Preâmbulo: nesta matéria não vou entrar nos detalhes do que é: a SCORE, a BAJA 1000 e a sua categoria SCORE Class 11 que é para VW Beetles standard com muito poucas modificações permitidas. Isto tudo está detalhadamente explicado na minha matéria “Fusca 1970 na 50ª Baja 1000”. Agora vou falar de Dennis Hollembeck e de suas ações humanitárias através do esporte, cujo carro, por coincidência, aparece nas fotos de abertura de ambas as matérias.
Correr pela esperança de pessoas necessitadas? Isso muda tudo, até mesmo o significado das corridas off-road em si. É definitivamente algo incomum nesta categoria de competições.
Vamos falar de Dennis Hollenbeck, um missionário cristão que nasceu no Texas, mas a vida o enviou para o sul da Califórnia ainda jovem. Enquanto trabalhava na UPS (United Parcel Service, empresa privada de entrega de pacotes), Hollenbeck sentiu necessidade de fazer algo diferente, e, durante uma viagem a Baja exercendo o seu trabalho de missionário cristão, descobriu que o lugar que procurava ficava ali mesmo no outro lado da fronteira. “Eles procuravam pessoas e eu procurava um lugar”, lembra ele, e há 25 anos Dennis vive no coração das corridas off-road de Baja Califórnia, no México, na cidade de Ensenada.
Criado no Texas, Dennis adorava ir com seu pai às pistas de corrida, pois era fã de esportes automobilísticos em geral, Nascar, F-1 etc. Então, quando ele soube das corridas de Baja, ficou imediatamente fascinado: “Quando você vai a uma corrida de Baja e se encontra em um leito seco de um rio e vê carros de corrida a toda velocidade a poucos metros de você, como não ficar fascinado?” Dennis continuou: “Tornamo-nos fãs instantaneamente, íamos acampar para assistir às corridas.
Os fins de semana de corrida eram um feriado como o Dia de Ação de Graças”, disse Dennis quando perguntamos como ele entrou no off-road. Lembrando que o Dia de Ação de Graças (Thanksgiving Day), comemorado toda 4ª quinta-feira de novembro, é um dos feriados mais importantes nos EUA.
Isso foi apenas o começo. Já quando morava em Ensenada, Dennis comprou um velho e surrado VW Beetle porque simplesmente não gostava de dirigir sua picape grande pela cidade, ele precisava de algo menor. Um amigo o viu colocando um motor novo no VW Beetle e, em tom de brincadeira, disse a Dennis: “É melhor transformá-lo em um Classe 11” (lembrando que esta é a categoria de VW Beetle originais no regulamento da SCORE para corridas off road). Com essa ideia em mente, em 2011, Dennis começou a construir sua máquina de corrida, mais tarde chamada de “Vochito” pelas crianças da Casa Esperanza, orfanato que ele ajuda.
Agora é o próprio Dennis Hollenbeck quem fala
“Cheguei às corridas off-road como o típico espectador que fica à beira do rio seco em Ensenada observando os carros iniciarem sua corrida. Como tantos outros, eu só conseguia imaginar como seria avançar rumo ao desconhecido. Então, um dia aconteceu: eu era aquele cara correndo pelo leito do rio — sem respirar e com a sensação de que estava prestes a vomitar, mas estava correndo pelo leito seco do rio. Mas também queria fazer a diferença para as mães de criação e crianças da Casa Esperanza e inspirar outras pessoas a fazerem o mesmo.
Para mim, a corrida no deserto no México é o maior desafio e é uma forma de compartilhar o melhor de mim ao enfrentar esses desafios e, sim, às vezes as pessoas acabam lidando com o pior de mim também nos momentos de grande estresse. Sim, há momentos em que me pergunto: “Que diabos estou fazendo aqui?” Mas minha resposta vem quando vejo as marcas das mãos e os nomes das crianças e mães da Casa Esperanza estampados no “Vochito”.
Para mim, uma corrida da SCORE Baja é como um feriado em família. Reúne minha família off-road toda e, embora não comamos um lauto jantar de peru, costume do Dia de Ação de Graças., sentamo-nos para comer pizza fria e refrigerante quente, para discutir a logística e brincar sobre quem levou o “Vochito” para a vala na última corrida ou, no meu caso, rolou sobre o capô. É um momento em que até minhas filhas cumprimentam o pai cansado e sujo, ajudam-no a sair do “Vochito” e lhe dão um sanduíche de presunto.
É um momento em que minha melhor amiga se une a mim, me ajuda a descobrir tudo isso, organiza tudo e até me prepara uma xícara de café às três horas da manhã, quando eu termino minha etapa. Feliz que eu posso compartilhar essa grande aventura com minha esposa Debbie, que para mim é minha Rainha do Deserto.”
“Sei que, eventualmente, chegará o dia em que saberei que é hora de pendurar o capacete, mas sei que Deus não estará simplesmente encerrando a minha carreira nas corridas, mas me dará o desafio de estar presente para todos os pilotos que embarcarem nessa grande aventura, à medida que eu continuar com meu chamamento com o grupo Pilotos para Cristo, com o Ministério do Relacionamento com Cristo (RFC), e Confraria Mundial dos Capelães (Chappy), e já agradeço de antemão por essa oportunidade. Um chamamento, não um hobby. Sim, não é um hobby, mas uma paixão.
