A foto de abertura é de Jackie Stewart no seu Tyrrell de F-1, mas o motivo você vai entender mais abaixo.
Sempre digo que quanto mais suaves formos com os comandos do automóvel, melhor para o comportamento do carro e para quem está a bordo. Curiosamente, aprendi isso cedo, e não foi com automóvel, mas com avião, no curso de pilotagem. Um dos meus instrutores, Salo Roth, descendente de alemães, parecia um piloto da Luftwaffe, a Força Aérea Alemã. Ele me passou a noção de suavidade ao pilotar, ao ponto de fazer loopings com o Neiva P56, que não era avião homologado para acrobacias. E fazíamos três loopings emendando um no outro.
Era possível porque ele iniciava a puxada do manche para trás para iniciar o looping com absoluta suavidade. Ele tinha noção de que uma puxada mais forte poderia ocasionar o colapso da asas devido à força G elevada. Ele segurava o manche com os dedos! Acelerava o motor sem golpear o manete. Eu, com 21 anos, logo entendi tudo aquilo e incorporei ao meu jeito de dirigir.
Dois anos depois vi que o chefe de competições da Vemag, o saudoso Jorge Lettry, também tinha esse jeito dirigir. Nos treinos da equipe vez por outra ele pilotava os DKW de corrida, e era mais rápido do que seus pilotos.
Um grande amigo, José Carlos Ramos, com quem corri diversas vezes de Opala na década de 1970, me mandou ontem um vídeo, uma conversa de Jackie Stewart, ainda com 31 anos, trecho de um documentário de Roman Polanski. Estavam em Mônaco para o Grande Prêmio em 23 de maio de 1971, o escocês sem camisa no quarto do hotel tomando seu café da manhã, numa conversa bem solta e informal com um jornalista. Jackie já era campeão mundial (1969) e caminhava para o segundo título naquele ano, inclusive venceu aquele GP.
O vídeo é curto, só 2min44s, mas é de uma riqueza ímpar, uma verdadeira e brilhante aula de pilotagem tendo como recursos visuais riscos na toalha representado uma curva e um pacotinho de queijo fundido como carro.
Jackie frisou a importância de dirigir, no caso pilotar, com suavidade, jamais “brigar” com o carro, e como é fundamental para isso usar o acelerador sem golpeá-lo. Pedal de freio é para ser pressionado, e não apertado, bem como tirar o pé do pedal jamais ser um movimento abrupto — todas medidas para não “perturbar” o carro.
Na “curva” na toalha mostrou a linha ideal do “carro”, onde levantar o pé do acelerador e começar a pressionar o pedal de freio e onde soltá-lo — com suavidade. Onde começar a dar potência de novo. No ponto de tangência interno, evitar subir na lavadeira.
Jackie não esqueceria de mencionar o piloto mais suave que o mundo já conheceu, o argentino Juan Manuel Fangio, “que não parecia que estava competindo”.
Assista ao vídeo:
Fora todos os benefícios de se dirigir suavemente, até no calor de uma disputa na pista, há outro; tratar bem o seu passageiro. Igualmente importante é iniciar o percurso em velocidade moderada e ir aumentando-a aos poucos, maneira de o passageiro ficar e se manter calmo mesmo que se imprima um ritmo de viagem mas elevado.
Seis anos atrás publiquei a matéria “Veloz (muito), mas nada de furioso“, na qual relato uma experiência como passageiro numa viagem bem rápida que teve como motorista um engenheiro da PSA, Cláudio Lobão, Vale a pena ler ou reler.
Jackie Stewart, tricampeão mundial (1969, 1971 e 1973) está com 82 anos. Tê-lo entre nós é uma alegria. Seus conselhos e opiniões sobre pilotagem são valiosos, como aquele que diz “se o piloto disser que rodou na curva porque a marcha não entrou, rodaria de qualquer maneira, pois estava rápido demais.” Ou a minha preferida, “não importa o quão rápido você esteja, se você estiver senhor do carro tudo se passa como se fosse em câmera lenta.”
BS