Como vimos na primeira parte desta matéria, o desenvolvimento do novo modelo da Kombi começou em 1960 na Alemanha, foi interrompido ainda nesse mesmo ano, foi retomado em 1964 e o produto final, a segunda geração da Kombi, chamada T2 e batizada de Clipper em seu modelo topo de linha, foi lançada em agosto de 1967 na Europa e nos Estados Unidos. E no Brasil? Como foi a “gestação” da Clipper brasileira? Por que ela foi chamada de “T1,5” pelos técnicos alemães e os da Volkswagen do Brasil contemporâneos ao seu desenvolvimento? É o que vamos ver nessa segunda parte, que também contou com a colaboração de Hugo Bueno.
Recebida direto da Alemanha para o Brasil da década de 1960, mais precisamente no ano de 1967 num momento em que a transmissão de informações ao redor do mundo não possuía as mesmas facilidades de hoje, a primeira nota informando o lançamento do novo modelo da Kombi na Europa foi publicada no jornal O Globo no dia 11 de agosto. Ela dizia: “Nôvo pára-brisas, novas portas e um motor traseiro de 1600 cc são os aspectos mais importantes da nova camioneta que a Volkswagen acaba de apresentar na Europa. Os demais dados técnicos não acompanharam o texto da radiofoto acima, transmitida momentos após a apresentação da camioneta à imprensa.” (a ortografia da época foi mantida).
A imprensa brasileira recebeu uma foto de baixa qualidade e faltando informações básicas sobre o modelo, pois não havia nenhuma evidência sobre o novo nome de batismo ou sobre as características técnicas de forma mais detalhada.
O ano de 1967 foi um ano de novidades para a Kombi brasileira. Enquanto a Europa e os Estados Unidos ganhavam um novo modelo, de concepção mais moderna, a T2, por aqui o modelo de primeira geração, a T1, permanecia em evolução. Nesse ano, a Kombi ganhou o novo motor de 1.493 cm³ e 44 cv (compartilhado com o Karmann-Ghia) e foi introduzida no mercado a versão Pick-up, ainda com a carroceria de madeira, que se juntou aos modelos Standard, Luxo, Seis Portas, Furgão e Ambulância para compor o portfólio de utilitários fabricados pela Volkswagen para o mercado brasileiro.
Somente em 1969 a imprensa voltava a noticiar a possibilidade de a Volkswagen lançar no mercado brasileiro uma nova geração da Kombi. Em 21 de junho de 1969, O Globo publicou uma matéria intitulada “Volkswagen prepara Kombi mais potente“, a qual traz informações sobre o possível lançamento da Kombi Clipper no Brasil já em 1970, aproveitando o lançamento da Variant previsto para esse mesmo ano.
Algumas informações procediam, mas outras não estavam de acordo com o modelo que rodava na Europa e nos Estados Unidos. Por exemplo, o aumento de exagerados 60 centímetros no comprimento, a manutenção da largura das bitolas e a possível utilização do motor plano da Variant foram afirmações um tanto quanto equivocadas. Havia uma grande expectativa por um acabamento mais requintado, principal característica do modelo Clipper, com bancos dianteiros individuais além da novidade da porta lateral corrediça, o que facilitaria muito o transporte de passageiros e de carga.
Ainda em 1969, a revista Quatro Rodas de outubro publicava a nota “Outra provável surpresa para 1970: uma nova Kombi”, considerando também a possibilidade de lançamento do modelo alemão no Brasil. É interessante que ainda no final da década de 1960 o mercado tinha esperanças de que a Volkswagen produzisse no Brasil a mesma Kombi luxuosa recém-lançada no mercado alemão, ainda que a fábrica negasse a possibilidade de fabricá-la por aqui.
Sobre a nota da Quatro Rodas acima, especificamente a citação de várias unidades terem sido vistas rodando na pista de testes da Vemag, ocorre que após a aquisição da Auto Union pela Volkswagen — compra que refletiu aqui no Brasil com a compra da Vemag, que fabricava o DKW-Vemag — suas instalações no bairro do Ipiranga passaram a ser a Fábrica 2 da Volkswagen, que por um tempo abrigou a engenharia da VW brasileira.
