Um leitor me pediu para escrever sobre modelos que nunca nasceram, por um motivo ou outro.
A verdade é que mais 50 % do que o estúdio produz antes da aprovação de um modelo, vai para
o lixo.
Isto porque você, para começar, nunca se pode apresentar somente uma proposta para os temas solicitados. A diretoria sempre tem que ter mais de uma opção para apreciar e escolher.
No caso dos modelos em escala 1/1, sempre fazemos três, para chegar a um..Portanto, no mínimo, dois modelos são descartados e nunca se tornarão um automóvel.
Além disso, nas fases iniciais do trabalhos muitos designers produzem suas ideias, através de
desenhos, e no fim, somente três serão escolhidos para se tornarem modelos.
Porém, existem temas que são aprovados, se tornam modelos, passam por todas fases de aprovação e mesmo assim, por um motivo ou outro são abandonados. Desperdiçam-se centenas de horas de trabalho, não só do Design mas também das áreas de engenharia avançada, protótipos, áreas formais da engenharia, e outras fora da área de desenvolvimento.
As razões podem ser diversas, mas assim é a vida dentro da indústria automobilística. Na minha carreira passei por muitas situações como esta é aqui vou listar algumas mais significativas.
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Como sempre, a Alemanha estava desenvolvendo um hatchback (Polo) que ao final nunca chegou a ser produzido, e nesta categoria, na Alemanha não existia veículos “notchback” (Voyage, Jetta, Passat, aqui chamados de sedãs), pois por lá notchbacks só existem a partir da categoria A (Golf).
Por motivos financeiros o programa acabou não sendo aprovado e tivemos que conviver com o primeiro Voyage por muito mais tempo do que desejávamos.
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Temos que dizer que o carro era meio estranho em termos de proporção, pois a parte dianteira não tinha condições de ser menor que o Gol, já que toda parte do motor, que era longitudinal, tinha que ser igual, o que acabou gerando um carro com um “nariz” enorme em relação ao corpo.
Pelo que me consta, o carro não foi aceito pela Alemanha e o projeto foi abandonado. Cheguei a ver o protótipo em chapa, o que significa que o projeto avançou bastante antes de ser descartado.
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O projeto foi rejeitado pelas Volkswagen AG e do Brasil quando descobrimos que estávamos
trabalhando numa plataforma que seria descontinuada, pois o novo Escort da época já estava em fase avançada de desenvolvimento.
Depois de alguns atritos entre as duas potências, a Ford acabou cedendo e aí sim, desenvolvemos o Logus e o Pointer, que foram desenvolvidos no estúdio da Ghia Design na Itália, por motivos de segredo industrial por parte da Ford.
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Ainda no período da Autolatina, a Ford desenvolveu, meio que por baixo do pano, um modelo de um hatchback, usando a plataforma do Gol.
Quando a matriz descobriu a tramoia, tudo foi por água a baixo, já que o contrato não o previa.
Porém, como o espanhol José Ignacio López de Arriortúa, espanhol) era o chefão para o mercado sul-americano, acabou recusando o modelo através de manobras financeiras alegando que o Polo Classic era mais negócio.
Como nenhum grande chefe da VW do Brasil estava disposto a pôr sua cabeça em risco, o assunto foi esquecido. Nosso modelo foi então descartado, mesmo sendo melhor visualmente e com mais sentido dentro da paleta da família Gol.
No fim, o Polo Classic foi um fracasso de vendas e os únicos que ganharam com isso foram os
espanhóis ligados ao López.
Política acima de tudo matou a chance da VW continuar como líder no mercado de sedãs no Brasil e foi o começo de um fase difícil para nós.
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Fizemos também várias tentativas de redesenhar a Kombi, em vários momentos da minha gestão.
Ela foi redesenhada na plataforma adaptada do Gol, que não permitia uma frente compacta como
a da Kombi original, ficando mais parecida com uma Touran, com um pequeno capô, e sete lugares.
A proposta nunca passou do modelo de clay, pois a Alemanha não permitiu que a ideia fosse para frente, por vários motivos, inclusive por inveja da ideia, que estava fora dos planos globais da companhia.
Esta ideia voltou à tona várias vezes, usando outras plataformas, mas nunca decolou, sempre
porque os planos da companhia eram outros, como, por exemplo, nos últimos anos, a famosa
Bulli, uma Kombi com motor elétrico, que até hoje não foi lançada.
