Existe uma máxima no meio automobilístico que prega que é melhor uma lubrificação errada do que não ter nenhuma. Hoje em dia não é bem assim. Utilizar um óleo diferente daquele especificado pelo fabricante do veículo pode causar seríssimos danos ao motor ou ao câmbio, seja ele manual, automático ou robotizado. E, claro, para aqueles carros de tração traseira, a lubrificação do diferencial também é fundamental.
Quais os riscos? É o de termos reduzida drasticamente a vida útil do trem de força, de maneira irreparável: as vezes, o desgaste é tão acentuado que exige a troca das principais peças de motor ou câmbio que, nem é preciso falar, são bem caras. O custo de um reparo desses é bastante alto. Por isso, o pior negócio que um dono de automóvel pode fazer é o de tentar economizar com lubrificação, pois essa pequena economia tende a acabar saindo bem cara num futuro próximo.
Basicamente, são três tipos de lubrificantes automobilísticos: mineral, semisintético ou 100% sintético. Os primeiros são derivados do petróleo, partindo desde o óleo mineral puro, sem nenhum aditivo (especificação API SA), até chegar aos óleos minerais com aditivação avançada do tipo SK ou SL. Os semissintéticos são uma mistura: a base oleosa é mineral, de um óleo puro, e aditivação é feita a partir de aditivos sintéticos, que misturados a base mineral, criam esses lubrificantes “intermediários”.
Já os 100% sintéticos se baseiam nos elementos químicos e ésteres, com aditivação, que é totalmente química, com formação de lubrificantes quase perfeita. Esses são os mais indicados para as lubrificações mais críticas, quer seja na temperatura, carga ou ambos. Perfeitos, mas mais caros que os de origem mineral.
Há casos clássicos. Um deles é o do motor cinco-cilindros utilizado pelos Fiat Marea e Marea Weekend, que hoje são execrados como motores frágeis, de pouca durabilidade e com alta incidência de problemas. Falha do projeto do motor? Não! Seu problema mesmo eram os erros de lubrificação, inclusive os induzidos pela própria Fiat. No manual do carro, recomendava-se a utilização de um lubrificante sintético, que atendesse uma determinada especificação (API SJ 10W40), com grandes intervalos de trocas (outro erro). No dia a dia, as pessoas utilizavam um óleo mineral, API SE 20W50, e faziam as trocas a cada 20 mil quilômetros Tudo errado.
O fato é que, de três a seis meses depois, o motor começava a ficar ruidoso e, principalmente a lubrificação de mancais e bielas sofriam. Logo o motor começava a “rajar”, ou seja, produzir ruídos metálicos em determinadas faixas de rotação, deixando claro que um desgaste acentuado e anormal havia ocorrido. Claro que a culpa não era do Fivetech de cinco cilindros, mas sim da lubrificação incorreta que causava desgaste prematuro de todos os componentes móveis.
Explico: no projeto de um motor, existe o que os engenheiros e técnicos chamam de galerias. Esses são os caminhos que o óleo percorre dentro do bloco e cabeçote, até chegar as partes a serem lubrificadas. Além do diâmetro dessas tais galerias, existem também as folgas entre os componentes que se atritam. É importante ressaltar que a fluidez de um lubrificante de origem mineral, por esses dutos de passagem, é diferente do comportamento de um óleo sintético nas mesmas condições.
Como nas últimas décadas o maquinário de usinagem dos motores nas fábricas ficou bem mais eficiente, e o ajuste entre as peças móveis muito mais preciso, há exigência de um lubrificante sintético que chega rápido e passa por todos os pontos a serem lubrificados, por mais justos que eles sejam. Se, por esses caminhos e pontos, precisar passar um lubrificante mineral, com fluidez mais difícil, ele demorará muito mais tempo para chegar no local que precisa, e terá dificuldades em alcançar os menores locais das peças em atrito.