Em 1970, mais uma vez o possível lançamento da Kombi Clipper brasileira foi explorado por Quatro Rodas na edição de junho. Ao lado da Ford Club Wagon, a matéria dava como certa a apresentação destes dois modelos concorrentes no VII Salão do Automóvel previsto para novembro daquele mesmo ano. “É praticamente certo que a Volkswagen lançará a nova perua”, dizia um trecho da matéria em que a descrição do novo modelo brasileiro era exatamente igual à Kombi Clipper alemã de 1968. O modelo da foto, importado da Alemanha, foi fotografado nas dependências da fábrica da Volkswagen do Brasil, que informou à época que aquela unidade seria para “uso da fábrica”, mas, segundo a revista, daquele “modelo para uso próprio” foram vistos vários na pista de testes da ex-Vemag.
Ainda em agosto de 1970, o jornal O Globo publicou uma nota sobre as novidades que a Volkswagen preparava para 1971. Além do Fusca 1500, do VW 1600 TL e do Karmann-Ghia TC, mais uma vez é citado o possível lançamento da Kombi Clipper cuja principal característica seria a “porta corrediça”, como no modelo alemão. O mercado ansiava por essa novidade, pois esse modelo de porta era naquela época considerado uma grande evolução, pois facilitaria muito as operações de carga e descarga, tarefas corriqueiras de quem utilizava a Kombi no dia a dia. A dúvida naquele momento era se a linha 1971 seria lançada antes ou por ocasião VII Salão do Automóvel, em novembro. Mas os novos modelos acabaram mesmo sendo lançados em agosto, confirmando como novidades o Fusca 1500 (“Fuscão”), o TL e o TC, ficando a Kombi Clipper excluída desta lista.
O VII Salão do Automóvel, realizado de 21 de novembro a 6 de dezembro de 1970, passou a ser realizado no Anhembi, espaço utilizado especialmente para abrigar feiras e eventos ligados à indústria.
Na foto do grande estande da Volkswagen podemos ver as novidades para 1971, exceto a Kombi Clipper. A linha Kombi permanecia ainda na primeira geração, a T1.
Dois anos após a última matéria sobre a Kombi Clipper, a Quatro Rodas voltava a destacar, agora em matéria de capa, na edição de junho de 1972: “Está pronta a nova Kombi”. O texto da seção “Segredo das Fábricas” citava o provável lançamento da Kombi Clipper nacional somente em 1974 e ela seria tal qual o modelo alemão. A apresentação de um protótipo poderia ocorrer já no VIII Salão do Automóvel de 1972. A matéria cita que o novo modelo seria produzido na nova fábrica de Taubaté, cujo início da obra havia sido anunciado pela VW em março de 1972. Nada disso ocorreu: a fábrica não ficou pronta, não houve a apresentação do protótipo no Salão de 1972, nem o lançamento para vendas em 1974, aumentando cada vez mais a defasagem da Kombi brasileira em relação à alemã.
Abaixo, a reprodução da capa e a matéria da revista Quatro Rodas de junho de 1972 mostrando fotos do modelo que a Volkswagen estava utilizando no desenvolvimento da nova Kombi para o mercado brasileiro.
Pelas fotos não é possível distinguir se modelo é a T2 mais simples, chamada simplesmente de Kombi na Alemanha, ou a Clipper, o modelo de topo da linha Kombi. Havia uma tendência de aqui no Brasil o nome Clipper ser utilizado de maneira genérica para a nova geração.
Abaixo, com resolução maior, o gráfico desta matéria que destaca o que seriam as diferenças da Clipper para a Kombi 72. Apesar dos esforços dos repórteres investigativos da Quatro Rodas, nem sempre seus furos de reportagem estavam corretos:
Em agosto de 1974, novamente a revista Quatro Rodas publicava na seção “Segredo Exclusivo” mais uma matéria mostrando “Quatro segredos da Volks para 75”.
Entre eles, mais uma vez, a nova Kombi tinha destaque. A publicação cita que o projeto da nova Kombi demorou porque a Volkswagen precisou esperar que a fábrica de Taubaté fosse instalada e reforça dizendo que o desenvolvimento dessa nova geração “foi um dos projetos mais demorados da VW brasileira”, pois em outubro de 1969 a edição nº 111 já publicava que a Volkswagen realizava os primeiros estudos aqui no Brasil. Ou seja, considerando o período entre o lançamento da T2 na Alemanha em agosto de 1967, e aquele momento, agosto de 1974, já haviam se passado sete anos, fazendo com que a moderna Kombi Clipper alemã fosse ficando madura! Pelas fotos publicadas na matéria é possível verificar que àquela altura a Volkswagen já pensava em lançar no Brasil um modelo híbrido considerando as gerações T1 e T2 alemãs, pois misturava características do modelo antigo e do modelo novo em um, podemos dizer, terceiro modelo. Mais uma vez existe a expectativa da apresentação da nova Kombi no IX Salão do Automóvel em novembro de 1974, o que acabou não acontecendo. Contando com esse já eram três edições do Salão do Automóvel em que se esperava o lançamento da nova Kombi!
