Foi num fim de semana, nos idos de 1974, que fomos passar na praia, em Bertioga, litoral sul de São Paulo, e ficamos hospedados no Hotel Balsa, que eu não sei se ainda existe, ao lado do Sesc. Viajamos no nosso Corcel laranja Mandarim, todo pomposo, ainda com cheiro de carro novo.

A Bete, minha esposa, adorava o Corcel, bonito, econômico, com boa dirigibilidade e excelente dinâmica das suspensões em conforto e estabilidade. A queixa era a posição de dirigir muito baixa, prejudicando a visão frontal. Baixinha, ela ficava afundada no banco que, na época, não tinha regulagem de altura.

E foi quando aconteceu um amor à primeira vista: um casal chegou para se hospedar no hotel com um Brasília vermelho, que chamou a atenção da Bete. Ficava me perguntando, você viu que carro pequeno lindinho? E eu respondia, é Volkswagen, projetado e construído no Brasil, na fábrica em São Bernardo do Campo.
Com grande área envidraçada e bancos mais altos, permitia acomodar a Bete com todo conforto em sua posição de dirigir. Encurtando a história, a Bete se tornou proprietária de um Brasília azul comprado na tradicional revenda VW Marcas Famosas. Lembro-me que o modelo já incorporava a dupla carburação como item opcional, resultando em bom desempenho no tráfego urbano de São Paulo.
O Brasília, projeto de Márcio Piancastelli, já falecido, mostra claramente a alma do artista em suas linhas absolutas.
E não ficou por aí. O gosto alemão da Bete nos fez conviver com outros dois Brasílias, um verde Pampa e outro, marrom Saveiro, este último com interior monocromático, modelo 1979. Na realidade os veículos VW eram simples de manutenção e duráveis também, mantendo bom valor de revenda, o que ajudava nos negócios, mantendo as finanças equilibradas.
O último gosto alemão da Bete foi um VW Voyage 1982 azul marinho, que substituiu o Brasília guerreiro. Na realidade o Voyage podia ser considerado um Audi com emblema Volkswagen. Sendo sincero, este veículo fez meu coração oval ficar mais arredondado.

Como eu trabalhava na Ford e utilizava veículos da marca, não me importava em dividir a garagem. Minha vida de engenheiro era facilitada por ter veículos Ford disponíveis por uma noite e nos fins de semana, parte do meu trabalho de análise e identificação de problemas incluindo os de qualidade e potenciais defeitos de campo.
E em 1984 a Ford lançou no Brasil o Escort, produto mundial de primeira linha, marcando o início de um sistema veicular, moderno e eficiente, levando em conta a resistência ao ar, a economia de combustível, a segurança e a estabilidade direcional.

E a Bete voltou para o Oval Azul, dirigindo um Escort Ghia novinho em folha, equipado com faróis de longo alcance e rodas trevo do Escort XR3. Fiquei feliz que o Oval se manteve durante bons anos na garagem de nossa casa, sem concorrência.
Mas, como tudo que é bom dura pouco, chegou um novo concorrente para o Oval, um Renault Twingo modelo 1994, francês de boa cepa, que caiu no gosto da Bete e, por tabela, da nossa única filha Adriana. E nossa garagem voltou a dividir espaço com a concorrência, com este francês de qualidade, que conservo até hoje, original de fabrica, pintura, estofamento e mecânica, impecáveis.
Aqui entre nós, quem projetou o Twingo esqueceu a fórmula ou, no caso, a Anne Asensio, que deixou a Renault e foi para a GM. O Twingo nasceu muito além de seu tempo, em 1993, e ainda é atual.


Conservo o “meu pequeno Twingo” como homenagem à minha querida esposa Bete que certamente está em companhia dos anjos no Céu.
CM