Revendo meus guardados no computador encontrei uma pastinha que já migrou entre vários discos rígidos dos computadores que foram sendo trocados com o tempo. E lá estava este causo que o Renato Queiroz tinha enviado em 15 de maio de 2004 e que chegou atrasado para a edição de meu segundo livro que tem a coletânea de causos. Mas agora eu o “trago à luz” dando-lhe o merecido destaque. O Renato havia visto uma matéria sobre o lançamento do segundo livro e disse em sua mensagem: “fiquei emocionado com as histórias dos colegas “fuscamaníacos” e resolvi contar uma das minhas aventuras”. Pois é, quando indico “novo causo” não me refiro à sua idade, mas ao fato de ser a sua primeira publicação nesta coluna.
Para Guarapari com emoção
Por Renato Queiroz
Era dezembro de 1986, como fazíamos todo final de ano, como bons mineiros, reunimos a família para viajar para Guarapari, onde meus pais tinham um apartamento. Naquele ano aconteceu que realmente todos estavam doidos para viajar: meus tios, primas, avó, eu, minha irmã, meus pais, inclusive os cachorros da minha tia Lucia (Titã, e Piti, duas “meninas” poodle) e meu querido Poti (um pequinês).
Fizemos uma espécie de rodízio, para que todos ficassem o mais confortável possível, nas tão merecidas férias. Para isso ficou combinado que eu iria com o Fusca da tia Lucia, com ela minha avó e as meninas (Titã, Piti).
De início parecia impossível colocar toda aquela bagagem no possante; ainda fazíamos as compras de mercearia em Belo Horizonte para economizar e não usávamos o bagageiro do teto por julgarmos pouco seguro, além do mais sempre havia aquele toró ao chegarmos na região da Serra no Espírito Santo.
Depois de nos ajeitar entre as tralhas e “meninas” na maior algazarra, pegamos a estrada lá pelas oito horas da manhã. Já próximo de Ouro Preto percebemos que o sol que antes brilhava havia desaparecido, foi substituído por pesadas e ameaçadoras nuvens negras.
Como sou fã de uma boa aventura pedi para dirigir o Fusquinha, fui atendido, sob protestos da tia que tinha muito cuidado com o carrinho dela, além do detalhe de que minha carteira ainda era recente. Entrei aos poucos no meu ritmo de dirigir, na estrada mantenho minha velocidade de segurança e uma distância tal que consiga parar sem atingir o carro que vai a frente.
Havia pouco tráfego, pois era um domingo. Eu já confiava no meu taco porque dirigia o Fusca da minha mãe desde os 14 anos, e sempre me dei bem apesar de alguns sustos. Meu pai, que dirigia muito bem, já havia me aprovado no treinamento do trânsito da cidade, estradas, trechos de terra e tudo durante as viagens para pescarias no Rio São Francisco, então já estava mais do que batizado nas maldades das estradas brasileiras.
O tempo foi mudando para pior, acendi os faróis porque a esta altura já parecia noite em pleno horário de 10 horas da manhã! Percebi que até a algazarra das “meninas” havia se esgotado, quando olhei pelo retrovisor e minha avó antes falante, estava a remexer na bolsa a procura do seu terço para rezar.
Foi como se São Pedro estivesse lavando todo o céu com uma mangueira do corpo de bombeiros, os pingos de chuva pareciam baldes de 20 litros, a ventania estava a ponto de arrancar as arvores enquanto os raios e trovões cortavam o ar que tinha aquele cheiro de terra molhada, o limpador de para-brisa estava no “ultimo furo”, procurei acender (de novo) os faróis, minha Tia acendeu outro cigarro esquecendo-se que já estava fumando e parou de dar palpites sobre meu modo de dirigir.
O para-brisa e os outros vidros ficaram logo embaçados pelo calor úmido dentro do carro mesmo com os vidros um pouco abertos, como aprendi com meu pai, aí tive a ideia de pedir para a vovó e a titia passarem a flanela para me ajudar a enxergar. Foi quando chegamos a ponte sobre o rio Gualaxo do Sul próximo a Mariana (imagem de abertura).
Estava devagar visibilidade de poucos metros, quando no final da descida íngreme avistamos a ponte que estava completamente alagada enquanto as águas do rio quase passavam por cima da pista batendo contra a mureta da ponte formando ondas sob a chuva pesada. Não pensei duas vezes reduzi a marcha do valente Fusca para a 2º e acelerei firme e constante, às vezes ele parecia escorregar nas poças da pista quase saindo da mão de tráfego, outras parecia boiar pois não sentia o atrito normal das rodas sobre o asfalto áspero.
Quando avistei o final da ponte arrisquei passar para 3º marcha para economizar o motor que já falava alto e embalar para subir a rampa do outro lado do rio. O fusquinha agradeceu a marcha e respondeu com força para nos tirar daquele sufoco, ufa!!
Foi só começar a subir a rampa e avistamos um caminhão basculante indo na mesma direção, aproveitei para ficar a uma distância tal que o peso do “monstro” criava uma abertura nas águas da enxurrada de lama que desciam dos morros e cobria o asfalto, assim evitei o risco de derrapagens ou flutuação do meu possante.
Quando passou a tempestade paramos no posto Touro Sentado próximo a Ponte Nova, Minha tia deu graças a Deus por eu estar dirigindo naquela chuva, porque confessou que ela “teria abandonado o carro e sairia correndo e chorando de tanto medo!” Ela me deu parabéns! Mas se não fosse a minha confiança no possante com mais de 10 anos de puro capricho dela seria no mínimo mais difícil!
O Renato Queiroz até que foi hábil naquelas condições, se bem que o Fusca fez a sua parte dadas as suas aptidões para este tipo de situação. Como sempre deixo aqui o convite para que meus leitores e leitoras enviem seus causos para nosso acervo e eventual publicação.
AG
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