Antes de falar da nova Royal Enfield Shotgun 650, que acaba de ser lançada oficialmente no Brasil, vamos falar um pouquinho sobre seu conjunto propulsor, ou seja, motor e transmissão. Aparentemente uma receita básica, bicilindro transversal, quatro tempos, arrefecimento a ar, oito válvulas, comando único no cabeçote, poucas vezes tivemos uma solução mecânica tão simples e versátil que tenha se adaptado tão bem em tipos de motocicletas diferentes entre si.
Esse motor estreou na Royal Enfield Interceptor e na Continental GT, há exatos cinco anos, e lá ficou, quietinho, dando vida aos dois modelos street, o primeiro com um estilo básico de motocicleta urbana e o outro com um estilo mais esportivo, meio café racer. Até que voltou com muita pompa no lançamento da Royal Enfield Super Meteor, no ano passado, fazendo desse modelo um grande sucesso. Esse sucesso, quase inesperado, forneceu a certeza de que as próximas motocicletas que compartilhassem esse conjunto mecânico também teriam uma grande acolhida.
E cá está a nova e tão esperada Royal Enfield Shotgun. Compartilhando motor, câmbio e chassis com a Super Meteor, essa nova motocicleta tem muitos pontos que as confundem, mas trata-se de um estilo bem diferente, com proposta de utilização também bem diferente.
Sem querer entrar muito a fundo em classificações e nomenclaturas, enquanto a Royal Enfield Super Meteor é uma custom, com uma postura de pilotagem um tanto mais relaxada, especialmente devido ao banco mais baixo e às pedaleiras do piloto avançadas, a Royal Enfield Shotgun pode ser classificada como uma roadster, quase uma bobber, de postura mais ereta e com pedaleiras recuadas.

A citação de “quase” bobber vem do fato de que, apesar de a Shotgun vir de série com o banco do garupa, este, assim como sua estrutura subchassi, podem ser retirados para que o enorme para-lama traseiro “pelado” dê aquele ar de bobber. Para ser uma bobber pura, acredito eu, seria necessário simplificar ainda mais o seu visual, com a retirada de alguns elementos. Isso, certamente, ficará a cargo de cada artista que comprará sua Shotgun para fazer dela, conforme o próprio fabricante a define, uma “tela em branco”.
Outra forma de definir as diferenças entre Super Meteor e Shotgun está nos detalhes. Mesmo que ambas forneçam uma grande abertura para customizações, a nova Shotgun incorpora elementos mais modernos, como, por exemplo, a moldura de alumínio do farol, que pode ser facilmente retirada para receber uma pintura exclusiva e mudar totalmente a cara da motocicleta.