Nesta matéria são feitas algumas especulações sobre a diferença entre os modelos. A Kombi azul, com as luzes de direção dianteiras retangulares mais avantajadas e entradas de ar para o motor nas colunas traseiras seria o modelo de “Luxo”, enquanto que a vermelha, com luzes de direção dianteiras quadradas e vidros curvos indo das estreitas colunas traseiras à traseira propriamente dita seria o modelo Standard. O interessante é que a pintura branca do teto na Kombi vermelha, dita Standard, remetia diretamente às primeiras Clipper-L lançadas na Alemanha. Este tipo de pintura já havia sido mudado na Alemanha em 1971, quando o segundo tom de cor alcançou a lateral pouco abaixo da linha dos vidros.
Outro ponto interessante foi a utilização do retrovisor externo no lado direito, não obrigatório na época. Logo, podemos inferir que os protótipos fotografados não poderiam, de maneira alguma, ser considerados como produto final, pois havia ainda a expectativa de ajustes finais. Como o modelo Pick-up também foi flagrado percebia-se a intenção da Volkswagen em estender as modificações para todas as versões da linha Kombi.
Chegamos a 1975, o ano do lançamento desse tão esperado modelo no Brasil. Mas seria uma Clipper mesmo? Em maio de 1975 o jornal O Globo publicou mais uma nota citando o lançamento da Kombi Clipper no Brasil, destacando que a mesma já era utilizada há vários anos na Alemanha e nos Estados Unidos. Não entrou em detalhes do que seria modificado em relação ao modelo antigo, mas a comparação com o modelo alemão, já em linha havia quase oito anos, era inevitável. A essa altura, na Alemanha a denominação Clipper já não era nem mais utilizada.
O jornal O Globo voltou a publicar em agosto de 1975 uma nota informando que a “VW prepara duas novidades para setembro”. Uma delas era a Kombi Clipper, cujo nome a própria matéria informa que ainda não era definitivo. Pela foto, já é possível ver a nova Kombi em sua configuração final, realmente um híbrido considerando a T1 e a T2 alemãs. O texto da matéria é perfeito em relação à descrição, exceto sobre a possibilidade de uma motorização 1.700-cm³, que nunca existiu para a Kombi aqui no Brasil e sobre o opcional dupla-carburação, o qual passou a ser oferecido somente no segundo semestre de 1978. Vai também aumentando a certeza que a designação Clipper foi usada no Brasil de forma genérica e não para diferenciar o modelo que seria o topo da linha.
Pouco antes do lançamento, a nova Kombi brasileira já aparecia em sua forma final. Aqui no Brasil, a designação Clipper estava sendo utilizada de maneira genérica para diferenciar o novo modelo da Kombi T1 tradicional e não com o intuito de diferenciar o modelo mais luxuoso e que era o topo de linha para os mercados europeu e americano. Na Alemanha, o nome Clipper foi deixado de lado logo após o lançamento em 1967, mas por aqui o próprio mercado se encarregou de batizar as novas Kombis de Clipper, já que a própria Volkswagen nunca o fez formalmente.
Já a revista Quatro Rodas de setembro de 1975 anunciava em sua capa: “As novas Kombi”. Praticamente na véspera do lançamento da nova Kombi brasileira, a matéria ainda insistia no lançamento de várias versões, uma delas seria praticamente o modelo alemão, mostrado em várias fotos junto com uma Kombi seis-portas. Como a revista mensal não tem a mesma dinâmica de um jornal diário, O Globo foi mais preciso dessa vez: a revista Quatro Rodas ainda insistia no lançamento de um modelo diferente daquele que o mercado conheceria poucas semanas após a publicação dessa edição da revista.
Após oito anos do lançamento na Alemanha e seis anos após as primeiras especulações sobre a vinda deste modelo para o Brasil, finalmente é lançada a Kombi Clipper nacional, também conhecida como “T2 brasileira”. Chegou gerando uma grande expectativa no mercado, pois àquela altura a Kombi era o utilitário mais vendido no mercado nacional. Infelizmente a “T2 brasileira” não trouxe toda a evolução e configurações da T2 para o mercado europeu e americano. Mas se não foi tudo aquilo que se esperava, pelo menos sua aparência ganhou ares de modernidade e sua mecânica alguma evolução.
