Na quinta-feira passada (23) Alessandro Reis, do portal UOL, publicou uma matéria com o segundo VEMP dos dois que haviam sido fabricados pela Volkswagen. Este é o 4×2, já o 4×4 pertence ao Acervo da fábrica e foi um dos 20 veículos escolhidos para serem apresentados no evento “Garagem Volkswagen” em 28 de novembro último, em comemoração dos 60 anos da inauguração da Fábrica Anchieta.
O Alessandro Reis tinha enviado uma mensagem por WhatsApp que eu acabei lendo no próprio dia 23, que dizia:
“Boa tarde, Alexander,
Aqui é o Alessandro, jornalista do UOL. Já nos falamos há um bom tempo em algum evento de carros antigos da VW. Gostaria de pedir a sua ajuda em uma pauta. Creio ter encontrado a unidade do jipe VEMP que a VW não sabe onde está e que teria pertencido a Wolfgang Sauer. Queria saber se você tem mais informações a respeito. Tenho fotos, número do chassi e numeração da carroceria, produzida pela Karmann-Ghia. “
Por um problema de comunicação a minha resposta acabou não chegando a tempo para o Alessandro, mas eu lhe disse o seguintee:
“Bom dia, Alessandro,
Vi sua mensagem somente hoje pela madrugada, quando fui dormir. O assunto já foi motivo de uma matéria publicada em três partes no AUTOentusiastas na minha coluna “Falando de Fusca & Afins — compondo a série VEMP x JEG.
Esta sua nova descoberta é mais que um complemento do assunto, uma informação adicional importante. O material de que estou falando é:
VEMP x JEG – PARTE 1
VEMP X JEG – PARTE 1A – EXTRA
VEMP x JEG – PARTE 2, FINAL
Há bastante informação nestas três partes sobre o assunto.”
A história do segundo VEMP começou a ser deslindada, e tem algumas passagens “peculiares” do ponto de vista de hoje. Consultei o Sr. Guenter Karl Hix no dia seguinte (24) sobre a tal plaqueta da Karmann-Ghia. Ele ficou muito contente com a descoberta do segundo VEMP e lembrou que eles foram construídos no departamento de protótipos que, juntamente com o setor de design, eram de sua responsabilidade.
Ele contou que a decisão de fazer uma versão 4×2 foi com o pensamento de fornecer um veículo leve, baseado no chassi da Kombi, para o transporte nas intendências das Forças Armadas, onde as exigências não eram tão grandes. Ele complementou dizendo que era uma belíssima lembrança para ele que fez um desenvolvimento “sem falsa modéstia” (suas palavras), bastante bem feito, na raça e muito rapidamente, quando a engenharia da Volkswagen estava na Vila Carioca, em São Paulo, nas antigas instalações industriais da Vemag S.A., fabricante dos veículos DKW-Vemag.empresa absorvida pela VW do Brasil em agosto de 1966..
O segundo VEMP era um protótipo que, em princípio, pertencia ao patrimônio da fábrica. Wolfgang Sauer, então presidente da Volkswagen do Brasil, que de alguma forma designou este veículo para ser usado em sua fazenda, tinha que arranjar uma maneira de torná-lo passível de ser licenciado para poder ser usado fora da fazenda. E isto ocorreu de tal forma que, até hoje, este é um veículo fabricado pela Volkswagen, conforme registrado em sua documentação, como pode ser visto nos registros do Sinesp Cidadão:
A existência da plaqueta da Karmann-Ghia do Brasil Nr. 0001 permanece sem uma explicação lógica; e para o sr. Hix não há nada que ele lembre que justifique a colocação desta plaqueta no veículo.
O segundo VEMP, que acabou pertencendo a Wolfgang Sauer, foi vendido para um senhor de nome Erb;. Este o vendeu em 1999 para o sr. Francisco José Rossi Neto, que o possui até hoje, segundo o relato do jornalista Alessandro Reis. “Ele comprou este jipe por haver uma plaqueta ‘Carroceria Karmann-Ghia do Brasil’ — ao que tudo indica, se ele queria comprar um veículo da Karmann-Ghia do Brasil, acabou sendo levado a engano!”
