Era mais um trabalho rotineiro, em janeiro de 2011. Na realidade, era um trabalho bem legal: estava indo para a Califórnia, na região de San Diego, onde conheceria e poderia testar o que, na época, era uma grande novidade da Mercedes, o novo CLS 63 AMG, um belíssimo sedã quatro-portas com traseira coupé e equipado com um motor V-8 biturbo de 557 cv e mais de 81 m·kgf , tudo isso acoplado a um câmbio automático de 7 marchas com opção de trocas manuais. Uma fera de quase 5 metros de comprimento e duas toneladas, mas que, graças a potência e torque da sua usina de força, parecia leve como uma pena para quem conduzia atrás do volante. Uma verdadeira fera, que já na época custava a bagatela de R$ 450 mil.
Um grupo bem reduzido de jornalistas (não me recordo se eram cinco ou seis), compunha essa seleta turma de profissionais que cobriria o tal lançamento. Como sempre tive muita afinidade com Emílio Camanzi, logo fiz uma dupla com ele para o test drive do bólido alemão. Emílio, na época, tinha um programa de TV no canal SBT que se chamava “Vrum”, e, além das avaliações cotidianas de carros normais (que eu também fazia para a revista Motor Show), Camanzi deveria gravar algumas imagens para o seu programa televisivo.
Estávamos na Califórnia, e as capturas, tanto de fotos quanto de vídeos, eram excelentes, disso não podíamos reclamar: tínhamos nas mãos um belíssimo veículo, e estávamos em um lugar onde, tenho a certeza, todo apaixonado por carros gostaria de estar. E, claro, o então assessor de imprensa da Mercedes-Benz no Brasil era também meu amigo de longa data, o Eduardo Pincigher.
Eu e o Edu, como ele é chamado carinhosamente no meio automobilístico, trabalhamos juntos — mais o Bob Sharp — na área de testes da revista Quatro Rodas durante anos, fomos sócios em algumas empreitadas profissionais e até padrinho de casamento do cara eu fui. Ele optou por passar aquele dia de trabalho conosco, pois também tinha há tempo um relacionamento com Emílio o Camanzi, que, além de jornalista, também foi diretor de comunicação da Fiat no Brasil por muitos anos.
Depois de um dia cansativo de trabalho, eu, Emílio e Edu estávamos passando pelo centro de San Diego, rumo ao hotel que estávamos hospedados. Camanzi dirigia o Mercedes, que era pintado numa linda cor vermelha, enquanto Pincigher ia no banco do passageiro e eu viajava confortavelmente no banco traseiro. Apreciando o visual bacana da avenida por onde passávamos, vi um cavalo-mecânico daqueles Mack, tipicamente americano, incrementado e cheio de cromados, o que me chamou a atenção. Atrelado a ele, um baú com as laterais levantadas e pessoas trabalhando em seu interior. De repente, um choque: os caras estavam guardando lá dentro o Batmóvel!
Imediatamente gritei aos outros dois: “Eu vi o Batmóvel! Vira o carro e volta!”. Emílio e Edu não entenderam nada, e perguntaram do que eu estava falando, aí eu expliquei mais calmamente que vi o carro do Batman dentro de um caminhão, e que precisávamos voltar para ver. Camanzi rapidamente fez um retorno na avenida e voltamos, buscando o caminhão com o tal Batmóvel, apesar da incredulidade dos meus dois amigos. Quando chegamos, lá estava o baú com o carro do “Homem-Morcego” em seu interior.
Emílio Camanzi não perdeu tempo, e já foi descendo do carro com a câmera, fotografando tudo. Era o próprio, aquele carro esquisito que eu via no seriado de televisão quando era adolescente, pintado de preto com detalhes em vermelho, além da enorme turbina na traseira e a placa de Gotham City, com as siglas TP-6597. O carro, que estivera exposto em uma luxuosa loja de automóveis em San Diego (daquelas que só comercializam Porsche, Ferrari, Lamborghini, e outras preciosidades do mundo dos carros), tivera o privilégio de ter o Batmóvel exposto em suas dependências por um mês.
A máquina do Batman e seu fiel escudeiro Robin estava seguindo para outra exposição, agora em um evento no estado da Louisiana, onde seria mostrado para outros milhares de americanos. Só para essa viagem, segundo nos contou o motorista do caminhão que transportaria esse ícone, o Batmóvel estava segurado em 4 milhões de dólares!
O Batmóvel
Construído a partir de um carro-conceito batizado de Lincoln Futura, feito em 1955, o carro foi comprado da Ford (dona da Lincoln) 10 anos depois, quando quase virou sucata, pelo customizador e designer George Barris, para atender uma encomenda dos estúdios da emissora ABC, que iniciaria em 1966 as filmagens do seriado do Batman para a TV. O carro era funcional, e utilizava a mecânica Mercury, com suspensões, freios, direção, motor e um câmbio automático.
Barris, a partir do conceito Futura, praticamente refez a frente e traseira, e guardou do modelo original aquela parte central, onde iam os dois protagonistas do seriado, interpretados por Adam West (Batman) e Burt Ward (Robin). Depois de tanta alteração, o Batmóvel original ficou com quase três toneladas, e, claro, desempenho não era o seu forte. Vale ressaltar que foram feitas três réplicas numeradas oficiais do Batmóvel, todas também construídas por George Barris, só que utilizando compósito de fibra de vidro na carroceria e mecânica do Ford LTD, afinal o protótipo do Lincoln Futura era único.
Como curiosidade, vale falar de uma quinta réplica não oficial, que era chamada pelos fãs de “Batmóvel pirata”. Ela foi proibida de ser exibida, e, por direitos legais de patente, foi entregue a Barris, que fez algumas melhorias no carro e o vendeu por 150 mil dólares no final da década de 1980. Infelizmente para os fãs do herói Batman, nosso eterno Adam West partiu deste mundo em meados de 2017, e o customizador George Barris também não está mais entre nós desde 2015. Burt Ward, o Robin, ainda é vivo, hoje com 75 anos (o Garoto-Prodígio se transformou em um Velho-Prodígio). O encontro com esse lendário automóvel da TV foi marcante para aqueles três profissionais de jornalismo, que tiveram a satisfação de ouvir o ronco do ruidoso motor V-8, ligado pelo motorista do caminhão especialmente para nós. Uma satisfação que jamais poderia imaginar receber, um presente inestimável!
DM
A coluna “Perfume de carro” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
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