Uma curiosidade bastante interessante é que esse modelo brasileiro foi conhecido internamente na fábrica brasileira, assim como entre os técnicos da Volkswagen na Alemanha, como “T1,5” isso mesmo, tê-um-e-meio, pois não era nem a T1 e nem a T2 alemãs e sim um “híbrido”, misturando características das duas versões e que só foi fabricado no Brasil.
No dia 9 de outubro de 1975 o jornal O Globo publicou uma nota informando sobre o lançamento oficial: “VW lança a Kombi Clipper no dia 15”. Talvez a maior “decepção” do mercado foi este novo modelo não ter incorporado a porta lateral corrediça, que facilitaria muito o embarque e desembarque, tanto de pessoas quanto de mercadorias. A justificativa era que as condições das estradas brasileiras não favoreceriam a introdução desta melhoria. Ora, será que no mundo daquela época só o Brasil não tinha estradas decentes?
Já outro periódico de grande circulação no Rio de Janeiro na época, o Jornal do Brasil, em 15 de outubro de 1975, data exata de lançamento do modelo, publicou matéria com o seguinte título: “Uma nova Kombi moderna e mais econômica”. O texto, uma cópia do press release emitido pelo departamento de imprensa da Volkswagen em outubro de 1975, trazia muitas informações de caráter institucional, destacando um leque de inovações técnicas e estilísticas da nossa “T2”, quer dizer “T1,5”.
Duas coisas chamam atenção no texto do jornal: em momento algum foi utilizada a designação Clipper, nem foi criticada a falta da porta lateral corrediça, item ansiosamente esperado e que só chegou ao mercado nacional em 1997. Ainda sobre a justificativa da Volkswagen por não ter implantado as portas de correr no lançamento em 1975, será que nossas estradas só começaram a melhorar em meados da década de 90, quando estas portas acabaram sendo introduzidas na Kombi?
O lançamento da linha Kombi foi antecipado em relação ao lançamento da linha de passeio em quase um mês. Com a matéria de 12 de novembro de 1975, o Jornal do Brasil comenta o lançamento da linha de passeio da Volkswagen de 1976.
A fabricação da Kombi permaneceu em São Bernardo do Campo, não ocorreu a transferência para a nova fábrica de Taubaté, que só foi inaugurada oficialmente em 14 de janeiro de 1976. Logo após o lançamento da nova Kombi começou a fase de divulgação com a publicação de fotos institucionais, de propagandas em jornais e revistas e o envio de folders para os Concessionários Volkswagen. A denominação Clipper não foi citada em nenhum material de divulgação, mas, como já vimos, em outras matérias publicadas aqui na coluna “Falando de Fusca”, se a VW não batizou, o mercado o fez, pois até hoje esse modelo é conhecido nacionalmente por Kombi Clipper, mesmo não possuindo as soluções técnicas e de luxo disponíveis para o modelo de topo da linha Kombi para os mercados europeu e americano.
Veja algumas fotos de divulgação distribuídas pela Volkswagen, marcando o lançamento da nova geração da Kombi no Brasil:
Fotos de divulgação que foi usada pelo Jornal do Brasil na matéria de 15 de outubro de 1975:
Mais algumas fotos oficiais de divulgação da Volkswagen do Brasil (material Acervo Volkswagen Brasil):
A campanha de lançamento utilizou o seguinte slogan: “Os tempos mudaram, a Kombi também” e o novo modelo era tratado institucionalmente como “Nova geração Kombi”. Independente de ter mantido basicamente a mesma carroceria, as mudanças na frente e traseira trouxeram um ar de modernidade para a Kombi. Um novo painel foi introduzido, basicamente o mesmo do modelo alemão, novo sistema de circulação de ar interno, novas janelas dianteiras mais amplas e de abertura total com de vidros de descer, nova padronagem de forração do seu interior, além do novo motor, suspensão traseira e da implantação do servo-freio deram um novo fôlego para a Kombi continuar aliando custo e benefício no mercado nacional.
O lançamento englobou a linha completa: Standard, Luxo, Luxo seis-portas, Furgão, Pick-up e Ambulância.