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Na época em que trabalhei em Potsdam, o estúdio avançado da VW em Berlim, liderei algumas
propostas para mercados emergentes que não “colaram”, desta vez por falta de apoio do nosso
próprio marketing no Brasil.
A proposta mais significativa foi um crossover sobre a plataforma do Fox, feita em 2007. Eu tinha absoluta convicção que um pequeno SUV seria um ótimo produto para o mercado brasileiro e sul-americano, porém por falta de apoio do Brasil e falta de visão da VWAG, o modelo não chegou a ser viabilizado.
Mais tarde, o mesmo formato foi implementado pela Kia, quando o meu chefe de Potsdam se tornou o Designer-chefe da marca, claro com uma aparência e proporção muito melhor, já que ali ele teve apoio e liberdade para implementá-lo.
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Na minha fase como chefe do Design Corner na VWAG, tentei mais uma vez para desenvolver um carro 100% esportivo, baseado no SP2.
O Klaus Bischoff , chefe de Design da VW alemã, até que me apoiou, desde que fosse usada a plataforma do Golf, a mesma usada no Sirocco, um carro maravilhoso mas que não obteve sucesso nem na. Europa, não atingindo volumes necessários para fazer lucro.
Se na Europa ele não cumpri-o os objetivos financeiros, como poderia isso acontecer no Brasil? Mais uma vez, fomos chamados de sonhadores (mas não é isso que deve ser um Designer?) e embora tenhamos chegado a uma proporção satisfatória (diferente de um Porsche) o projeto não deslanchou. Fizemos alguns estudos em escala 1/4 e por aí ficou.
Recentemente até o Scirocco teve sua produção cancelada. Paralelamente, lutamos também para
importar o carro para o Brasil, mas a área de marketing ignorou completamente a proposta. Ainda tenho comigo que o carro teria uma boa aceitação no Brasil, especialmente hoje com a nova geração de motores TSI.
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Trabalhamos muitas horas em um projeto chamado “3K”, revolucionário no sentindo de desenvolver um carro barato, que não fosse construido com carroceria convencional usando aço estampado, que é um processo caríssimo.
Toda estrutura seria com perfis dobrados e as peças de superfície, em plástico injetado na cor final do veiculo.
Foi um projeto muito gratificante principalmente porque aprendemos sobre novas tecnologias, e tivemos que esquentar a cabeça junto com os engenheiros para resolver os problemas estruturais e de qualidade.
Antes de voltar definitivamente para o Brasil, desenvolvemos um novo “hut” (carroceria) para o Fox. Claro que tivemos que manter as portas atuais, por motivo de custo, mas chegamos a um bom resultado, conseguindo um boa diferenciação do modelo atual (infelizmente não tenho foto).
Porém, mais uma vez, com o início de uma crise no mercado brasileiro e mudanças no alto comando na VWAG e no Brasil, o modelo foi cancelado. Foram desenvolvidos modelos em escala 1/1, do exterior e interior, que foram para o lixo.
Outro projeto que nos custou centenas de horas e vários modelos foi um substituto do Gol baseado na plataforma modificada do up!. Para atingir as metas de Package, a plataforma tinha que sofrer grandes modificações, incluindo assoalho (mais longo) e suspensão (mais largo).
Os modelos, notchback e hatchback ficaram muito bons (de novo, sem fotos).
Com este volume de modificação, o projeto começou a ficar muito caro. e, além disso, a matriz tinha outros planos para nós. O Brasil era um importante mercado para fomentar o volume mundial do Novo Polo, e mesmo com os nossos modelos do hatchback e notchback prontos, o projeto foi recusado.
Ficamos, como sempre, muito bravos com a decisão, porém o tempo mostrou que ela fazia sentido, pois acabou trazendo uma plataforma modular de última geração para o Brasil, a MQB, que atende todas as necessidades de segurança 5-estrelas e nova arquitetura eletrônica, além de termos a possibilidade de trazer peças e acessórios do modelo alemão sem a necessidade de desenvolvimento de sistemas únicos e exclusivos para o Brasil.
Além disso, a nova plataforma trouxe também muito trabalho, onde derivamos um notch (Virtus), um SUV (T-Cross) e, se Deus ajudar, uma picape..
Se vocês acham que é muita coisa que deixou de ser feita, é porque não sabem que a mesma coisa acontece na Alemanha, só que em maior quantidade.
Assim é a vida de um Designer, cheia de alegrias, mas também muitas decepções.
O importante é continuar sonhando.
LV