A primeira geração do Gol esportivo já tem o seu lugar garantido no pedestal dos grandes carros brasileiros. Eles já são raros. E ficarão ainda mais.
Já faz três décadas que o primeiro Gol GTi foi apresentado ao grande público. Para a imprensa especializada, o carro foi mostrado em primeira mão em setembro de 1988. Eu, particularmente, tive o meu primeiro contato com o Gol GTi no final de setembro ou começo de outubro.
Além do design matador, com sua exclusiva cor azul marinho metálico (azul Mônaco, como era chamado oficialmente) e alguns detalhes na cor prata, o Gol GTi podia se gabar de ser o primeiro carro nacional que trocou o carburador pela injeção eletrônica de gasolina: um sistema Bosch LE-Jetronic que funcionava harmoniosamente com um poderoso sistema de ignição mapeada, batizado de EZK, que, além de possuir na memória as curvas de avanço da ignição, produzia nas velas uma centelha poderosa que queimava eficientemente a mistura ar-combustível, gerando, ao mesmo tempo, potência e economia. Um marco para nossa indústria automobilística.
Seu motor 2,0 com a tal injeção eletrônica analógica e o sistema de ignição EZK tinha até mesmo a sofisticação de um sistema antidetonação, que corrigia a curva de avanço sempre que o motor percebia que uma gasolina de má qualidade provocaria detonação. Graças a esse recurso tecnológico, hoje comum a praticamente todos os carros, foi possível lançar o motor do GTi com 10:1 de taxa de compressão, fato que melhorava muito o desempenho.
Os tuchos eram hidráulicos e o motor produzia a espantosa potência, para a época, é claro, de 125 cv a 5.600 rpm e um torque máximo de 18,3 m·kgf a 3.200 rpm.
Potência bruta e potência líquida
Para precisão histórica cabe aqui um parêntese. Na época a indústria instalada no Brasil adotava a potência SAE bruta, resultado da medição do motor no dinamômetro em condições que não representavam o mundo real, ou seja, o motor não era medido conforme era instalado no carro com todos os acessórios como alternador, bomba d’água, correias, filtro de ar, embreagem, escapamento e outros. Ao contrário da potência SAE líquida, também conhecida por potência DIN (norma alemã), em que o motor ia completo para o dinamômetro. Daí resultava que a potência bruta era maior, numericamente falando, que a potência líquida.
Em termos de marketing, quando maior um número, melhor. O que impressiona mais, torque de 250 N·m ou torque de 25,5 m·kgf? O torque absoluto é o mesmo.
No caso do Gol GTi, a potência líquida no lançamento em 1989 era 114 cv a 5.600 rpm e o torque líquido, 17,6 m·kgf a 3.200 rpm. Em 1992 começou a Fase 2 do Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve) e o Gol GTi precisou receber catalisador para atender aos novos limites de emissões. Nesse momento sua potência bruta caiu para 120 cv a 5.600 rpm e o torque para 17,5 m·kgf a 3.000 rpm. E a potência líquida, 112 cv a 5.600 rpm e o torque líquido se manteve, mas a 3.400 rpm.
A título de curiosidade, o motor AP 2000 a álcool sem catalisador desenvolvia 116 cv a 5.200 rpm e 17,8 m·kgf a 3.600 rpm, e com catalisador, 112 cv a 5.200 rpm e 17,5 m·kgf a 3.600 rpm. A potência bruta desse motor era 118 cv a 5.400 rpm e o torque bruto, 18,2 a 3.400 rpm
Mas independente da questão bruta ou líquida, o grande segredo desse motor do GTi, era o de mostrar a maioria desse torque máximo, com a potência acompanhando, desde as baixas rotações, o que dava ao Gol de 980 kg arrancadas e retomadas espantosas para a época: o carro chegava a 100 km/h em apenas 8,8 segundos e sua velocidade máxima beirava os 190 km/h. Um verdadeiro foguete para os padrões de desempenho de 1988.
O interior com bancos Recaro, painel com grafia vermelha e teclas satélite, além de um console central completo, davam charme e sofisticação ao GTi.
Externamente, um aerofólio traseiro exclusivo, apliques plásticos prata nas laterais, exclusivas rodas diamantadas aro 14 com design de gota e pneus de perfil baixo então (60), faróis auxiliares de longo alcance sobre o para-choque e de neblina na parte inferior, completavam a esportividade do design. Além de escapamento de saída dupla, que davam um ronco todo especial ao modelo. Por ser muito caro pra época (NCz$ 22.535,00 em fevereiro de 1989, valor que atualizado corresponde a estratosféricos R$ 189 mil), o Gol GTi foi vendido em uma escala relativamente pequena.
O carro, apresentado como grande destaque do Salão do Automóvel de São Paulo de 1988, começou a ser vendido ao grande público já em novembro do mesmo ano. Por isso, existem alguns GTi de fabricação 1988 e modelo 1989. E essas primeiras unidades completaram 30 anos em 1988 e podem receber a placa preta, referência que indica tratar-se de um carro com alto índice de originalidade.
Por ter se transformado em referência do mercado nacional no final dos anos 1980, o Gol GTi é atualmente muito procurado pelos colecionadores. Essa busca frenética pelos carros que restaram ainda inteiros (uma boa parte deles, infelizmente, foi turbinada, rebaixada, descaracterizada e perderam seu valor histórico), fez com que as poucas unidades originais que ainda circulam por aí tivessem seus preços levados às alturas.
Só para que se tenha uma ideia, o primeiro Gol GTi 1988/1989 a receber a placa preta esse ano, foi imediatamente anunciado e vendido por R$ 125 mil, um valor, dizem os especialistas, que deve crescer ainda mais a medida que os colecionadores não abram mão dos seus carros. Por isso, meus caros amigos, se vocês têm a felicidade de possuir uma dessas preciosidades, não venda. Este ícone certamente já tem o seu lugar garantido no pedestal dos grandes carros brasileiros, por tudo o que ele já fez em design, desempenho, tecnologia e sonho de consumo.
E mesmo no universo dos Gol GTi, há ainda aqueles mais raros. Por exemplo, o exemplar que Ayrton Senna ganhou do seu patrocinador da época, o Banco Nacional, como prêmio pelo seu primeiro título mundial de Fórmula 1, em 1988. Essa verdadeira mosca branca vestida de noiva é caçada com lupa pelos colecionadores.
Assim como esse, outros GTi que pertenceram a pessoas famosas, ou os que tem baixíssima quilometragem original e estão guardados em algum fundo de garagem por esse Brasil afora, devem reaparecer com preços ainda mais astronômicos. Um Gol GTi que não seja 100% original, mas esteja em bom estado de conservação e aparência, podem ainda ser encontrados por preços que giram ao redor dos R$60 mil. Eles já são raros. E ficarão ainda mais.
DM
A coluna “Perfume de carro” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
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