Dizer que o SUV é o futuro do mercado já é chover no molhado. O gráfico abaixo dá uma boa ideia da temperatura dessa febre que contagiou o país. Decidi somar a participação nas vendas dos dois segmentos que têm os automóveis mais baratos (hatches compactos e modelos de entrada) e comparei com os suves. Dê uma olhada abaixo e tire sua conclusão.
Fica claro que os suves não param de crescer ano a ano, enquanto os hatches perdem lentamente a participação do mercado. O fato é ainda mais impressionante porque esse domínio ocorre mesmo sendo os suves bem mais caros. Os cinco primeiros da categoria (Renegade, T-Cross, Compass, Tracker e Creta) não custam menos que R$ 82.000. Já o segmento de entrada começa em R$ 41.800 (Renault Kwid).
Com tamanha discrepância de preço, a pergunta que fica é: quanto tempo a linha do gráfico dos suves vai levar para ultrapassar a dos hatches? A resposta pode estar nos minissuves, modelos com menos de 4 metros de comprimento que estão para chegar ao Brasil e já se revelaram um sucesso de vendas lá fora.
A história desse êxito comercial começou na Índia, num cenário que lembra o surgimento do carro popular brasileiro nos anos 90. Para reduzir os congestionamentos nas cidades, o governo indiano teve a ideia de diminuir o imposto para carros com menos de 4 metros e motor a gasolina abaixo de 1.200 cm³ ou motor a diesel abaixo de 1.500 cm³.
Foi questão de tempo até surgir uma onda de suves pequenos e baratos projetados especialmente para esse fim. A resposta do público não podia ser melhor: no início de 2020 havia seis concorrentes, hoje existem dez e até o fim do ano vão estrear mais sete.
Os lançamentos mais bem-sucedidos comemoram as longas filas de interessados. Um deles é o Nissan Magnite (foto de abertura): lançado em dezembro, ele chegou a oito meses de espera. Pois é justamente esse suve popular que será fabricado no Brasil no ano que vem.
Feito sobre a base do Kwid (Renault e Nissan pertencem ao mesmo grupo), o Magnite ocupará o lugar do March, como revelou o site Motor1. E isso deve abrir caminho para o Renault Kiger, também produzido nessa mesma plataforma.
O Hyundai Venue é outro que causou um alvoroço entre os indianos: mais de 50.000 pedidos em dois meses. Chamado pela imprensa brasileira de mini-Creta, ele tem a vantagem de já nascer como um produto global: é produzido também na Coreia do Sul, de onde é exportado para os EUA e com planos de ser vendido na Argentina.
O poder de sedução desses carros está não apenas no seu preço convidativo, mas também no projeto bem resolvido, que alia o design que se espera de um suve com espaço adequado à proposta. O Magnite e Kiger têm 3,99 metros, o que o colocaria entre um HB20 (3,94 m) e um Onix (4,16 m), além de um porta-malas de 406 litros no caso do Renault, bem mais do que os 290 litros do Kwid que lhe deu origem.
Quanto ao preço, os minissuves são extremamente baratos na Ìndia: o Magnite custa 42% menos que um Kicks e o Kiger fica 43% abaixo do Duster. Se aplicados esses números ao Brasil, isso daria incríveis R$ 52.400 e R$ 47.300, respectivamente.
Mas calma lá: ambos não teriam no Brasil o mesmo benefício da redução fiscal que têm na Índia, onde seu imposto cai de 20% para 8%. Ainda assim, bastaria um preço a partir de R$ 65.000 para essa dupla fazer um belo estrago na concorrência.
E mais do que aumentar a fatia do bolo que os suves têm no país, o minissuve teria outra vantagem, essa ainda benéfica para nossa indústria: trazer novos compradores para o segmento de zero-km e aumentar o tamanho desse bolo, pois o mercado brasileiro diminuiu com a crise dos últimos anos. Se em 2015 os brasileiros compraram 2,6 milhões de veículos, em 2020 ficamos em apenas 2 milhões. Lembrando que o recorde é de 3,8 milhões em 2012.
A vantagem desses suves populares é que não são improvisos mercadológicos (como foram os aventureiros urbanos nos anos 2000) nem jogadas de marketing que frustram o interessado na hora da compra, como ocorreu com o Kwid que usou o slogan “o suve dos compactos” e fez muita gente desistir do negócio ao ver o carro na loja.
Como nasceram para cativar quem busca um utilitário esporte e não pode arcar com os preços praticados atualmente, os suves populares têm o potencial de conquistar um público que hoje está órfão e sonha entrar nessa febre. Se eles vierem em peso, pode se preparar: o céu é o limite para aquela linha do gráfico dos suves.
ZC
A coluna “Panorama” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.