Nesse caso, temos uma lubrificação deficiente e incorreta, com danos ao componente em curto espaço de tempo. Por isso, nunca substitua o lubrificante sintético por outro mineral, por mais próximas que sejam as especificações. Suas características de circulação dentro do motor e nas partes que precisam de lubrificação são totalmente distintas. Só quem desenvolveu o motor, juntamente com o fabricante de lubrificante, sabe exatamente o óleo correto a ser usado.
No caso do câmbio, ou do eixo traseiro com diferencial se for o caso, a história é exatamente a mesma. Um lubrificante mineral, mesmo que adequadamente aditivado, pode ter rompido o seu filme lubrificante entre os dentes das engrenagens, se não houver o espaço e a folga correta para o lubrificante evitar o contato entre as partes metálicas. Nos câmbios e diferencial também é preciso usar o óleo correto, por mais tentador que seja o preço mais baixo dos lubrificantes minerais.
Os lubrificantes minerais atendiam muito bem as exigências da indústria automobilística quando as folgas e a qualidade de usinagem dos componentes eram diferentes das de hoje. Atualmente, além da precisão de funcionamento e o espaço justo entre os componentes de um trem de força, há também a dureza dos metais, que tem camada cada vez mais fina, exigindo lubrificação correta e sem falhas. Nos manuais de instrução de cada carro estão as especificações corretas para essas trocas, ou, senão, uma rápida, e confiável, busca pela internet vai lhe trazer as informações corretas.
Um caso à parte é o dos câmbios automáticos, que também estão bem mais frequentes no mercado brasileiro, quer seja nos carros nacionais ou nos importados. Para a grande maioria dos consumidores, o câmbio automático passa a impressão de que não requer nenhum tipo de manutenção, justamente por ser automático. Errado! Hoje, o reparo de uma caixa automática pode até ser mais caro que o preço do próprio carro, e passa do preço de um reparo no motor. Isso se deve ao maior valor dos seus componentes, e à manutenção especializada mais cara nos serviços.
Com óleo incorreto em seu interior, o câmbio automático pode simplesmente deixar de funcionar. O carro nem chega a sair do lugar. Nos casos menos graves, ele entra em modo de emergência e limita velocidade do carro e rotação do motor, fora que, antes disso, comportamentos anormais podem aparecer: trancos na saída ou nas trocas, erro de tempo nas passagens de marchas, lentidão na operação e por aí vai.
Lembro-me de um desatendo dono de Audi que resolveu trocar o fluido do câmbio automático de seu carro num posto comum do litoral de São Paulo. O desinformado frentista subiu o carro no elevador, esgotou o óleo velho, e colocou nele um óleo de câmbio comum. O resultado prático é que o carro alemão sequer saiu do elevador, pois o sistema eletrônico detectou a falha e não engatou nada após entrar em modo de segurança, evitando danos ainda maiores.
Teve que sair de lá guinchado direto para uma concessionária da marca na capital, que precisou esgotar o óleo errado, fazer uma limpeza interna no câmbio, ressetar todos os erros da central eletrônica e, só aí, trazer o carro de volta à vida. O custo de toda essa operação eu nem preciso dizer, muito alto, fora o arrependimento de seu proprietário, que certamente nunca mais se atreverá a fazer uma manutenção tão importante em locais não adequados. Por essas e outras, não ande com o fluido vencido no câmbio: o risco é grande.
O mundo das lubrificações já está tão específico que já se criaram até lubrificantes para cada tipo de aplicação, a exemplo dos óleos para carros híbridos. Eles são sintéticos, têm baixa viscosidade (0W20) para proporcionar eficiência mecânica e atendem às novas especificações API SP. Os motores a combustão dos híbridos têm operação peculiar. geralmente funcionam com menor variação de rotação, funcionam em alta rotação mesmo frios (todo híbrido inicia marcha pelo motor elétrico) e ligam e desligam com frequência durante o percurso. Um desses óleos é o Motul NGEN Hybrid, lançado ontem no Festival Interlagos 2023.
Isso é só para que se tenha uma ideia da especificidade dos lubrificantes, quer sejam os de motor ou os de engrenagens, e serve como prova cabal que óleo não é tudo igual: tem um para cada tipo de carro, trem de força e utilização. Fique atento!.
DM
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