A função precípua das câmaras legislativas dos três níveis de administração — federal, estadual e municipal —é analisar e aprovar leis que tenham como principal objetivo defender os interesses da população. Para isso os legisladores são escolhidos pelo sufrágio universal, o voto popular. Todavia, nem sempre é o que acontece aqui.
Dois exemplos disso são recorrentes aqui no AE, a lei que obriga a gasolina conter porcentual elevado de álcool anidro (ou etanol anidro, como a ANP resolveu denominar o combustível em 2009), e a lei que proíbe ingerir bebida alcoólica e dirigir, apelidada de lei seca.
A primeira recorrência é a questão da gasolina brasileira, única do mundo em que ¼ dela é álcool —gasolina premium, pois na gasolina normal é 27%. O interesse da população foi flagrantemente ignorado, uma vez que a mistura tem poder calorífico menor e o resultado só pode ser um: maior consumo de combustível.
Fora o singular fato de a gasolina brasileira se diferente das dos países que compõem o Mercosul — Argentina, Paraguai e Uruguai — uma aberração em si só e junto com outra, haver “Estados Associados” ao Mercosul, que são Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Peru e Suriname. A Venezuela também passou a fazer parte deste mercado comum , mas está suspensa dos seus diretos e deveres por motivo mais do que óbvio, uma ditadura travestida de democracia.
A singular gasolina brasileira, além de ir contra os interesses dos brasileiros pela simples questão do consumo maior. é imoral no sentido dos automóveis não funcionarem bem ao circularem fora do seu país. A importante mistura ar-combustível fica rica daqui para lá e pobre, ao contrário.
E tem o pior, inadmissível fato de as homologações dos veículos, inclusive importados, para poderem ser incluídos no Registro Nacional de Veículos Automotores (Renavam), imprescindível para serem licenciados no Brasil, ser feita, com gasolina-padrão da indústria automobilística, a que contém 22% de álcool (E22). É surreal.
Lei seca
Essa é a outra recorrência no AE. Essa lei, aprovada em 19/06/2008, bateu de frente com o interesse da população. Foi aprovada pelo Congresso sem nenhuma base ou estudo que comprovasse que a pessoa que ingere pequena quantidade de bebida alcoólica fica incapaz de dirigir, torna-se um risco para si e para o trânsito. Como se os graves acidentes que aconteciam (e continuam a acontecer) fossem dissociados de motoristas “de porre”, como popularmente se diz para descrever um bêbado.
Os deputados desconheciam — aposto todas as minhas fichas nisso — existir instrumento legal para punir severamente quem, bêbado, fosse flagrado dirigindo, com a promulgação do Código de Trânsito Brasileiro em 23/09/1997, suficientemente claro e preciso a esse respeito.
Uma lei tão absurda que atingiu até sacerdotes da igreja católica por ingerirem vinho como parte do sacramento da eucaristia. Bem recentemente, quem se alimenta com pão de forma está “dirigindo sob efeito de álcool” pelo que diz o etilômetro, popular bafômetro.
E tome lei para impor multas estratosféricas para quem for apanhado com alcoolemia (álcool no sangue, acusado pelo ar dos pulmões) de até 0,33 miligramas de álcool nesse ar, limite ridículo criado por uma lei igualmente ridícula. No CTB original esse limite era 0,03 miligramas, 9 vezes mais do que é hoje, e éramos perfeitamente aptos a dirigir, não estávamos “sob efeito de álcool”. Que estrago que uma canetada é capaz de fazer!
Mais surpreendente ainda é o Detran do Estado de São Paulo distinguir dirigir sob efeito de álcool de dirigir embriagado, como se fossem condições diferentes.
Parece que Sua Majestade, o povo, anda meio esquecido!
BS
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