A foto de abertura registra uma foto tirada no dia 25 de junho de 1996, uma terça-feira. Eu, então na qualidade de presidente do Fusca Clube do Brasil, fui convidado a participar desta despedida formal do “encerramento definitivo” da fabricação do Fusca no Brasil, pois já havia ocorrido um encerramento em 1986 que acabou não sendo o “definitivo”, já que o Fusca voltou à linha de montagem em 1993 por uma solicitação do então presidente Itamar Franco.
Quem quiser me reconhecer na foto basta ver quem estava com um blazer vinho. Nesta foto Pierre-Alain de Smedt, presidente da Autolatina, que estava atrás de mim, apoiou sua mão sobre o meu ombro, num gesto que me deixou muito orgulhoso.
A linha do Fusca foi encerrada na sexta-feira 28 de junho de 1996, cumprindo o acordo feito para a volta do Fusca em 1993. Com isto lá se vão 25 anos sem um Fusca saindo da linha de montagem da Fábrica Anchieta da Volkswagen.
O destino da faixa da fotografia
Na parte superior da foto de abertura vê-se uma faixa que fechava o topo da fachada do pórtico que foi usado como cenário para a foto de despedida do Fusca. Esta faixa havia sido preservada após a desmontagem da linha de fabricação do Fusca “Itamar”. Passados muitos anos, esta faixa foi passada para mim e eu confiei a guarda deste importante testemunho histórico ao Clube do Fusca de Poços de Caldas.
A faixa foi entregue durante a palestra que proferi na sede deste clube no dia 23 de janeiro de 2016, no contexto do “Dia Nacional do Fusca com a Família Fusca Poços”:
Duas semanas antes eu já tinha estado na fábrica participando de uma despedida à linha de montagem do Fusca que tinha sido organizada pelo Fusca Clube do Brasil, conforme o relato que se segue:
Visita de despedida à linha de fabricação do Fusca
Estes foram os participantes desta visita:
Todos sabíamos que quando o nosso querido Fusca foi relançado, em julho de 1993, sua permanência na linha de montagem da fábrica de São Bernardo do Campo estava limitada a um curto período.
Mas, desafiando o tempo e, principalmente, a “indústria de boatos” que se construiu ao seu redor, o Fusca comprovou naqueles últimos quatros anos a imagem que ainda possuía entre o povo brasileiro.
Vendendo toda a sua produção (e mais que muitos carros de luxo), o “Fusquinha” tinha voltado a ser o preferido dos grandes frotistas (que o compravam às centenas, para a alegria dos respectivos chefes de manutenção) e, principalmente, dos moradores do interior de nosso país que, vivendo um cotidiano de estradas de terra, lamaçais, etc., compraram seu Fusca com muita alegria e satisfação.
Enfim, é incontestável que, com a grande variedade de carros populares à venda, quem comprou o Fusca fez, na maioria das vezes, uma clara opção pelas suas qualidades.
A situação começou a ficar mais complicada em meados de 1996, quando as metas do acordo firmado entre a Volkswagen e o Governo Federal estavam por serem cumpridas, e os novos limites de emissão de poluentes, impostos pelo Proconve, (Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores) deixavam claro que para o Fusca continuar em produção seriam necessárias novas adaptações que acabariam inviabilizando sua comercialização.
E, infelizmente, no dia 12 de junho de 1996 tinha chegado o dia de darmos, mais uma vez, adeus ao nosso fiel companheiro.
Em meio a um clima de curiosidade e tristeza, um grupo de Fuscamaníacos teve a oportunidade de realizar a última visita à linha de montagem de São Bernardo do Campo, dias antes dela ser desmontada definitivamente.
Fazendo o papel de “guia oficial”. o amigo Reinhold Ortlieb nos acompanhou, com sua simpatia e conhecimento, por cada uma das alas da fábrica, enquanto nosso colega de clube Andreas Wolfsohn (que trabalhou diretamente na implantação da linha de produção do Fusca) mostrava e descrevia detalhes minuciosos que somente um especialista poderia saber.
Completando a “comitiva”, um fotógrafo da Volkswagen nos acompanhou e fez as fotografias que ilustram esta parte da matéria.
E, encerrando a visita, a Volkswagen convidou os participantes para um almoço, durante o qual foram oferecidos brindes.