Veja as propagandas para divulgação da nova geração Kombi, que foram publicadas em revistas e jornais da época. A Volkswagen pretendia, com este material, mostrar que a Kombi evoluiu em segurança, desempenho, conforto e economia sem perder as características que a fizeram líder de mercado:
Folder de lançamento da “Nova Geração Kombi”: o objetivo deste material produzido pela Volkswagen era mostrar a versatilidade da Kombi através de situações do cotidiano, destacando que o novo modelo trouxe consigo uma aparência mais moderna, mais segurança e conforto para os passageiros e para o motorista, maior desempenho e uma maior resistência para o transporte de cargas. A versatilidade se ampliava com a possibilidade da produção de versões específicas para vários tipos de utilização (Material Acervo Volkswagen do Brasil).
Mesmo conhecida no Brasil de maneira genérica como Kombi Clipper, essa nova geração, incluindo o modelo de Luxo, estava a anos-luz da verdadeira Kombi topo de linha oferecida nos mercados europeu e americano. Lá, novos motores mais potentes inclusive com câmbio automático, eram oferecidos opcionalmente. O acabamento, tanto interno quanto externo, era muito mais requintado. A porta corrediça com janelas panorâmicas dava um ar mais moderno que a carroceria antiga com vários vidros laterais e porta basculante. Havia espelho retrovisor do lado direito para todos os modelos. Os vidros possuíam friso de acabamento. O cuidado com os materiais utilizados no interior faziam muita diferença, painéis de porta de acabamento excepcional sem parafusos aparentes.
Todos os modelos possuíam forração no teto com alças de segurança para os passageiros e opção de teto solar para o modelo topo de linha. O estepe, coberto, era instalado no porta-malas. Os bancos dianteiros eram individuais com encosto de cabeça e os traseiros possuíam descansa-braço e cobertura nas ferragens dos pés para com isso dar um ar mais sofisticado ao interior. Tal nível de requinte foi visto por aqui somente em 1997, mais de 20 anos depois, com o lançamento da Kombi Carat, que permaneceu por pouco tempo disponível no mercado e manteve o mesmo motor de 1.584 cm³.
Nas fotos institucionais da Volkswagen of America é possível ver como havia uma enorme diferença entre a Kombi que era oferecida na Europa e nos Estados Unidos em comparação com o modelo recém-lançado no Brasil, que o mercado convencionou chamar de Clipper (fotos do site The Samba).
Para permitir uma comparação também nas especificações técnicas entre a T2 alemã (que tem o apelido de Bulli) e a T1,5 brasileira, veja a ficha técnica da T2 referente à motorização. Os dados do motor da T1,5 podem ser vistos na última página do folder de lançamento da “Nova Geração Kombi” acima.
Falando da comparação das suspensões de T1,5 para T2
Um dos pontos que costuma causar discussões é a suspensão da T1,5 comparada com a da T2 alemã. Para trazer um pouco de luz para este aspecto aí vai um comentário emitido por nossa Base de Sabedoria:
A cronologia é atrapalhada, mas o fato é que somente nove anos depois da T2, em 1976, foi que a Kombi nacional perdeu a suspensão traseira por semieixos oscilantes em favor do tipo braço semiarrastado, bem mais eficiente e seguro por não haver mais o indesejável movimento pendular dos semieixos e a consequente ampla variação do câmber das rodas traseiras. Todavia, foram mantidas as caixas de redução na extremidade de cada semieixo, de efeito nefasto pela questão de peso não suspenso, bem como as articulações das semi-árvores eram feitas por juntas universais (lembramos que a roda não é suspensa, suspensos são a carroceria, o chassi; o peso junto à roda é peso não suspenso)
Só dois anos depois essas juntas deram lugar às bem mais eficientes juntas homocinéticas, bem como desapareceriam as caixas de redução criadas em 1940 para equipar o Kübelwagen. A partir daí a T1,5 ficou igual à T2 nessa questão. Mas a T1,5 ficou para trás na suspensão dianteira. O tipo braços arrastados superpostos atrelados a feixes de lâminas de torção continuou, mas a ligação da manga de eixo aos braços semiarrastados por articuladores esféricos da T2 não chegou à produção brasileira, que até à última Kombi produzida em dezembro de 2013 manteve a dita ligação por pinos.
