Minha primeira participação num rali de regularidade foi na década de 1980, época em que o revendedor de pneus Hermes Macedo patrocinava o Rali Universitário, dando nome a uma prova que era muito procurada pelos jovens universitários, ou não. Os pilotos profissionais passavam longe e mesmo assim chegava a haver quase 300 carros nas largadas.
Era uma época em que a navegação era feita apenas com cronômetro e calculadora. Alguns utilizavam as máquinas de calcular mecânica Facit e outros, já mais avançados, lançavam mãos das calculadoras eletrônicas e programáveis da Texas Instruments e HP. Para quem não sabe, o computador só se tornou pessoal no final dos anos 80, e os notebooks vieram depois.
Mas isso tudo é passado e o rali de regularidade para veículos clássicos passou a se tornar uma realidade dentro do mundo dos antigomobilistas já há algum tempo. É um momento para rever os amigos e tirar os carros antigos da garagem.
O ex-piloto Jan Balder organizava no Autódromo de Interlagos ralis de regularidade em que cada competidor determinava seu próprio ritmo. Participei de um utilizando a “receita mágica” do Bob Sharp: carros de motor 1-litro de aspiração atmosférica podem ser exigidos ao máximo, como se fosse uma prova de velocidade, e mesmo assim não rodar em tempo inferior ao mínimo estabelecido no regulamento, o que é proibido. Corri com um Argo Drive 1,0 de teste, com a necessária autorização da fabricante, e foi diversão pura!
O Rally de Clássicos realizado no último sábado em São Paulo consolida a retomada deste tipo de evento no pós-pandemia. Foram 119 carros de todas as marcas, modelos, versões e motorização saindo do Centro de Tradições Nordestinas (CTN) na zona norte de São Paulo, em direção ao Autódromo Capuava em Indaiatuba, onde acontecia no mesmo dia o trackday da MotorFast. O roteiro contemplava a passagem pelas cidades de Jundiai, Itu, Salto, Capivari, finalizando na Fazenda Capuava.
O roteiro escolhido tinha apenas 920 metros de piso não pavimentado, e os demais 210 km foram feitos por asfalto, na maior parte do percurso em boas condições. Mas as dificuldades do rali de regularidade não vêm do pavimento, e sim nas variações de velocidade média que são impostas, e na topografia com subidas, descidas e curvas fechadas, onde invariavelmente a média horária é afetada, e se o piloto e navegador não estiverem bem entrosados a chance de se atrasar é bem grande.
A direção da prova divulga o roteiro na véspera e esconde dos participantes onde estarão os Postos de Controle (PCs), portanto é necessário estar sempre dentro da média horária, caso contrário a cada segundo atrasado ou adiantado perde-se 10 pontos. No passado os PCs ficavam na beira da pista, sempre escondidos. Com o advento da tecnologia, atualmente os PCs são determinados virtualmente e carregados em um GPS que é instalado nos carros. A cada passagem pela coordenada determinada fica registrado o horário. Ao final do rali os equipamentos são recolhidos e todas informações coletadas são processadas, saindo assim o resultado final e desempenho individual de cada participante.
O AE no rali
O nosso carro foi o Kadett GSi 1993 conversível totalmente original que recebeu o número 97 e fui acompanhado de Antônio Nunes Júnior, um amigo de longa data e que costuma colaborar no AE com fotos em algumas matérias.
A nossa categoria foi a dos Clássicos — fabricação entre 1981 e 1993 — na qual eram 33 carros inscritos. A navegação foi feita primordialmente pela planilha impressa distribuída pela organização da prova, e pelo computador de bordo do carro para a velocidade média.
O aplicativo Rabbit para navegação em rali foi instalado em um dos celulares que tínhamos a bordo e foi carregado com o arquivo da rota enviado pela organização da prova. Como nosso conhecimento do aplicativo era muito limitado e não tivemos oportunidade de fazer nenhum treino, a decisão foi utiliza-lo como reserva apenas, e seguir o roteiro pela planilha e cronometro de mão.
Já na saída do local da largada promocional, a inexperiência e desconhecimento da região nos desviou da rota e chegamos ao ponto de início do primeiro trecho cronometrado com atraso de 3 minutos. Para nossa sorte não havia muitos PCs no início desse trecho cronometrado e a velocidade média era relativamente baixa 70-80 km/h para a rodovia dos Bandeirantes, portanto ao andar a 120 km/h foi possível recuperar o tempo perdido rapidamente.
Antes do início do primeiro trecho cronometrado são informados alguns marcos quilométricos para aferição de hodômetros e aplicativos, mas em função do nosso atraso tivemos que pular essa etapa, um erro circunstancial que nos custou muitos pontos.
A planilha indica hh:mm:ss (hora, minuto e segundo) que devemos passar por cada ponto de referência, seja esse uma lombada (muitas no percurso), cruzamento, curva, placa de sinalização etc., com isso é possível corrigir o tempo adiantado ou atrasado para perder o menor número de pontos possível. Mas nesse caso é sempre uma correção atrasada, o que não é o melhor quando os participantes são muito experientes.
No final da prova a organização divulgou o resultado individualizado mostrando como foi o desempenho de cada participante ao longo da prova. Entre os 96 PCs distribuídos nos 211 km do trajeto, a nossa dupla estava em 8º lugar no PC #73, já recuperados de todo atraso inicial e acertando o passo. Em vários PCs o nosso tempo de passagem foi exato ou com menos de 1 segundo de erro. Até que chegou um desvio na estrada, uma placa mal colocada, uma planilha que indicava ir para a direita, mas não indicava claramente que na sequência deveríamos tomar a esquerda. Bingo!! Fomos para o lado errado, e nos custou outros 2 minutos de atraso que tiveram que ser recuperados com maior pressão no pé direito, fazendo o motor 2,0 MPFI do Kadett GSi mostrar sua força.
Ao final da prova, seguindo o regulamento, a organização expurgou 10% das passagens em PCs com atraso, o que nos qualificou para a 13ª posição dentro da nossa categoria de veículos clássicos. Nada mau para uma reestreia em ralis de regularidade depois de 40 anos de inatividade nessa modalidade, com um veículo de 30 anos prestes a receber a placa preta.
Clique nas fotos com o botão esquerdo do mouse para ampliá-las e ler as legendas
Organização impecável
Todo tipo de evento pode ser melhorado, aperfeiçoado, roteiros podem ser desenhados para ficar melhor para um tipo de carro ou outro, o ponto de descanso pode ter melhor estrutura de banheiros, principalmente para as damas. Ou seja, depois da obra pronta, todo mundo sempre pode e deve contribuir com sua crítica, sugestão, e é melhor quando isso é feito positivamente.
O Rally Quadrifoglio correspondente ao Campeonato Brasileiro de Rali foi realizado concomitante ao Rally de Clássicos que é o Campeonato Paulista, portanto a premiação foi duplicada para algumas duplas que estavam inscritas nas duas provas.
E foi justamente isso que assisti no grupo de WhatsApp criado para divulgação e debate entre os participantes desta primeira etapa do Rally de Clássicos. Muitos queriam entender como utilizar melhor os aplicativos para Android (Tottem) e para IOs (Rabbit), outros queriam entender particularidades do regulamento, as ofertas de compra e venda de carros também aparecem por ali, e todo mundo já fazendo planos para a próxima etapa no final de semana de 3 e 4 de junho, na cidade de Dourado, SP. A organização guarda uma surpresa com uma prova especial no domingo. A conferir!
GB