O recente acidente com um Tesla com uma vítima fatal reacendeu a discussão sobre as questões que envolvem o carro autônomo.
“Dirigi” uma vez um carro que andava sozinho e quase fiquei sem fala. Foi na pista da Nissan, no Japão, há quase 20 anos: câmeras de vídeo instaladas atrás do espelho retrovisor miravam o asfalto e codificavam as imagens enviadas para um computador. Ele as analisava, assumia o comando da direção e guiava o carro pela pista. Incrédulo, eu só acompanhava o volante virando sozinho de acordo com as curvas à frente. Pensei que se passariam décadas até que a indústria transformasse em realidade um automóvel capaz de dispensar o motorista. Poucos anos depois, em 2009, lá estava eu em Munique para a apresentação do VW Passat CC com o mesmo sistema da Nissan, com uma diferença fundamental: nem o carro nem a pista eram experimentais. Já era um equipamento opcional e a estrada era verdadeira, no sul da Alemanha.
Daí para frente, quase todos os lançamentos de automóveis sofisticados incorporavam mais uma novidade eletrônica capaz de substituir funções até então cumpridas pelo motorista. Uma delas traz o carro de volta para a faixa se perceber que o motorista está distraído. Avisa no painel que está na hora de cambiar para reduzir o consumo. Freia para evitar uma batida caso o motorista não tenha pisado no pedal diante do alerta de acidente iminente. Ajusta a suspensão de acordo com as condições da estrada à frente. Estaciona em vagas paralelas ou perpendiculares. Chama socorro no caso de acidente grave em que ocupantes estejam desacordados. Controla volante e acelerador mantendo o carro na estrada e seguindo o da frente a uma distância determinada. E ainda mostra uma xícara de café no painel se desconfiar que o motorista está sonolento…
O somatório de todos estes equipamentos resultou no carro que o dispensa o motorista e centenas deles estão sendo testados por diversas empresas. Em alguns países ele pode rodar sem motorista ao volante, em outros deve ter alguém pronto para assumir a direção. Além de fábricas de automóveis, outras do setor de informática, como a Google, também avançam nos carros autônomos.
O recente acidente com um Tesla S na Flórida (EUA) reacendeu a discussão sobre as questões que envolvem o carro autônomo, pois fez sua primeira vítima fatal. O carro vinha rápido por uma avenida e um caminhão do tipo reboque cruzou a pista vindo de uma via secundária. O Tesla bateu em sua lateral sem sequer acionar os freios e o motorista morreu na hora. Os radares do carro provavelmente não detectaram a carroceria branca do caminhão. Seu motorista disse que, ao chegar aos restos do Tesla, ainda viu na tela do painel um vídeo de Harry Potter. O automóvel era semiautônomo: como ainda não se vendem carros que dispensam totalmente o motorista, ele deve ter as mãos no volante para assumi-lo numa emergência.
Há uma série de problemas técnicos e até jurídicos a serem resolvidos antes da comercialização do carro autônomo. No caso de um acidente, de quem é a culpa? Da fábrica do automóvel ou do software? E na iminência de um acidente, o carro deve proteger preferencialmente seus ocupantes ou os pedestres? Ele dará “folga” ao motorista em todo o trajeto, ou vai exigir sua presença em determinadas situações?
Os técnicos que desenvolvem estes automóveis confessam que existem algumas situações em que radares, sensores e computadores são incapazes de tomar a decisão mais adequada. Uma delas é a do cara parado numa esquina, sobre a calçada e diante de uma faixa de pedestres. O motorista se aproximando da faixa percebe se ele vai ou não atravessar a rua. Mas a eletrônica, ainda não…
BF