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As características da Kombi Clipper brasileira em seu modelo de lançamento, 1976, podem ser resumidas assim:
- Dimensões da Kombi Standard: comprimento total = 439,7 cm; largura = 176,6 cm; altura = 191,2 cm; distância entre eixos = 240 cm; altura livre do solo = 20 cm; bitola dianteira = 138,7 cm; bitola traseira = 143,6 cm; peso = 1.195 kg. É dez centímetros mais comprida e possui bitolas mais largas que os modelos anteriores;
- Sua frente foi redesenhada incluindo uma área de deformação contra impactos. Novo para-brisa panorâmico, novos faróis assimétricos e lanternas de direção retangulares ladeando a nova dupla entrada de ar horizontal pintada em preto fosco. Sua traseira também foi redesenhada contendo novas lanternas bicolores (vermelha e branca) com luz de ré, para-choques lisos sem arcos, limpadores de para-brisa preto fosco, portas dianteiras mais largas com novas maçanetas e travas nas fechaduras, novo painel de instrumentos e novo sistema de ventilação, novo revestimento interno das portas em papelão prensado, corrugado fixado por parafusos e arruelas cônicas de alumínio;
- Na Kombi 1600 1976, as janelas basculantes laterais traseiras têm molduras iguais às Kombis 1500 mais antigas. Posteriormente, em outubro de 1976 (modelo 1977), o trinco da janela passou a ser instalado diretamente no vidro, não havendo mais moldura;
- Motor 1600 cm³, de ventoinha alta, um carburador, com 58 HP (SAE) e torque de 11,2 m·kgf a 2.600 rpm;
- Nova suspensão com dupla articulação no eixo traseiro, como já detalhado acima – Constituído além das duas barras de torção (cilíndricas), por semi-árvore de dupla articulação com juntas universais e novos amortecedores, o que mantinha as rodas traseiras praticamente verticais com qualquer carga a bordo;
- Embreagem monodisco a seco, uma caixa de câmbio com quatro marchas à frente e uma à ré, coroa e pinhão com dentes helicoidais e semi-árvores ligadas às engrenagens planetárias do diferencial por meio de calços de articulação. Nas extremidades das semi-árvores encontram-se as caixas de redução, com relação de 1,26:1, numa solução já tradicional na mecânica da Kombi;
- Sistema de freios com servo-freio e válvula reguladora de pressão nas rodas traseiras;
Muita gente deve estar tentando entender o motivo da defasagem da Kombi Clipper brasileira em relação à T2 alemã, tanto no tempo que ela levou para ser lançada, quanto na sua pobre atualização técnica.
Um fato tem que ser analisado em função de seu contexto histórico. Para a enorme maioria dos consumidores brasileiros, o que a Volkswagen oferecia era o máximo que existia, também pela inegável mística da marca Volkswagen. Muito poucos, mas muito poucos mesmo, eram aqueles que tinham condições de ter noção do que estava ocorrendo realmente com os produtos Volkswagen brasileiros comparados com os produtos que esta empresa fazia na Alemanha e em alguns outros países.
Agora, quando se faz um estudo comparativo, comprovado por farta documentação, analisando o que ocorreu sob o ponto de vista de hoje, é que a situação fica mais complicada.
É certo que a filosofia usada por aqui pela Volkswagen foi a de aproveitar a hegemonia de mercado e, com base na falta de uma concorrência forte e no ignorante deslumbramento dos compradores, oferecer produtos que vendessem bem sem exagerar no investimento em modernizações — pois elas não eram necessárias para aumentar as vendas.
Certamente a política de mercado fechado às importações também foi uma das ferramentas usadas para manter os produtos feitos no Brasil defasados. Outro aspecto foi, em algumas épocas, a condição econômica difícil vigente no Brasil que inibia investimentos em modernização.
Seja como for, a Volkswagen sempre fabricou produtos de qualidade e adequados às condições brasileiras, trazendo satisfação a seus clientes dentro do nível de compreensão e expectativas destes.
Na parte 3 vamos abordar questões e curiosidades pós-lançamento. Mostraremos o primeiro teste da nova Kombi e suas conclusões; o início do teste de veículos movidos a álcool; mostraremos também algumas versões especiais, inclusive curiosas versões militares. Detalharemos algumas características de originalidade da T1,5 nacional, para os que buscam restaurar sua Kombi “nos conformes” onde aproveitamos para destacar a utilização de algumas peças somente na primeira série de 1976 e sobre outras que apesar de constar em catálogos, nunca foram implementadas.
Se você chegou até aqui, mas não leu o começo da matéria, clique no link que se segue: Parte 1. O trabalho prossegue na Parte 3.
AG