Abaixo duas fotos do VEMP 4×2 em seu estado original, com seus detalhes como concebido na época de seu desenvolvimento:
Entre os momentos retratados acima e 1999, quando o sr. Francisco José comprou este jipe, se passaram muitos anos, e a foto abaixo mostra como o segundo VEMP estava:
A esta altura o veículo já tinha sofrido várias alterações. A mais evidente delas foi a retirada do estepe do capô dianteiro, sendo substituído por uma tampa quadrada. A frente também foi alterada, transformada em uma frente lisa, e o emblema VW foi substituído por um cromado. As rodas, originalmente de Variant II, foram substituídas por tipo liga leve, de uma largura tal que não exigiu aumentar a largura dos para-lamas, portanto se mantiveram as originais. Foram acrescentados um guincho e dois faróis auxiliares. Foi instalado um retrovisor esquerdo quadrado. O carro estava pintado de prata com salpicos azuis imitando algum líquiido..
Um dos itens que tinha sido retirado de início pelo sr. Francisco foram as caixas de redução nos cubos de roda traseiros, que acabavam limitando a velocidade do veículo para próximo de 60 km/h.
No total, o sr. Francisco fez três reformas no seu VEMP. O carro foi pintado de amarelo, recebeu rodas mais largas, que exigiram o alargamento dos para-lamas. É curioso observar que o estepe estava instalado em um suporte traseiro rebatível, com uma roda mais larga. O estribo ganhou um acabamento antiderrapante.
Depois o estepe foi devolvido ao capô dianteiro (mas o acabamento do encaixe do suporte do estepe acabou ficando desalinhado, quando comparado com a sua instalação original). O emblema VW frontal foi novamente trocado por outro menor. Foram instaladas duas luzes de posição abaixo dos faróis principais, dois novos jogos de faróis de longo alcance e dois retrovisores externos novos.
Finalmente o motor, originalmente boxer arrefecido a ar, foi substituído por um AP-1800, o que demandou adaptações maiores, como a instalação de um radiador dianteiro. O câmbio original de quatro marchas foi mantido, mas a estrutura teve de receber reforços por o motor AP-1800 precisar de suporte próprio (ao contrário do motor boxer arrefecido a ar, apenas fixado à carcaça de câmbio), e o carro foi pintado de laranja.
Nesta fase a moldura do para-brisas e a estrutura da capota foram modificadas em relação ao original.
Comentário final
O desconhecimento da origem real e da raridade deste veículo, do ponto de vista histórico, foi uma pena, já que caso ele tivesse sido mantido original e guardado na fábrica todos esses anos, ele poderia ocupar um lugar no Acervo da Volkswagen do Brasil ao lado do primeiro VEMP que lá está.
Mas o fato de seu paradeiro ter sido descoberto foi importante para fechar o relato dos dois VEMP abricados pela Volkswagen. Da comparação das fotos e das características fica clara a origem do segundo VEMP. Mesmo restando uma atmosfera de mistério envolvendo a tal plaqueta da Karmann-Ghia do Brasil, resta a certeza do pioneirismo de Guenter Hix e sua equipe no desenvolvimento destas duas versões do VEMP. Fica no ar a dúvida de como teria sido o mundo automobilístico brasileiro caso estes veículos tivessem entrado em linha de fabricação.
AG
Aqui fica o agradecimento ao Alessandro Reis, que permitiu o uso do material que ele havia publicado, em especial as fotos de Francisco José Rossi Neto, proprietário atual do 2º VEMP.
Um agradecimento também ao sr. Guenter Karl Hix que colaborou com seu conhecimento dos VEMP. Também agradeço a Guilherme Sabino a quem fiz consultas por telefone.
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