Não era novidade: Philipp Schiemer, ex-presidente da Mercedes no Brasil (ele voltou para a Alemanha em junho deste ano) avisou que estudava fechar a fábrica de automóveis em Iracemápolis, no interior de São Paulo, 170 quilômetros a noroeste da capital. Ela produzia lá dois modelos desde 2016, o GLA e o Classe C (foto de abertura, primeira unidade produzida). Foi construída para se valer dos incentivos do plano Inovar-Auto estabelecido pelo governo federal em 2012. As marcas que viessem a produzir aqui teriam incentivos, o que levou Mercedes, BMW e Jaguar Land Rover a implantar fábricas no país.
A Audi também aderiu ao plano, voltando a se utilizar da fábrica da VW (do mesmo grupo) no Paraná, onde já tinha produzido o A3 hatch.
Na quinta-feira dia 17 a Mercedes anunciou oficialmente o fechamento da fábrica. Fez as contas e percebeu ser mais barato trazer o GLA e a série C da Alemanha do que produzir localmente. O baixo volume de vendas e o elevado custo Brasil inviabilizaram a operação.
Iracemápolis é o segundo fracasso da marca. O primeiro foi com o Classe A em Juiz de Fora, produzido de 1999 a 2005 apenas. Produziu 70 mil unidades em seis anos — esperava esse volume por ano.A fábrica tornou-se um elefante branco e os alemães decidiram substituir o Classe A pelo Classe C para exportação. Depois passou a fabricar caminhões e agora, só cabines.
Audi também tentou duas vezes
A Audi repetiu os dois fracassos da Mercedes:
1- Associada com a Volkswagen, construiu uma fábrica em São José dos Pinhais , PR para dividir a produção do A3 hatch com o VW Golf. O carro da Audi durou apenas sete anos, de 1999 a 2006.
2- Em 2016, com o estímulo do Inovar-Auto, voltou a produzir na mesma fábrica. Desta vez, o A3 sedã e o seve Q3.
Volume de mercado e custos inviabilizaram o empreendimento e a Audi está prestes a encerrar novamente a produção local. O Q3 deu adeus no final de 2019 (o novo modelo já chega importado). O A3 sedã terá mesmo destino, pois deixa este mês de ser produzido por aqui e a nova geração virá da Europa.
A empresa não anuncia — ao contrário da Mercedes — que encerra definitivamente a produção local, mas “analisa possibilidades”. E argumenta que a matriz está insatisfeita com a postura do governo brasileiro e não aprova mais investimentos aqui, pois leva um calote de mais de R$ 100 milhões (relativos aos incentivos) dos cofres públicos. Cansou da “caveira de burro” e vai manter apenas a importação de automóveis.
Inglesa e alemã vão bem, obrigado
A BMW, aparentemente mais hábil que as outras germânicas, driblou empecilhos, investiu numa fábrica em Araquari, SC. onde produz vários modelos de utilitários (linha X) e o sedã 320i e conquistou a liderança do segmento premium. Enquanto as outras duas alemãs se retiram de mala e cuia, ela continua firme e forte em sua operação brasileira.
A Jaguar Land Rover se instalou em Itatiaia, no interior do estado do Rio de Janeiro, próximo a Resende Operação bem mais modesta, ela monta hoje, após passar pelos percalços pandêmicos, o Discovery Sport. Discreta (sob todos os aspectos), diz que “o compromisso e estratégia da Jaguar Land Rover no mercado brasileiro é de longo prazo”.
Volvo cortou o mal pela raiz
O anúncio do Inovar-Auto entusiasmou executivos de algumas marcas premium, mas o suecos da Volvo foram mais cautelosos e parecem conhecer melhor o Brasil. Depois de debruçarem meses em cálculos, simulações e projeções, concluíram pela inviabilidade de investir numa operação industrial, mesmo abrindo mão dos incentivos oferecidos pelo governo federal. E continuaram importando seus automóveis, pois concluíram que:
- A demanda do mercado doméstico seria insuficiente para viabilizar a operação;
- O “Custo Brasil” inviabilizaria exportar parte da produção;
- A instabilidade da economia brasileira não inspirou confiança da matriz.
A estratégia dos suecos (leia-se chineses da Geely, sua proprietária) revelou-se adequada ao país, pois depois de alguns anos amargando um quarto lugar no ranking dos importados premium (à frente somente da Jaguar Land Rover), a Volvo alcançou este ano o segundo lugar em vendas, atrás da BMW, mas à frente da Mercedes e Audi.
BF
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
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