Uma das poucos fotos disponíveis do Fusca de Albert Kleiin, quando novo,. é a de abertura. Ella está um pouco deformada, pois como eu havia comentado na Parte 1 o material que consegui encontrar sobre estes primeiros 800.000 quilômetros, cópias Xerox de um capítulo do livro “Complete Volkswagen Book”, foi na forma de fotos de páginas onduladas. Mas acho que dá para ver bem como este Fusca era no início de sua jornada de 27 anos. Um detalhe interessante é o uso de faróis do tipo “sealed beam”, exigência das normas americanas, em vez da versão com lâmpada e refletor.
Esta Parte 2 começa com a continuação do relato iniciado na Parte 1.
O Fusca de 800.000 quilômetros – conclusão
“Há muitos Volkswagens circulando, mas bem poucos com 800.000 quilômetros rodados. Estou começando a perceber seu valor real”, disse Klein. Ele disse que não compraria outro carro a não ser que seu VW “atual” sofresse outro acidente. Pelo menos o clima foi removido da lista de perigo, pois Klein credita isto ao ar seco do sul da Califórnia. Sua experiência com o sal nas estradas geladas do inverno de Toronto o fez apreciar o clima ameno em que ele agora vive.
“Se eu ainda estivesse morando em Toronto, não sobraria nada do Volkswagen, devido à ferrugem extensa”, acrescentou.
A história específica de Klein sobre seu Fusca de 800.000 quilômetros tem seu próprio tom de bravura e se desdobra como testemunho vivo de quase uma geração de feitos incomuns deste Beetle de Wolfsburg.
De volta à estrada, ou “Enquanto isso, de volta à estrada”, Klein atravessou os EUA. várias vezes com seu Fusca 63, mais a ida ao Alasca, — um teste para os nervos —, uma incursão sul-americana, e viagens frequentes ao México e à Baja Califórnia.
Para desfrutar, ele vai pela estrada mais difícil que puder pegar, já que agora se sabe que um Fusca devidamente ajustado, é um dos carros mais confortáveis do mundo em estradas secundárias ou de piso irregular.
“Uma vez, enquanto dirigia de Mazatlan para Durango, eu passei muito rápido sobre uma passagem de nível ferroviária, e tive um pneu furado por um pino de dormente que estava saliente”. Estes pinos de dormente têm esse mau hábito especialmente no México, onde as coisas nem sempre estão devidamente sinalizadas.”
Klein gosta particularmente do México e admite ter ultrapassado bastante suas fronteiras. “Eu passei quase 24.000 quilômetros rodando por todo o México. Provavelmente não há uma única cidade de tamanho maior que eu não tenha visitado — da fronteira norte aos dois oceanos. Em outras palavras, da costa oeste à península de Yucatán,” disse ele.
Em todas essas viagens, ele nunca teve algum problema que remotamente lembrasse uma emergência mecânica. As avarias, se é que podem ser chamadas assim num carro com mais de 800.000 km, ocorreram entre 5 e 15 quilômetros de sua casa.
“Por exemplo, na primavera de 1976, eu estava voltando do trabalho para casa e, na rodovia, a cerca de 3 quilômetros de casa, a válvula de escapamento do terceiro cilindro quebrou. O motor estava com cerca de145.000 quilômetros.”
“Em outra ocasião, eu estava morando em Toronto, e o primeiro VW estava com cerca de 182.000 quilômetros quando a válvula de escapamento do terceiro cilindro quebrou novamente. Eu fui lentamente para casa e tive sorte. Numa terceira vez, a sede da válvula do terceiro cilindro três se soltou e o estrago no cilindro foi grande.”
“Ainda com o primeiro VW tive um problema com a engrenagem da árvore de comando de válvulas. Ela era feita de plástico, e o material não durava muito. Depois de cerca de 100.000 quilômetros os dentes acabaram”.
Os certificados
O interessante de entrar na mística da propriedade de um Volkswagen desde o início, como Klein fez, foram os certificados que eram dados pela fábrica.
