Nossas autoridades de trânsito são useiras e vezeiras em lidar com a sociedade como crianças diante de um videogame: brincando com a coisa pública.
Passei a ter certeza da incompetência, despreparo e incapacidade do Denatran depois que um de seus “técnicos” sugeriu como instalar as cadeirinhas nas vans de transporte escolar. O equipamento exige cintos com três pontos de fixação, elas só contam com dois.
Não fossem as cadeirinhas, na semana passada o órgão federal de trânsito eliminou qualquer dúvida a respeito de sua indolência para tratar do assunto, ao revogar a resolução nº 716 de 30 de novembro 2017 que exigia a obrigatoriedade da inspeção técnica veicular (ITV).
A indiscutível importância da ITV (sua implantação se arrasta por 20 anos…) é por restringir a circulação de veículos sem condições de segurança. Uma ameaça à integridade do cidadão, pois representam um enorme risco na via pública: quebram, poluem, ferem e matam.
A Prefeitura de São Paulo tentou implantá-la (mas cometeu tantos deslizes que pouco durou…). No Rio de Janeiro existe uma vistoria básica de segurança, que não contempla as emissões. Na Resolução nº 716, o órgão federal de trânsito transferiu o abacaxi para os estaduais (Detrans). O diretor do Denatran, Maurício Alves, declarou na semana passada, para justificar que a resolução seria revogada, que “Estamos sempre atentos às demandas dos Detrans, que são nossos parceiros na fiscalização das leis de trânsito, e entendemos que esse processo precisa passar por um debate mais aprofundado, para que possamos aplicá-lo da melhor maneira possível, com o mínimo de transtorno à população”. Ou seja, só meses depois de publicá-la, o Denatran percebe que deveria ter “debatido mais aprofundadamente o processo”. Uma incompetência que não espanta, pois nossas autoridades de trânsito são useiras e vezeiras em lidar com a sociedade como crianças diante de um videogame: brincando com a coisa pública.
Assim como a resolução da ITV que foi e voltou, no mês passado o Contran decidiu infernizar a vida do motorista ao exigir um curso para renovação da carteira de habilitação. Voltou atrás dois dias depois.
No ano passado, a ANP também desistiu de fazer cumprir sua própria exigência de se aditivar toda nossa gasolina para manter mais limpos os motores, reduzir consumo e emissões.
Num passado não muito distante, o governo federal decidiu (e mudou de ideia logo depois) tornar obrigatório os rastreadores nos automóveis. Diante do raciocínio de que, “já que somos comprovadamente incompetentes para cuidar do bem do cidadão, ele que assuma esta responsabilidade”…
O governo tentou também estabelecer uma fiscalização eletrônica dos veículos pelo Siniav. Um chip colado no para-brisa do automóvel que emite informações sobre o próprio e que seriam coletadas por antenas plantadas às margens das ruas e rodovias. Só depois de publicar a resolução é que percebeu a complexidade tecnológica para implantar o sistema…
Em passado mais distante, várias outras medidas tomadas pelo Contran/Denatran eram absolutamente inócuas e só provocaram aborrecimento e prejuízo aos motoristas, como estojinho de primeiros socorros e extintores de incêndio.
Outra “facada” injustificável no saldo bancário do cidadão é o seguro obrigatório: a arrecadação do DPVAT é toda canalizada para a seguradora Líder, na verdade um consórcio entre dezenas de companhias de seguro. Caso único de monopólio no planeta que também não sensibiliza o governo nem os parlamentares.
A relação é longa e o brasileiro percebe, estupefato, a indiferença do governo federal também em relação aos famigerados quebra-molas implantados irregularmente em todo o país. Do absurdo da multa cometida por um motorista e transferida (junto com o automóvel) para o novo proprietário do carro.
Ah, já ia me esquecendo: o que o “gênio” do Denatran sugeriu foi que se adaptasse um terceiro ponto de fixação do cinto de segurança nas vans escolares. Ignorava que a ideia vai de encontro aos mais elementares princípios de engenharia automobilística.
Como diria meu xará, o Boris Casoy: “Isto é uma vergonha”…
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de total responsabilidade do seu autor e não reflete necessariamente a opinião do AUTOentusiastas.
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