Comparativos que criticavam os preços dos nossos automóveis não levaram em conta a defasagem de mais de treze anos da cotação do dólar
Sumiram do mapa os internautas que faziam contas, comparavam tabelas de preços, analisavam conversões cambiais e consultavam mapas internacionais de vendas para elaborar “manifestos” sobre a diferença de preços entre automóveis no Brasil e em outros países. Alguns se deliciaram com matéria publicada pela revista americana Forbes ironizando o brasileiro que pagava US$ 80 mil por um Jeep Cherokee, três vezes mais que seu custo nos EUA. Não percebiam que, com a distorção cambial, Miami passou a concorrer com o Paraguai e atrair sacoleiras e noivas brasileiras que montavam enxoval.
Qual distorção? No caso dos automóveis nacionais, quando circularam estes comparativos há três ou quatro anos, o dólar estava em baixa e cotado por menos de dois reais. A moeda norte-americana valia, em maio de 2012, menos que sua cotação em maio de 1999! Os R$ 30 mil que se pagava na época por um carro brasileiro correspondiam a quase U$ 17 mil. Hoje, os mesmos trinta mil reais valem menos que U$ 10 mil, o que jogou por terra todas os inflamados textos sobre a ganância da indústria automobilística brasileira. A valorização do dólar praticamente equiparou preços dos nacionais com seus similares em outros países.
O Nissan Versa SL produzido em Resende (RJ), por exemplo, é tabelado por R$ 49.760, mas custa R$ 54.388 nos EUA. O VW Cross up! custa no Brasil R$ 40.592 contra R$ 48.130 na Alemanha.
Voltando ao Jeep, a Forbes poderia retomar o assunto com os importados, mas não com os nacionais: a Chrysler acaba de lançar o Jeep Renegade produzido em Pernambuco que sai, na versão mais sofisticada (Trailhawk, 2.0, Diesel, 4×4, automático), por R$ 116.900. A mesma versão custa R$ 113.488 na Europa. Nosso Fiesta Hatch 1.6 é vendido por R$ 57.549. Nos EUA, por R$ 56.629.
A realidade cambial não só mudou o panorama para os importados nesse caso, a distorção até se agravou com os 30 pontos porcentuais no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), contrariando acordos internacionais de comércio que condenam tratamento tributário diferenciado entre carros produzidos localmente e importados. Automóveis com carga de IPI adicional, por seus fabricantes não terem operação de manufatura no Brasil, desembarcam custando duas a três vezes o preço no país de origem.
Não se trata de defender os fabricantes no Brasil. Quando podem, eles enfiam mesmo a mão e sua rentabilidade chegou a ser uma das maiores do mundo. Mas hoje, com dezenas de fábricas instaladas e estoque de quase 50 dias nos pátios…a conversa é outra.
É até difícil entender como pode um modelo nacional ter preço semelhante ao de um similar produzido no exterior, pois “Custo Brasil” não é apenas argumento de executivo na entrevista com a imprensa, mas peso-pesado nos cofres de qualquer empresa, principalmente na indústria automobilística. É a infra-estrutura portuária em frangalhos, o custo da energia elétrica, a malha rodoviária que dispensa comentários e encarece o transporte, os pesados encargos salariais e a inexplicável e astronômica carga tributária. Como comparar um automóvel nacional que paga, em média, 30% de impostos entre IPI, ICMS, PIS, Cofins e outros, com um produzido nos EUA que contribui com 6% (IVA)? Ou com um europeu que paga 14% de impostos na Espanha, 17% na Italia? Ainda assim, bastou o dólar atingir cotação coerente com outros indicadores da economia brasileira para nossos carros deixarem de ser “os mais caros do mundo”. E das noivas e sacoleiras irem se abastecer em Miami.
BF