O ano era 1988, quando nosso inesquecível tricampeão de Fórmula 1 conquistou seu primeiro título mundial com a vitória sobre Alain Prost no GP do Japão, em Suzuka, no dia 30 de outubro. Um de seus principais patrocinadores e apoiadores, o Banco Nacional, já extinto, resolveu presenteá-lo pelo feito com o recém-lançado e badalado na época Gol GTi. O Banco Nacional optou por comprar o carro diretamente da Volkswagen, e as pessoas envolvidas na escolha do carro que serviria ao campeão resolveram caprichar.
Pode parecer estranho hoje tal presente, mas por aí pode-se aquilatar o impacto do Gol GTi no mercado, o que o veículo significou na época, podendo-se considerá-lo uma joia.
No pátio de carros prontos da fábrica, localizada na cidade paulista de Taubaté, onde se encontra a unidade fabril que na época produzia o Gol “quadrado”, os técnicos procuraram uma carroceria excelente, aquela em que todos os ajustes da armação estavam perfeitos.
Esse carro pronto, aguardando para ser enviado a uma concessionária, foi levado para fábrica-sede em São Bernardo do Campo, mais precisamente à Ala Zero, uma espécie de superoficina na fábrica da Volkswagen responsável pelas revisões dos carros da frota interna e solução dos problemas que a rede de concessionárias não conseguiam resolver. Uma oficina modelo da Volkswagen.
Eles fariam a revisão de entrega e os detalhes de um carro campeão que presentearia outro campeão. Resolveu-se também que o motor e o câmbio seriam substituídos, igualmente montados na linha de produção, mas que, graças a uma montagem mais feliz e com componentes mais adequados, desenvolviam mais potência no caso do motor e menos ruído no caso da transmissão.
Ronaldo Berg, gerente Assistência Técnica ao Produto da VW na época e responsável pela Ala Zero, onde a revisão de entrega do carro de Senna seria feito, se encarregou de pedir às engenharias de motor e transmissão unidades que se destacaram pelo melhor desempenho. Uma equipe de mecânicos foi destacada para o serviço refinado no carro do campeão.
O esportivo de Senna foi colocado em um elevador, ligeiramente erguido para a retirada das rodas dianteiras, que foram devidamente colocadas no porta-malas, já forrado com papel-manteiga para não sujar. Iniciou-se a retirada do conjunto motor-câmbio original, que seriam substituídos por aqueles outros especialmente escolhidos.
O GTi especial foi então totalmente erguido no elevador para que se completasse a retirada do trem de força original. Nesse momento, quando os mecânicos abaixaram o motor e o câmbio original, momentaneamente, a frente ficou vazia, sem motor e câmbio. O porta-malas estava cheio, com o estepe original mais as duas rodas dianteiras, tudo pesando na extremidade traseira e a frente leve, sem absolutamente nada.
O resultado foi algo surpreendente: o carro girou no ar, em uma espécie de cambalhota aérea, caindo ao chão com as quatro rodas para cima. Um susto tremendo para todos os presentes e, por sorte, não machucou absolutamente ninguém.
O Gol GTi do nosso campeão Ayrton Senna estava totalmente perdido sem que ele, Ayrton, tivesse sequer visto o carro. Mas nem tudo estava acabado, afinal de contas, estávamos dentro da principal unidade de manufatura da fabricante que havia criado e produzia diariamente o famoso esportivo em Taubatpe. O primeiro carro do Ayrton foi dado como perda total; nada podia se aproveitar do carro carinhosamente escolhido.
O processo de escolha de um outro carro foi reiniciado. Na fábrica de Taubaté, escolheu-se um novo GTi de carroceria perfeita, carro também enviado para a Ala Zero. Os mecânicos substituíram o conjunto motor-câmbio originalmente montado no segundo carro por aquele especialmente escolhido pela engenharia. Mas, desta vez, o carro foi amarrado ao elevador para que não cometesse o “suicídio” do primeiro.
Houve a solenidade de entrega do carro no início de 1989, na mesma Ala Zero, com a presença do nosso campeão Ayrton Senna e de representantes da Volkswagen, do Banco Nacional e inclusive de Ronaldo Berg, responsável pela Ala Zero, que me contou os detalhes desse episódio, que hoje faz parte da história de bastidores de nossa indústria automobilística.
Esse Gol GTi ficou com a família de Senna, pelo que apuramos, até 1996, utilizado no dia a dia por Leonardo Senna, irmão do nosso inesquecível campeão. Se você sabe onde se encontra esse carro, conte, porque temos grande curiosidade de saber por onde ele anda. Uma verdadeira parte da história de nossa indústria.
DM