Bem no começo dos anos 1980 fui a uma loja de ferramentas aqui em São Paulo comprar um torquímetro.. Escolhi um e disse ao vendedor que ia levá-lo. Ele então me disse que precisaria esperar um pouco pela nota fiscal, demoraria porque “agora é extraída por computador”. Não acreditei no que ouvi.
O computador pessoal revolucionou o mundo por um único motivo; utilidade
Nos muitos salões do automóvel internacionais a que fui as informações sobre os carros expostos eram fornecidas em papel — os chamados ‘presskits’ — estes contendo fotos em papel. O volume total desse material era tão grande que era comum os expositores oferecerem malinhas com rodas para colocar o material recolhido nos estandes e transportá-lo enquanto se visitava a mostra.
E não parava aí. O descomunal volume de material era um problema para os jornalistas no voo de volta para casa, colocar tudo em malas para ser despachada como bagagem acompanhada. Por isso era regra não escrita o organizador do salão fechar acordo com uma empresa de courier, como DHL ou Fedex para levar tudo para os jornalistas, do salão até a redação em seu país.
O meio eletrônico veio facilitar de maneira notável essa parte. Foi útil. Foi desnecessário barrar o meio impresso e as fotos em papel pelo simples motivo de utilidade. Do papel os presskits passaram aos discos compactos (CD), depois os pen drives, até chegar aos simples cartões de visita com o url do site da fabricante e até o QR Code dele.
O computador foi pródigo em rodar editores de texto, levando as máquinas de escrever a virarem peça de museu apenas por questão de utilidade para escrever qualquer coisa. Proibi-las? Para quê? Lembro-me de quando comecei a usar computador ao entrar para a Quatro Rodas em 1992. Que coisa fantástica não precisar mais usar a máquina de escrever!
A não ser por saudosismo, alguém ainda usa caneta-tinteiro? E parquímetros? E telefones públicos? E call boxes nas rodovias? Tudo inútil hoje. Sem ter sido necessário proibi-los. Lembra-se dos “operadores de veículos de deslocamento vertical”, como são (ou eram) chamados os ascensoristas do governo americano?
O assunto modernidade, é claro, em especial num site como o AE, traz à baila o assunto automóvel. E carro elétrico.
Ninguém em sã consciência pode negar a eficiência do motor elétrico comparada com a do a combustão interna. Desnecessário ir muito longe, basta pensar nas aplicações conhecidas desse tipo de motor: locomotivas em geral, TGV, metrô, elevadores, refrigeradores, lavadoras de roupas, portões de garagem, todo tipo de máquinas industriais; a lista é grande.
No início do século 20 os dois tipos de propulsão dos automóveis erram concorrentes, fato bastante conhecido. O carro elétrico sucumbiu ao a combustão por um único motivo: a fonte de energia por bateria, restrita e que demandava tempo para recarregá-la. Faltou-lhe o elemento utilidade.
Independente do motivo alegado para a corrida tresloucada ao carro elétrico (CO2, mudanças climáticas), a indústria falhou completamente ao não eliminar no “novo carro elétrico” o fator inutilidade, qual seja, o alcance limitado e demora para recarregar a bateria, apenas mitigando-os por meio de baterias cada vez maiores, pesadas e sobretudo mais caras.
Digo que a indústria falhou porque colocou a carroça antes do cavalo, ou seja, começou pelo fim, pelo motor elétrico e pelo carro, que não precisavam de desenvolvimento, em vez de antes resolver a questão da bateria para que a modernidade tivesse (real e irrestrita) utilidade, como a do carro com motor a combustão.
Coisa típica de terem produzido excelentes produtos (que são realmente) para depois se perguntarem, “E agora, como é que vai ser?”
BS