Acompanhando a “despedida”, estiveram presentes, além dos representantes do Fusca Clube do Brasil, companheiros de clubes coirmãos:
Fusca Clube do Brasil: Alexander Gromow, Andreas Wolfsohn (acompanhado de dois filhos: Andrea e Martin), Mauro Luiz Ribeiro, Wagner Sierra, Celsom Gomes Pereira e Eduardo Anuar Farha.
Fusca Clube de Campinas: Jose Antônio M. Alberto, Luiz A. Daniel e Alberto T. Destro.
Fusca Clube Belo Horizonte: Paulo Emílio Borges Pires (que demonstrando grande disposição, viajou de ônibus de Belo Horizonte para São Paulo à noite e voltou logo após a visita!!).
Fusca Clube Mogi das Cruzes: André Takeda e Ronaldo Pedro Vilela, o saudoso “Magrão”
Karmann Ghia Club SP: Carlos Alberto Golzer.
André Chun fala em nome dos apaixonados pelo Fusca “Itamar”
Convidei André Chun, a quem agradeço, para dar o seu depoimento. Ele participa de vários grupos de apaixonados pelo Fusca “Itamar”, tem feito pesquisas importantes de recuperação da história destes carros e tem o último Fusca fabricado. Abaixo o registro da visita dele à Fábrica Anchieta a bordo de seu Fusca “Itamar”, realizada no dia 24 de maio de 2018:
André Chun escreveu:
“Para mim o dia 28 de junho de 2021 é uma data importante, em especial por ser uma data redonda: 25 anos do fim da produção do Fusca no Brasil. Em especial em relação ao Fusca “Itamar”, foi o fim de uma era dourada que não que vai acontecer no mundo jamais. Nunca vi um carro sair de linha de produção e ser relançado logo depois. Na década de 1990 o mundo já não era tão arcaico, tínhamos a globalização, uma revolução industrial acontecendo, uma revolução digital muito grande com a internet se difundindo…
Muitos acontecimentos davam o tom de modernidade para o mundo e os camaradas foram lá e relançaram o Fusca. Então essa história em relação ao Fusca 1993/1996, que a gente chama de “Itamar”, acho que é belíssima de ser contada. Para quem gosta de história, é muito gratificante escutar o Andreas Wolfsohn relatando passo a passo o relançamento do Fusca, com farta documentação guardada e à qual tive acesso. Falar dessa data, que representa o fim da produção do Fusca pela VW do Brasil é sempre polêmica.
Muita gente que tinha Fusca 1986 ficou bastante desgostosa com o relançamento e isto é plenamente compreensível, porque o colecionador comprou um Última Série, ou um Fusca ‘1986 para deixar guardadinho… E aí a Volkswagen vai lá e relança o Fusca. O Fusca relançado vai a 1994, a 1995, entra em 1996 e assim muitos acabaram vendendo o seu histórico Fusca 1986. No caso dos Última Série de funcionários mais antigos também foi isso que ocorreu. O senhor Klaus Zyturus soltou o seu Fusca de funcionário em 1994 porque relançaram o Fusca. Outro relato foi do senhor Andreas Zimmermann, ele contou que seu pai também pegou um Fusca de funcionários antigos e quando relançaram o Fusca, ele desanimou: ‘A gente ofereceu esse carro de volta para a Volkswagen, mas ela não quis comprar porque já tinha sido comprado o lote necessário de Fuscas 1986 para estudos/testes com vistas a fazer o Fusca “Itamar”‘.
Então muita gente vendeu o carro “da primeira leva” por isso. Foi muito notório ver que muitos carros ‘1986 de concessionária também acabaram sendo vendidos naquela ocasião. Esses dias mesmo eu falava com um membro do nosso grupo de Fusca Última Série e ele me mostrou o Fusca dele que tinha sido de uma concessionária em Alagoas que possuía dois Fuscas Ultima Série, e em 1994 vendeu os dois. Aí então é aquela coisa, não é? A Volkswagen com o relançamento do “Itamar” criou uma segmentação no Fusca, que infelizmente gerou um certo ódio entre os colecionadores.
Muita gente que tinha Fusca 1986 começou a denegrir o Fusca “Itamar” e passaram então a difundir que o Fusca 1993/1996 era feito pela Zito Pereira, que era um dos fabricantes de lataria para automóveis, inclusive para Fusca. Você mesmo, Alexander, esteve na fábrica e viu com seus olhos a VW fabricar Fuscas na linha de produção na fábrica Anchieta. O Andreas disse que as peças da Zito Pereira se destinavam ao mercado de reposição e o máximo que a VW tentou com eles foi a porta traseira do Santana 1998, que no fim, não se concretizou.
