A corrida de Fórmula 1 da semana passada, em Spa-Francorchamps, será lembrada por ter sido absolutamente estranha. No final da curtíssima prova, o pódio não fugiu ao resto da prova — dentro das normas, é fato, e teoricamente nada de errado, mas ainda assim estranha. Por isso, vai para o topo da lista dos pódios que considero, digamos, memoráveis, ainda que por motivos que não tem nada de técnico e estão mais para divertidos (foto de abertura). Vamos, pois, à continuação do meu texto da semana passada. Novamente, exceto a de Spa, os outros pódios não tem uma ordem de importância ou de bizarrice. Está mais para algo aleatório.
Spa-Francorchamps 2021
Pela foto não dá para achar nada estranho neste pódio, por isso, vamos ao contexto: a prova (?) teve apenas três voltas, corridas (?) atrás do carro de segurança e, portanto, com proibição de ultrapassagens. Acho que teria sido mais lógico não correr e dar os pontos e até mesmo comemorar o pódio aos pilotos sem sequer ter de relargar — mas vá que alguém roda e perde uma colocação já garantida, não é? Mas gostei de ver o George Russell no segundo lugar.
Mônaco 1996
Esta foi uma das corridas mais doidas da F-1. Terminou com apenas quatro carros, pois todos os outros se envolveram em acidentes ou quebraram e acabaram abandonando. Olivier Panis, da Ligier, foi para o lugar mais alto do pódio, seguido de David Coulthard (usando o capacete emprestado por Michael Schumacher pois os dois dele tinham problemas com a viseira) de McLaren e Johnnie Herbert, da Sauber. Ou seja, fora do pódio só havia um corredor que havia completado a prova, o alemão Heinz-Harald Frentzen, uma volta atrás. Os outros podiam tê-lo convidado para subir também, não?
Las Vegas 1981
Esta vale pela irreverência da foto: o vencedor da corrida, Alan Jones, bota um chifrinho em Jean-Marie Balestre, então presidente da Fisa. Neste mesmo GP, Nelson Piquet sagrou-se campeão mundial.
Itália 1989
Senna, em acirrada disputa, abandona e Prost herda a vitória. O francês já havia assinado com a Ferrari para correr em 1990 e, claro, os tifosi comemoraram muito no circuito de Monza. No pódio, Prost recebe o troféu e joga para a torcida — literalmente, pois além de fazer média com o público, arremessou a taça ao público. O problema é que o troféu se espatifou nas mãos de sabe-se lá quantos torcedores e quebrou em pedacinhos quase instantaneamente. Naquela época, os troféus não ficavam com os pilotos, mas iam para o Centro de Tecnologia da McLaren. Ron Dennis ficou furioso.
Anos depois, Prost presenteou Dennis com uma réplica do troféu, mas por via das dúvidas a McLaren passou a fazer constar nos contratos que seus pilotos eram obrigados a entregar todos os troféus para a equipe…
Brasil 2003
Esta história parece jogo de futebol depois que instituíram o VAR: Fisichella comemorou sua vitória com a Jordan quando a prova foi interrompida por uma bandeira vermelha, mas logo depois vem a notícia de que Kimi Raikkonen era o vencedor e é ele quem sobe no lugar mais alto do pódio. Fernando Alonso, terceiro colocado, não compareceu porque precisou ser levado ao hospital por causa do acidente com Webber. Mas nada disso valeu, pois duas semanas depois, com a checagem de novas imagens, os fiscais declararam Fisichella vencedor. Depois de duas semanas, no GP de San Marino, em uma cerimônia não-oficial, Raikkonen entregou o troféu de 1° colocado para o piloto da equipe irlandesa.