“Logo no início, o VW deu relógios de ouro. Depois de 100.000 quilômetros, sem grandes reparos, você preenchia um formulário de solicitação. Recebi um relógio para o primeiro VW um e outro para o segundo. A fábrica depois mudou para medalhões azuis e dourados (com a imagem de São Cristóvão — para enfeitar o painel do carro), o programa de relógios deve ter ficado muito caro. Em seguida, deram alfinetes para gravata, até que finalmente encerraram o programa. Acho que eles estavam dando prêmios demais. O Fusca era, provavelmente, um carro de vida mais longa do que eles imaginaram inicialmente”.
Respeitando o “fôlego” do Fusca
Ao contrário de muitas outras marcas, os VW com alta quilometragem têm um desempenho tão bom quanto aqueles que mal saíram da loja, desde que tenham recebido o mínimo de cuidado. Klein, por exemplo, não teve dúvidas em dirigir seu Fusca 63 até Cabo San Luca, na base da península de Baja, quando o carro tinha 756.000 quilômetros.
A maioria dos proprietários ponderados hesitaria antes de dirigir seu carro com essa quilometragem até 30 quilômetros de casa. De certa forma, a abordagem de Klein transcende a confiabilidade básica do Fusca e fica mais alinhada com uma filosofia compartilhada por caminhoneiros e outros profissionais de alta quilometragem. que é: Se você mantiver algo bem, não há limite para o que você pode fazer com isso.
Klein repetiu que ele dirige “com muito mais cuidado ao percorrer longas distâncias, e atribui isso à “fé absoluta que ele tem em seu veículo”. Ele, no entanto, adicionou algumas dicas para ajudá-lo a ter uma sensação de segurança com seu Fusca de 840.000 quilômetros.
“Uma coisa que eu descobri é que um VW fica melhor se você instalar um termômetro do óleo, um manômetro do óleo e um filtro de óleo externo. Um radiador de óleo externo me deu uma capacidade adicional de arrefecimento de 11 a 15% — mas você tem que lembrar que em clima de 43 ºC, a temperatura do óleo vai atingir 120 ºC de qualquer maneira com ou sem um radiador externo. Sua melhor aposta em tempo muito quente é aliviar o acelerador e passar para uma marcha mais baixa para aumentar a rotação da turbina de arrefecimento. Você pode ter que dirigir a 80 km/h em vez de 110 km/h, por exemplo, e manter a rotação mais alta. Sua temperatura do óleo pode ficar em 120 ºC, mas pelo menos não vai subir mais do que isso. Com maiores temperaturas de óleo é que válvulas começam a ter problemas, juntamente com partidas difíceis e todo o resto. Na maioria das vezes, dirigindo pela cidade, 80 ºC é quase normal. Mas eu definitivamente acho que um motorista cuidadoso pode usar um sedã de fábrica sem precisar adicionar um radiador de óleo externo.”
Klein mencionou as várias vezes em que ele realmente teve que sair da estrada e deixar o motor esfriar, em algumas das áreas montanhosas mais primitivas que ele visitou. Ele classifica esse pouco de prudência como muito importante para a longevidade de um motor VW.
Klein, que lê regularmente publicações automobilísticas alemãs, observou o que chama de “várias queixas importantes sobre o VW Golf”, embora reconheça a enorme atenção da engenharia que desde então foi direcionada ao sucessor do Fusca.
Mas ele avalia alto a capacidade do dono do carro de ter fé em sua posse. Em uma frase muito ouvida, Klein disse: “Com o VW Fusca, tudo foi provado… mais ou menos.” Essa última revelação coloca muito do sucesso da longevidade diretamente sobre o ao proprietário. Ressalta também que o sentimento entre aqueles que conhecem aqueles novos designs badalados; e a prova consagrada pelo tempo da confiabilidade de um carro, são lados muito diferentes da moeda.
É essa noção que — até os recentes exemplos de carros com injeção de combustível, catalisadores e uso de gasolina sem chumbo — colocaram o VW Beetle como o melhor carro do mundo, pelo preço, sem exceção. De certa forma, Klein está entre os últimos redutos para essa tese. Ao contrário de outros, que se concentram somente em palavras de louvor, Klein fez uma forte tentativa de provar isso. Mesmo que um “Half-Million Mile Club” — Clube dos que já percorreram meio milhão de milhas — internacional listasse sem dúvida, alguns membros automobilísticos muito intrigantes, não seria ilógico supor que uma alta porcentagem deles seria de Volkswagen Beetle.