Quem conheceu a linha do Fusca na Fábrica Anchieta da Volkswagen como você, Alexander, pôde comprovar que esses comentários simplistas sobre a Zito Pereira fazer Fusca não têm qualquer lógica, afinal o carro além da lataria, tem motor, suspensão, vidros, elétrica, chaves, setas, faróis, componentes de acabamento, etc.
Aliás, conversando com o Sr. Sydnei Mesquita, que entrou para a VW em 1962, ouvi o relato que confirmava que quem fazia boa parte da lataria para a VW era a Nakayone, não a Zito Pereira. As matrizes eram da Volkswagen e as peças menores como tampa do motor, para-lamas, assoalhos, saíam da Nakayone. e peças grandes como teto, capô aí não, era na estamparia da própria Volkswagen mesmo. Ele relatou que tentaram enviar peças grandes para a Nakayone, mas não deu certo. Não havia espaço para fazer e ia ser muito cara a remoção. Então decidiram continuar lá “batendo” essas peças na Volkswagen. Anchieta.
Perguntei ao Sr. Sydnei sobre as peças maiores do Fusca e recebi a seguinte explicação: ”Sim, porque para o repuxo do teto era necessária uma prensa de 1.800 t de tripla ação. As ferramentas do teto eram para ter seguido para a Krupp para sucata, só que deu problema de logística, e os caminhões não as vieram retirá-las. Na semana seguinte estourou a notícia da nova produção do Fusca. Foi muita sorte”. Quase que essas ferramentas acabaram sucateadas…
Com toda a desavença formada entre os que não aceitavam o Fusca 1993/1996, foi criado em 2013 o GFI – Grupo Fusca Itamar. O tema nos fóruns e comunidades da época era sempre o mesmo: turma dos Fuscas mais antigos chamando o Fusca “Itamar” de Fusca “Zito Pereira”. Era muito chato. Nós, proprietários de Fuscas “Itamar”, não tínhamos paz nos grupos normais.
Entrei no Grupo Itamar em 2015, sempre pesquisei muito e hoje crescemos demais, com mais de 1.000 pessoas nos nossos quatro grupos de WhatsApp. Muita gente no Facebook; só o Grupo de Série Ouro no Facebook tem mais de 20 mil pessoas. E o Grupo de Série Ouro que temos no WhatsApp não tem um segundo grupo (dada a lotação esgotada do primeiro) porque eu não consigo administrar. Essas 256 pessoas pertencentes ao grupo Série Ouro são influentíssimas, todos com Fusca Série Ouro e uma boa parte com mais de um. Com todo este trabalho foi possível reverter esse quadro e hoje o Fusca “Itamar” é um Fusca extremamente requisitado.
Em tempo, eu mesmo tenho três Fuscas 1986 e, com isto, não estou dizendo que o Fusca “Itamar” é o melhor. Apenas digo que ele é um Fusca normal, como os demais, coisa que muita gente tentava descredenciar.
Para mim, passados exatos 25 anos do fim da produção de Fuscas, essa data é especial, pois foram muitas lutas e pesquisas para tirar o Fusca “Itamar” do ostracismo e colocá-lo no patamar de ser reconhecido como um Fusca de verdade. Restaram uns que continuam desmerecendo o Fusca “Itamar” mesmo assim, mas o que se nota é que “Itamar” bom é venda na certa, é procura forte, é valor alto. Um Fusca Série Ouro vermelho Dakar sendo vendido por mais R$ 200.000 mostra que o carro pegou, não é verdade? Se fosse um “Zito Pereira” acho que ninguém ia pagar isso…
E para o Fusca o dia 28 de junho representa o fim de uma era dourada que nunca mais vai existir.”
Assim se encerrou definitivamente a fabricação do Fusca no Brasil, e este registro marca os 25 anos deste acontecimento. Mas o Fusca permanece presente no Brasil e mantém uma legião de fiéis admiradores.
Curiosamente a publicação desta matéria caiu exatamente no dia em que o encerramento definitivo da fabricação do Fusca no Brasil completa 25 anos. Mas não é exatamente um motivo para festejos.
AG
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