Bélgica 2013 (Spa-Francorchamps)
Membros do Greenpeace haviam passado todo o final de semana protestando contra o principal patrocinador da corrida, a Shell, por causa dos projetos da petroleira de perfuração no Ártico. Antes do início da prova, ativistas da organização chegaram de parapente a motor (vejo aí uma possível contradição que não consegui confirmar. Afinal, se usaram motor a combustão… mas, vá lá) e colocaram um primeiro cartaz de vários metros de altura na arquibancada principal. Dias antes, haviam instalado cartazes que foram acionados remotamente durante a prova – um deles na hora da premiação, onde se lia “salvem o Ártico”. Durante as entrevistas, ainda no pódio, uma ativista fez rapel no prédio dos boxes para uma mulher fez um rapel no terraço do Paddock Club, para estender um pequeno cartaz onde se lia: “Parabéns, agora nos ajudem a salvar o Ártico”. Tudo devidamente ocultado na transmissão oficial — provavelmente como se faz no futebol quando há uma invasão do campo, que não se transmite para não dar visibilidade e que eventualmente sejam repetidas ações deste tipo. Incrível mesmo é como tantas ações foram realizadas burlando toda a segurança (?) da Fórmula 1. Segundo o Greenpeace, 35 de seus membros invadiram de diversas maneiras o circuito de Fórmula 1 naquele dia e os dois ativistas que entraram no Paddock Club tiveram que pagar 3.400 euros cada para ter acesso ao terraço. O público se dividiu entre os que aplaudiram e os que vaiaram o protesto, mas os pilotos não entenderam absolutamente nada do que estava acontecendo. Vettel, em entrevista no pódio, resumiu: “Estamos um pouco confusos aqui porque a multidão está vaiando e torcendo e não entendemos o porquê.”
China 2009
Errar o hino do vencedor é um clássico em qualquer solenidade de premiação, de qualquer tipo. Um dos exemplos foi na primeira vitória da na festa da Red Bull e ainda com um segundo lugar também. É que faltou combinar com a organização da prova que soltou o hino “God save the queen”, da Grã-Bretanha, em vez do austríaco — a nacionalidade da escuderia. Mas se existe vingança de hino, a maldição atingiu Sebastian Vettel, que machucou o dedo ao levantar a taça do vencedor.
Áustria 1977
Outro caso em que troca de hinos surpreendeu e foi levado na esportiva por pelo menos duas pessoas. Alan Jones, correndo para a Shadow, ganhou o GP da Áustria de 1977. “Os organizadores obviamente não esperavam que isso acontecesse porque eles não tinham o hino nacional australiano”, lembrou o piloto anos atrás e, bem humorado, completou: “Então, algum bêbado tocou ‘Parabéns pra você ’no trompete'” Como curiosidade, a corrida foi em agosto e o piloto havia nascido em novembro.
Mônaco 1982
Aconteceu de tudo nos últimos minutos deste Grande Prêmio, que chegou a ter quatro pilotos no pódio. A apenas três voltas da bandeirada, o líder Alain Prost bateu com seu Renault. Com isso, Riccardo Patrese, da Brabham, herdou a primeira posição, mas rodou e cedeu o lugar para Didier Pironi que na última volta teve problemas mecânicos e deixou a Ferrari sem nenhum representante, pois correra com um único carro, duas semanas depois da morte de Gilles Villeneuve. Assim, o vencedor deveria ter sido Andrea de Cesaris, mas o Alfa Romeo do italiano ficou sem combustível antes que ele ultrapassasse Pironi. O seguinte na pista seria Derek Daly, mas ele havia danificado a caixa de câmbio de seu Williams e esta travou antes que o irlandês abrisse a volta final. Patrese aproveitou uma descida da pista, conseguiu fazer com que seu carro pegasse e cruzou a linha de chegada, ao que tudo parecia, em primeiro lugar. Mas a confusão só aumentou quando Elio de Angelis cruzou a linha de chegada — mas ele estava uma volta atrás. Chegou a ir para o pódio, num total de quatro pilotos presentes para somente três degraus, mas depois de algum tempo, o VAR da F-1 da época deve ter percebido o erro e conduziram Patrese para o lugar mais alto. Atrás dele terminaram Pironi (segundo) e de Cesaris (terceiro). De Angelis terminou em quinto e Daly ficou em sexto lugar. O comentarista da BBC e campeão mundial de 1976, James Hunt, na época disse: “Bem, temos essa situação ridícula em que todos estamos sentados na linha de chegada esperando que um vencedor passe, e parece que não estamos conseguindo nenhum. “.
Canadá 1978
Estourar uma garrafa de champagne é a imagem mais clássica do pódio da F-1, mas talvez a garrafa mais incomum já aberta para isto tenha sido aquela que deram a Gilles Villeneuve após sua vitória, em casa, em 1978. A pedido dos patrocinadores da corrida, o canadense recebeu uma garrafa gigante da cerveja local. Ele, obedientemente, fez todo o cerimonial como se fosse espumante. Toda a cena ficou ainda mais insólita pois era outubro, fazia muito frio e Villeneuve vestia um casaco enorme.
Mudando de assunto: com uma prova tão cheia de exceções como foi a de Spa-Francorchamps domingo passado, não podia deixar de notar este ótimo meme:
NG