No entanto, nenhuma máquina é perfeita com o passar do tempo, portanto, os problemas continuarão a entrar no registro de longevidade de Klein. Mas, como ele disse: “Não há substituto para a grande satisfação de um proprietário de carro do que conhecer a história particular de cada parte dele.”
Recentemente soltou-se o pino que prende a haste pedal de freio-cilindro-mestre ao pedal. As coisas têm um coeficiente de fadiga, mas também há coisas notáveis no Besouro de Klein.
O carro ainda tem as barras de torção e componentes de suspensão originais. Algumas buchas de suspensão foram substituídas, outras não. Toda a carroceria é original, com exceção de certos para-lamas e uma das portas que foram amassadas em batidas. Mas o carro nunca foi acidentado seriamente. O interior é original, e o mais notável é que os materiais particulares de vinil e tapete resistiram aos rigores aos quais foram submetidos.
A pintura interna na porta do motorista foi desgastada até o metal nu, onde o braço de Klein se apoia, mas para ele, essa condição representa orgulho, não negligência.
Negligência é algo que nunca ocorreu, é claro. O câmbio, sujeito às suas tensões peculiares de engrenagens de variados tamanhos que se atritam umas com as outras, exigiu substituição a cada 240.000 quilômetros ou mais. Seu virabrequim atual, retificado com 257.000 quilômetros, tem mais de 483.000 quilômetros. Os cilindros estão com 160.000 quilômetros, e o motor consome 0,5 litro de óleo a cada 1.100 quilômetros. O carburador tem 612.000 km.
“Todos os vidros são originais, embora o para-brisa tenha um marca de pedra, de uma das viagens ao México. Os bancos, como mencionado, são todos originais, exceto por alguns pequenos lugares que Klein costurou. Ele teve três câmbios, cada um durou cerca de 225.000 quilômetros. Seu câmbio atual, no entanto, foi comprado com o transeixo num ferro-velho por 75 dólares, tem mais de 290.000 quilômetros nele. O que mais você deseja saber? Deutschland Über Alles. Ou: Os besouros são o sal da terra. Todos os proprietários de VW Golf, por favor, tomem nota.”
A festa do milhão de milhas na concessionária original
Em julho de 1987, quando Klein atingiu a marca do milhão de milhas (1,609 milhão quilômetros rodados) ele e seu carro foram homenageados numa festa na concessionária de Pasadena, onde em 1963 ele comprou o carro — completo com estofamento de material que imita couro e o retrovisor externo opcional de US$ 5 — por US$ 1.897,71.
Entre os presentes estavam o prefeito de Pasadena, John Crowley, executivos da Volkswagen, uma banda de cinco integrantes e um pequeno exército de repórteres.
O jornalista Ashley Dunn, do jornal Los Angeles Times, comentou: “em uma era de fraldas e lâminas descartáveis, Albert Klein manteve-se ao lado de seu Volkswagen 1963 branco com uma devoção que envergonharia a maioria dos casamentos.”
Naquela época os para-lamas do carro já estavam amassados, o estofamento estava desgastado, e a pintura estava descascando e desbotada. Mas a única coisa que todos podiam dizer sobre este humilde Fusca é que ele andava, andava e… andava.
Em 14 de julho de 1987, após 24 anos, sete motores, três câmbios, 150 pneus, 162.000 litros de gasolina, três conjuntos de palhetas de limpador de para-brisa e mais de US$ 38.000 em custos de manutenção, o fiel Besouro do homem de Pasadena completou sua milionésima milha.
“Se você tem um bom amigo, pode confiar nele 100%”, disse Klein. “É o mesmo com este carro.”
Perante o público presente, Klein disse que esperava quebrar o recorde mundial de quilometragem em um carro, que era reivindicado pela Mercedes-Benz para um modelo 180 D de 1957, de propriedade de Robert O’Reilly de Olympia, Washington, que rodou 1,18 milhões de milhas — 1,90 milhão de quilômetros.
“Mais 180.000 milhas”, disse Klein. “Digo que isto é café pequeno.”
Klein, um arquiteto, então com 65 anos, da empresa Langdon Wilson Mumper, de Los Angeles, disse que não tinha planejado manter o carro por tanto tempo. Mas com sua sede de viajar e atravessar as autoestradas de Los Angeles, as milhas continuaram somando e, por volta de 500.000, ele começou a pensar em que “o céu era o limite”.