A pilotagem com a nova Royal Enfield Shotgun, em um dia inteiro pelas estradas, ficou no esperado, uma motocicleta muito ágil — a Super Meteor, mesmo com seu estilo custom, também é muito ágil para sua categoria — com posição de pilotagem ereta e guidão um pouco mais estreito (820 mm na Shotgun contra 890 mm na Super Meteor).
Já que estamos comparando dimensões, outra diferença importante é a altura do banco, 740 mm na Super contra 795 mm na Shotgun, uma diferença importante. Ela também é um pouco mais alta, são 140 mm de vão livre embaixo do motor contra 135 mm na Super Meteor.
Como explicar, então, que uma roadster e uma custom, que têm exatamente o mesmo chassi, possam ter diferentes geometrias e medidas, assim como ter diferentes reações de dirigibilidade? Podemos começar com o comprimento do garfo dianteiro. Ambos invertidos, de 43 mm de diâmetro e 120 mm de curso, mas de comprimentos diferentes.
O garfo da Shotgun é mais curto que o da Super Meteor, o que, automaticamente, abaixa a sua altura e reduz o ângulo de cáster. E mais: a roda dianteira da Shotgun tem 18 polegadas de diâmetro, contra os 19 polegadas da roda dianteira da Super Meteor. Isso reduz mais um pouquinho o cáster.
Na traseira, ao contrário: os amortecedores da Shotgun são mais longos que os da Super, apesar de terem menor curso (90 mm contra 101 mm), ou seja, a traseira é mais alta. A roda traseira da Shotgun é maior, 17 polegadas contra 16 polegadas, mas a altura dos pneus compensa o diâmetro final. Resumindo: traseira mais alta e dianteira mais baixa, realmente é mais uma roadster do que uma custom.
Com isso tudo, é natural que a dirigibilidade da nova Royal Enfield Shotgun seja bem diferente da Super Meteor, certamente bem mais ágil e mais disposta a contornar curvas. Essas diferenças também afetam as medidas básicas das motocicletas: a Shotgun tem distância entre-eixos de 1.465 mm, bem menor do que a da Super Meteor, que é de 1.500 mm. Seu comprimento é, também, menor: 2.220 mm contra 2.260 mm.
Complementando as medidas, a Shotgun tem ângulo de cáster de 25,3o e trail de 101,6 mm (contra 27,6o e 119,3 mm da Super), pesa, em ordem de marcha, 240 kg, contra 241 kg (um empate técnico, mas esse peso pode ser reduzido em 5 kg com a retirada do subchassi) e o seu tanque de combustível tem capacidade de 13,8 litros, contra 15,7 litros da Super.
E o desempenho? Com exatamente o mesmo motor e as mesas características mecânicas — 648 cm3, potência de 47 cv a 7.250 rpm, torque de 5,34 m·kgf a 5.650 rpm —, a princípio imaginei que as seis relações de câmbio e de transmissão fossem diferentes, o que explicaria minha impressão inicial de que as primeiras marchas seriam mais longas e as última mais curtas. Mas não, elas são exatamente iguais. E as alturas dos pneus traseiros compensam a diferença no diâmetro das rodas. Ficou, então, só na impressão.
As reações dinâmicas, no entanto, são diferentes. Só a posição do piloto, mais ereta, com as pernas recuadas e o guidão mais estreito e mais à frente, na linha do garfo, já faz muita diferença. A motocicleta mais inclinada à frente, com menor cáster, complementa a sensação de ter uma motocicleta bem mais “na mão”.

O banco solo da Shotgun é um tanto duro e se faz sentir logo à primeira centena de quilômetros, sem a opção de um banco especial como há para a Super Meteor. Imagino o mesmo para aquele estreito banquinho para o garupa, que pode ser retirado em segundos, apenas utilizando a chave da motocicleta, sobrando uma grelha/bagageiro para objetos amarrados com aranhas. Ou então, em um trabalho mais demorado, há a possibilidade da retirada do subchassi traseiro, revelando o belo para-lama traseiro de uma bobber.
Em relação aos equipamentos da Royal Enfield Shotgun, nem acelerador eletrônico ela tem, então esqueceremos esse negócio de modos de pilotagem, controle de wheelie e coisas parecida. De moderno, há o ABS obrigatório, a injeção eletrônica necessária, as luzes de LEDs, um ponto de energia USB e o prático navegador Tripper GPS no painel, acoplado ao seu inseparável telefone celular conectado ao Google Maps. Agora, se você ainda não aderiu à telefonia móvel, poderia até voltar ao carburador. E ao guia Mapograph.
A Royal Enfield Shotgun é o quarto modelo da marca a vir ao Brasil com o motor twin 650, depois da Interceptor, da Continental GT e da Super Meteor. Mas estão prometidas (e bem aguardadas) para este ano mais dois modelos com essa mecânica, a Bear 650 e a Classic 650. E tem mais, virão também neste ano a Royal Enfield Guerrilla 450 e a nova Hymalaian 450, que compartilharão um novo motor monocilindro.

A nova Royal Enfield Shotgun custa a partir de R$ 33.990, valor para a motocicleta na cor cinza (Sheet Metal Gray), acrescendo R$ 500 para as cores azul e verde, as mais bonitas (Plasma Blue e Drill Green). Com mais R$ 500 inteiramos os R$ 34.990 necessários para a top, na cor a branca (Stencil White), lembrando que nesses valores já está incluído o frete, para todo o Brasil.
GM