Quando o álcool chegou aos postos em 1981, passada a fase inicial da lambança de motores a gasolina convertidos para álcool por retíficas autorizadas pelo Conselho Nacional do Petróleo (CNP), a partir daquele ano o álcool pegou para vale, com a indústria passando a fabricar carros para o combustível alternativo.
Mas como bem sabemos, o carro a álcool não pegou pelos seus lindos olhos, mas por incentivos fiscais e pelo preço do litro 40% inferior ao da gasolina, combinado com liberação para abastecer nos sábados, domingos e feriados, proibido para carros a gasolina.
Como naquele tempo os preços eram nacionais e controlados, quando a venda de combustíveis era proibida entre 20h00 e 6h00, surgiu a “Gozação Nacional”, que era quando o grande Cid Moreira anunciava aumento dos preços dos combustíveis às 20 horas no Jornal Nacional com um indisfarçável sorriso deixando muita gente frustrada, para não usar uma expressão chula, por não poder abastecer com preço antigo, pois postos fechavam às oito da noite.
O carro a álcool deslanchou de tal forma que o XR3, em 1983 passou a ser oferecido em versão a álcool somente.. Naquele ano do domínio do carro a álcool foi esmagador,: 70.837 contra 538.834. só 11,6% eram a gasolina (fonte: Anfavea). O domínio prosseguiu até 1989, quando a participação do carro a gasolina subiu para 39,1%. Motivo, falta de álcool no último quadrimestre do ano. Causa? A indústria sucroalcooleira auferiu mais produzindo mais açúcar do que álcool. O país, o consumidor? Ora, país e o consumidor que se danassem — de novo evito partir para o chulo que tanto me dá vontade. Exprime melhor a sem-vergonhice dos usineiros..
Em 1990 as vendas de carros a gasolina subiram com força e a participação dos carros a álcool desabou para 13,1%, Houve um repique do álcool para 21,4% em 1991 e 27,5% em 1992, terminando com 8,% em 2002.
Vale ressaltar que em março de 1992 houve um conflito no Oriente Médio, a Bósnia-Herzegonia querendo se tornar independente da Croácia. O afoito do Collor determinou regime de fechamento de postos achando que ia faltar petróleo. Só que no dia seguinte ao do início do conflito o preço internacional do barril caiu de 32 para 19 dólares e Collor deve ter ficado com cara de nádegas…. O fato gerou queda abrupta do prelo da gasolina é foi aí que o carro a álcool foi sepultado. E Collor renunciaria em dezembro para não sofrer impeachment, o vice Itamar Franco assumindo.
“Tenho uma ideia”
Um pouco antes, em 2001 ou mais cedo,, numa hipotética reunião da mesa diretora da Unica (União da Indústria da Cana-de-Acúcar) alguém deve ter dito “tenho uma ideia para voltarmos a vender álcool como antes!”. Explicou que os Estados Unidos enfrentavam sério problema de dependência — mais de 50% — do petróleo do Oriente Médio, era um problema de segurança nacional e que haviam feito um plano de obter álcool de milho, para isso incentivando agricultores do Meio-Oeste a plantar mais milho do que já plantavam, conhecido por Coalition for Ethanol (Calisão para o Etanol). Desse modo, boa parte da frota americana de novos carros a álcool, passaria a rodar sem queimar gasolina, diminuindo a dependência do petróleo árabe.
— Mas, e se faltar álcool? Como vai ser? O país é enorme e despende do automóvel!
— Ah, ra! Elementar: a Ford fez um modelo em 1993 que funciona tanto com gasolina quanto com álcool. que chamam de Flexible Fuel Vehicle (Veículo Flexível em combustível).
— Então quer dizer que se a indústria produzir carros assim aqui pode faltar álcool que não teremos o problema de 1989, já que é só rodar com gasolina?
— Bingo!
Reunião encerrada.
Em 20 de março de 2003 a Volkswagen lançava o Gol 1.6 Total Flex com tecnologia Marelli e o anúncio na mídia era coassinado pela Unica.
Em 2022 foram licenciados 1.482.037 automóveis dos quais 1.437.719 flex (97%), 44.286 a gasolina (3%) e, acredite, 32 a álcool (0,00005%). Mas se só 30% dos donos de carro flex abastecem com álcool, é sinal de que a ideia não foi assim tão boa e tiveram que apelar para Brasília para dar uma força com mais álcool na gasolina do que o absurdo que já é. Mas, e os consumidores, com ficam nessa? Não preciso escrever, o leitor já leu o meu pensamento….
Se isso não é falsidade ideológica, não sei mais o que a expressão significa.
Ah, uísque não casa com cachaça (foto de abertura), assim como gasolina não casa com álcool.
Mas, o que tem o título a ver com a matéria? Simples. Quem tem carro a gasolina não se preocupa em só poder usar gasolina. O mesmo para veículos a diesel, só este combustível e mais nenhum. Carro só a álcool, nem pensar. Mas motor ciclo Otto, só se for flex. Não sei como se aceita carro elétrico…
O brasileiro é ou não um povo sui-generis?
BS
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