Para atingir um milhão de milhas, Klein percorreu em média mais de 64.000 km por ano. O trajeto de sua casa ao seu escritório no centro de Los Angeles era de 17 milhas — 27 km em cada sentido. Mas ele disse que geralmente tomava um caminho sinuoso para casa, muitas vezes dirigindo cerca de 80 milhas — 130 quilômetros fora de seu caminho apenas por diversão.
Klein disse que tinha paixão por dirigir, era um momento de ficar “sozinho com seus pensamentos”.
Além disso, Klein disse que dirigiu o carro por toda a América do Norte, Central com incursões à América do Sul. Embora provavelmente existam outros carros com um milhão de milhas, o que torna a conquista de Klein tão incomum foi o meticuloso “diário” que ele manteve no veículo.
Naqueles últimos 24 anos, Klein registrou cada litro de gasolina, cada litro de óleo e cada vela de ignição que foi colocada no carro.
“Sou daquela parte da Alemanha onde as pessoas são extremamente detalhistas”, disse o nativo de Stuttgart. “Pergunte a qualquer alemão, que eles dirão a mesma coisa.”
Como parte da comemoração de um milhão de milhas na concessionária Trans Ocean Motors, a Volkswagen presenteou Klein com um novo sedã Fox de quatro portas, no valor de US$ 8.000.
Mas Klein, que já teve outros dois Volkswagen Beetle, modelos de 1954 e 1960, disse que não aceitaria o carro até quebrar o recorde, o que provavelmente levaria mais quatro ou cinco anos.
Quando isto ocorrer, disse ele, tristemente entregaria seu Fusca ao Museu Volkswagen em Wolfsburg, Alemanha, e então começaria tudo de novo com um Fox, que a Volkswagen chamava de “o Besouro dos anos 80 e mais além”.
“Este carro é meu hobby número um”, disse Klein. “Acho que sou apenas um super-realizador quando se trata de coisas que são importantes para mim.”
E como foi que esta história acabou?
Klein continuou a usar seu carro por mais dez anos e atingiu 1’613.281 milhas, ou 2,6 milhões de quilômetros em números redondos, e o recorde daquele Mercedes Benz foi de 1’180.000 milhas, 1,90 milhão de quilômetros, donde Klein conseguiu seu intento e assumiu este recorde.
Mas aí a história ficou meio incerta, havia publicações dizendo que o carro tinha sido entregue ao AutoMuseum Volkswagen de Wolfsburg, mas eu não obtive uma confirmação disto. E em minhas duas visitas a aquele museu eu não vi nem este carro nem uma referência a ele nas publicações do museu.
Mas, enfim, no contexto das pesquisas atuais eu encontrei uma citação feita pelo sobrinho-neto da Ingue Kühl, que foi a companheira de muitos anos do Albert Klein, se bem que eles não chegaram a casar. Esta citação foi feita num tópico do fórum The Samba, que tratava exatamente sobre o Fusca do Klein: “Albert Klein’s record Beetle” – O Fusca recordista de Albert Klein. Lá esta pessoa se identificou como EverettB, sem informar seu nome real, vou chamá-lo de Everett.
O Everett, que viu exatamente o questionamento no fórum sobre qual teria sido o fim do Fusca do Klein, escreveu o seguinte: De acordo com o registrado no Livro Guinness, edição de 1998, o “Old Faithful” — o Velho Fiel — deu perda total em um acidente ocorrido em 29 de março de 1997.
Aliás, com tantos quilômetros percorridos a probabilidade estatística deste carro ter sofrido um acidente grave já estava madura há muito tempo…
E com esta informação cessam as informações existentes sobre Klein, que hoje teria 100 anos, e seu carro. Fato é que esta história incrível não se perdeu e seu registro é uma homenagem ao obstinado Albert Klein e a seu amigo de tantos anos o “Old Faithfull”.
Para dar uma noção melhor de donde eu retirei a foto de abertura desta Parte 2 e mostrar o porquê das deformações na foto, eu reproduzo a primeira página do capítulo que se chama: “500,000 Thousand Mile VW Beetle” — O Fusca de 500.000 milhas, do livro “Complete Volkswagen Book”, assim como eu a encontrei no acima citado tópico do fórum The Samba, publicado assim deitado:
AG
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