E termino, na qualidade de missionário, citando Hebreus 12: 1,2
¹ Portanto, também nós, uma vez que estamos rodeados por tão grande nuvem de testemunhas, livremo-nos de tudo o que nos atrapalha e do pecado que nos envolve, e corramos com perseverança a corrida que nos é proposta,
² tendo os olhos fitos em Jesus, autor e consumador da nossa fé. Ele, pela alegria que lhe fora proposta, suportou a cruz, desprezando a vergonha, e assentou-se à direita do trono de Deus.”
Dennis e as crianças da Casa Esperanza
O que Dennis faz para aquelas crianças é algo especial, eles o chamam de Tio Dennis, e chamam o “Vochito” de amigo. Não podemos negar o fato encantador que o efeito de um velho VW Beetle pode ter sobre as crianças, especialmente na Baja Califórnia. Dennis disse: “Não sei se gostaria de correr em outra categoria, não sei se as crianças gostariam que eu trouxesse outro carro. O “Vochito” é o amigo delas, elas até o desenham durante as aulas de arte. Eu tentei ser cuidadoso, não quero dar a eles uma falsa noção do que esse carro é, às vezes eu apenas digo a elas que é simplesmente um pedaço de sucata com um motor, nada mais; mas eles continuam criando uma conexão com ele, para eles esse é o irmão mais velho que vai para o deserto para bater no valentão em nome deles.”
Antes e depois de cada corrida, Dennis leva o “Vochito” para essas crianças e famílias que significam tudo para ele. Suas duas filhas adotivas são a prova viva disso. Algumas das histórias que chegam à Casa Esperanza são simplesmente de partir o coração, essas crianças passaram por muita coisa e ainda têm um momento difícil pela frente, e é por isso que Dennis traz o carro para ensiná-las que a vida é como uma corrida e é diferente para todos. Alguns podem correr a vida inteira em categorias ilimitadas sem ter com o que se preocupar, mas essas crianças que vivem em condições difíceis têm que viver como uma corrida de Classe 11, no caminho mais difícil. “É muito sofrimento, mas, no final, pode terminar em vitória se você se mantiver firme e, acima de tudo, não desistir; também ensinando a elas que, às vezes, mesmo quando você dá tudo de si, isso não significa que vencerá; o fracasso faz parte da vida e das corridas” disse Dennis.
Ter a esperança dessas crianças em suas costas durante as corridas não é fácil, é claro.
“E é disso que se trata a corrida off-road: todos nós corremos pela vida, passando por obstáculos difíceis que podem nos derrubar num instante, podemos encontrar em muitas situações a solidão total e, às vezes, podemos ter longos trechos rápidos, indo o mais rápido que pudermos. Todas essas experiências nos dão lições de vida. E eu estou sempre levando esse conhecimento para aquelas crianças que enfrentam muitas dificuldades na vida” concluiu Dennis.
Tal como Dennis, há mais equipes tentando fazer a diferença: Desert Dingos Class11 corre promovendo a sensibilização para a diabetes, Cameron Steele e a sua equipe, também Classe 11, trazem um apoio incrível ao Rancho Santa Martha, outra casa para crianças órfãs em Baja. O Green Army Class11 liderado por Justin Davis e Robert Acer também vieram à Casa Esperanza para ajudar Dennis. Estes são apenas alguns exemplos de pessoas que fazem a diferença, e se um orçamento limitado da Classe 11 (para VW Beetles originais) pode fazer a diferença, imagine o que poderia ser feito pelas equipes com orçamentos maiores…
A Casa Esperanza tem cerca de dez mães de criação que cuidam de até 40 crianças. E, apesar dos esforços dos colaboradores habituais, está sempre necessitando de ajuda. Se você quiser colaborar entre no Site da Casa Esperanza e ajude como puder.
No vídeo (02:29) abaixo o Dennis fala sobre as corridas e sobre o que é feito para ajudar a Casa Esperanza, com cenas do “Vochito” em ação:
Lembrando que o YouTube oferece a possibilidade de traduzir as legendas para muitos idiomas (é uma tradução por computador).
Para ativar a tradução de legendas ative a visualização no YouTube e siga os passos abaixo:
Selecione o ícone de legendas (é retangular com linhas de pontinhos), pause o vídeo e:
1) Clique no ícone de configurações abaixo da tela do vídeo (roda dentada);
2) Clique em Legendas/CC;
3) Clique em “Traduzir Automaticamente”;
4) Selecione o idioma desejado idioma. Clique na tecla play e curta o vídeo.
Eu conheci a história do Dennis e da Casa Esperanza através da circular de 6 de outubro de 2003 de Dominic Clark, que eu conheci quando estava pesquisando para a matéria “Fusca 1970 na 50ª Baja 1000”. Ele faz a divulgação da SCORE por e-mail, que eu continuo a receber. Com isto foi possível fazer as pesquisas e escrever esta matéria.
A questão de ajuda humanitária está presente em muitos eventos de VW Fusca e VW Kombi aqui no Brasil, geralmente através da coleta de alimentos não perecíveis e de leite longa-vida. Fato que eu apoio totalmente e gostaria de incentivar a todos os clubes de carros antigos a fazerem isto ajudando a comunidades carentes.
AG
Para esta matéria foram feitas pesquisas nos sites: offroadracer.com com o trabalho de Kilian Hamlin; ormhof.org com o depoimento do Dennis; YouTube. Detalhes dos links correspondentes podem ser dados sob consulta.
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A coluna “Falando de Fusca & Afins” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.