de Construtores em uma posição melhor que o oitavo lugar ocupado atualmente. Quem enxerga mais longe não duvida que no ano que vem a marca francesa terá maior espaço nas transmissões de TV e nos cartazes espalhados pelas pistas…
Enquanto isso sobra para a Honda, que amarga dois programas malsucedidos: o fechamento de sua própria equipe no final de 2008 e três temporadas de insucessos com a McLaren, união prestes a ter um final infeliz. Mesmo assim, a persistência e determinação típica dos nipônicos, sob comando de Yusure Hasegawa, chefe do projeto F-1 da Honda (foto de abertura da coluna) formataram um novo programa com a Toro Rosso e impediram que a Honda abaixasse sua crista.
WG