Quando chegam as férias e se planeja a viagem de carro com a família, dá saudade do tempo em que se abria o capô e estava tudo ali à vista: distribuidor, bomba de gasolina, correia do alternador, bobina, cabos de vela, bateria (com tampinhas para “completar o nível”, carburador com parafusos de regulagem e outros, todos decorando hoje prateleiras dos museus.
Quando se abre a tampa do capô, depara-se hoje com uma enorme tampa de plástico preto cobrindo quase tudo. Aliás, boa parte dos componentes de outrora nem existe mais, eliminados pela eletrônica, que domina cada pedacinho do automóvel. Acesso hoje é limitado aos reservatórios de fluidos e óleos E, as vezes, à correia do alternador/ar-condicionado/bomba d’água. E aos polos da bateria.
Até uns tempos atrás, recomendava-se — antes de pôr o pé na estrada — uma lista de peças no porta-malas para a eventualidade (nem tão eventual assim…) de pane elétrica ou mecânica. Eram platinados, condensadores, velas, lâmpadas, fusíveis, lixa de unha, Araldite, Durepóxi,arame…
Hoje, problema na estrada é fácil de se resolver desde que se tenha um (baita) computador no porta-malas para o diagnóstico ou um celular para chamar o caminhão-plataforma. Mas, verdade seja dita: por mais que os apaixonados fiquem aborrecidos, o fato é que os automóveis modernos dificilmente ficam parados pelo caminho, até porque foram eliminadas as principais fontes de problemas. Os que manjavam de mecânica quebravam o galho de alguma forma. Os meros mortais perdiam um tempão e dinheiro para rebocar o carro, mas foram salvos pela eletrônica: hoje não tem mais distribuidor, nem carburador…nem onde usar a lixa de unha. Que entrava em ação quando o carro parava na estrada com o platinado corroído nas superfícies que (deveriam ser) mas não eram de platina…
A modernidade do automóvel modernizou também a listinha de apetrechos essenciais para se levar numa viagem. A começar da chave-reserva: no passado, qualquer chaveiro da esquina resolvia o problema da chave perdida ou quebrada. Hoje, com chip embutido, ela é muito mais problemática, pois se desconfigura num tombo ou próxima a um campo magnético. E, longe de casa, sua reprodução pode sair caro.
Motor queima óleo como antes, mas bem menos. Porém, continua valendo a pena levar no porta-malas o óleo do cárter, que nem sempre se encontra na estrada. A diferença: antes era numa lata, hoje é num conveniente frasco de plástico com eficaz tampa rosqueada..
O pneu murchou sem maiores explicações? A solução prática se chamava Tyre Pando. Hoje virou “Reparador Instantâneo de Pneus” e continua sendo o mesmo tubinho de spray que enche parcialmente o pneu e ainda tampa o furo. Um belo quebra-galho (no passado e no presente) até se chegar ao borracheiro. Entretanto, quando o estrago é maior, só o trocando pelo estepe. E pneu continua não sabendo se é dia ou noite e o motorista pode se ver em apuros quando não tiver sequer um céu enluarado para amenizar a escuridão. Porém, a lanterna de mão já não faz tanta falta: entre as vantagens dos tempos modernos, quase todos os celulares contam com um facho de luz.
Finalmente, é inquestionável que a eletrônica aumentou a confiabilidade do carro. Se você botar o pé na estrada com toda a família mais bagagem, sem nenhum apoio emergencial no porta-malas, a chance de chegar ao destino sem nenhum problema é enorme. Com a diferença de que, antes, um platinado queimado se resolvia com a lixa de unha. Hoje qualquer problema no sistema eletrônico exige um computador para resolver. E este, só depois de algumas horas de espera no acostamento pelo reboque e uma não programada viagem até à concessionária ou oficina — computadorizada — mais próxima…
BF
Foto:rtl.fr
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
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